quarta-feira, 26 de junho de 2019

São Paul



O surrealista britânico Paul Nash (1889 – 1946) passou pelas duas Guerras Mundiais e as retratou em boa parte de sua obra, na Sensibilidade versus Feiura. Nash é tido como um modernista inglês, e estudou na Slade School of Art. Os textos e análises semióticas a seguir são inteiramente meus. Boa leitura!


Acima, Batalha Britânica. São os horrores da guerra pela ótica de um artista, em eventos que só deixam rastros de fome e destruição, na eterna vocação humana para a Raiva, o Ódio, a Discórdia. Aviões cruzam os Céus, jogando-se uns contra os outros, na insanidade que foi o Onze de Setembro, como é o título do vilão Esqueleto: O Maléfico Senhor da Destruição, puxando para os dizeres de Obama: “Você será lembrado pelo que você construiu, e não pelo que você destruiu”. O Céu aqui é até belo, anil, aberto, mas se trata de um dia com beleza zero, pois só existe beleza na Paz; o resto é fútil, na futilidade das raivas. Aqui há destruição no ar e na terra, num infame dia em que irmão derramou o sangue de irmão, como o ditador nortecoreano, mandando executar o próprio meio irmão, no poderoso fato de que os vínculos de família não se desfazem com o Desencarne, pois a Vida vence a Morte. Neste terreno tão desagradável e inóspito, um tortuoso rio corta a terra, na complicada tortuosidade dos conflitos, pois é só na Paz que existe a limpa simplicidade de Tao, o arrebatador perfume de harmonia e fineza, havendo na polidez uma virtude universal, como no gesto japonês de se curvar, em demonstração de respeito. O rio tortuoso é a serpente da malícia, envenenando laços diplomáticos, num posicionamento xiita, no qual não há espaço para a negociação, e sequer uma nação neutra é respeitada, num cego radicalismo, como na bipolarização brasileira entre pró e contra Bolsonaro, ou na divisão eleitoral americana que elegeu Trump. É um eterno filme de banguebangue, havendo no guerreiro a virtude de se respeitar o próximo, só podendo acontecer um conflito quando todos os meios diplomáticos foram esgotados, na civilizada questão do “sentar e conversar”, como dois civilizados cavalheiros, numa conversa de espírito depurado para espírito depurado. É claro que aqui podemos ouvir os sons das explosões, das bombas, dos gritos de ódio, com jovens vidas sendo ceifadas em nome das vaidades das elites de um país, no modo como as elites gaúchas manipularam o povo gaúcho em nome da Revolução Farroupilha, no fato de que, no exército americano, geralmente os rapazes que se alistam são pobres, provenientes de um contexto social ignorante e carente. Este era para ser um dia belo e ensolarado, próximo da beleza plácida metafísica, mas não. É como um leite que se estragou, não mais prestando para ser bebido. Mais à direita neste céu, vemos um numeroso grupo de aviões, ensaiando uma investida, no modo como as guerras consomem muito dinheiro, acabando por maltratar os honestos pagadores de impostos, na humilhante derrota que a Invencível Armada Espanhola sofreu na guerra com a Rainha Virgem, a mulher feminista com o estômago de um rei – é a questão da coragem, e a confusão reina plena nas guerras, como a Europa ficou muito confusa da II Guerra Mundial, e toda a ordem lógica ficou perdida, com países sendo brutalmente invadidos em nome da vaidade de um governante absolutamente psicopata, assim como são os seguidores deste... Aqui, a terra é bela e dourada, mas é uma beleza que fica abafada pela ordem do dia, que é atacar. Vemos aqui rastros de aviões sendo abatidos, com os jatos caindo, no modo como a Guerra das Malvinas ceifou vidas em ambos os lados, na pergunta feita em uma canção da extinta banda Deee-Lite: “Quem é o vencedor na Guerra?”. Aqui, a fumaça das explosões se mescla com as nuvens no céu, no modo como ficou arruinada a consciência da pessoa que executou a bomba de Hiroshima, num trauma, numa sequela, num espírito que simplesmente se brutalizou, nunca mais acreditando na Beleza e na Harmonia. É o empedernimento, num coração que se fechou para sempre para o Mundo. As linhas confusas no céu são como um covil de cobras maliciosas, num momento em que a sociopatia encontra terreno para reinar. Talvez amanhã seja um dia melhor.


Acima, Porto e Sala. O fálico mastro do barco resiste bravamente a uma intempérie, numa pessoa com a capacidade e o controle emocional para se manter calma em uma situação tensa ou difícil, na dádiva que é ser uma pessoa calma, que dorme tranquilamente. Aqui, é uma cena escura e instável, talvez no meio de uma grande tormenta, grande ao ponto de transformar o dia em noite, com densas nuvens negras, impedindo o esclarecimento se expressar. Aqui, temos um jogo surrealista, com elementos, antes dissociados, sendo associados, brincando com a percepção espacial do espectador, dando um nó na mente deste, como num MC Escher, o mago ilusionista. Esta sala pode ser um porto, e o Mar invade a cena, ameaçando inundar o quadro. Vemos um espelho, que significa a vaidade, na representação do sexo feminino por meio de um espelho, e este significa a reflexão, de uma pessoa que está aprendendo a se ver de fora, observando suas próprias ações e entendendo as impressões que gera em outrem – é o popular termo “enxergar-se”, no modo como há pessoas que, basicamente benéficas, passam uma impressão ruim, tal a dificuldade de se enxergar por completo. Esta sala é elegante e neoclássica, e a lareira, que deveria estar ardendo e gerando calor e acolhimento está apagada em uma escuridão profunda, significando a incerteza, numa janela que se abre para o nada, como no Umbral onde são perdidas as noções de Tempo e Espaço, numa punição aos arrogantes, pois a arrogância precede a queda, ou seja, curva-te e reinarás. Vemos edificações portuárias ao fundo do quadro e no lado direito inferior, com janelas que derramam luz para o cais, na narrativa liquidiscente de Moby Dick, quando temos a sensação de flutuação aquática. São os mercados de peixes e frutos do Mar, com seu cheiro de oceano, de peixe fresquinho, no hálito primordial de Iemanjá, a Mãe que nos trouxe das entranhas oceânicas para a face da Terra, nos caminhos evolutivos, no modo como tudo é processo, tudo é dinamismo, e a Verdade é uma busca incessante de humildade e reconstrução. É claro que podemos ouvir o som do Mar, com suas ondas requebrando, no barulho reconfortante de ondas quebrando, quando durmo de janela aberta quando veraneio em Capão da Canoa, embalando-me pelo som marítimo. É gloriosa a sensação liquidiscente, e os barcos atracados dançam indefinidamente por esse útero agradável, no conforto de um lar, no modo como é difícil sair de casa e ir morar sozinho, quando estamos, desde sempre, acostumados com as benesses confortáveis do lar materno. Este mar não é muito revoltoso, e suas ondinhas são brandas e modestas, discretas e tímidas, como na tímida Vênus de Boticcelli, no jogo erótico entre timidez e exibicionismo, no jogo provocante entre mostrar e esconder. Nesta cena, vemos construções, com muitos arcos, com a sedução de suas janelas abertas, deixando o ar entrar, fluir e sair, como um honesto cidadão no seu direito de ir a vir, no desconfortável modo como uma celebridade não pode caminhar em paz na Rua, sofrendo assédio desrespeitoso, como vi certa vez, num shopping, pessoas parando Luis Fernando Veríssimo para tirar selfies com este – deixem o cara passear em Paz! Este céu é dúbio, e não sabemos se está amanhecendo ou entardecendo, na discrição dos tons de cinza, na profundidade do luto respeitoso. Esta sala tem papel de parede listrado, num símbolo de elegância aristocrática, no modo como os franceses simplesmente defenestraram suas próprias elites de aristocracia, em um agressivo momento de ruptura, causando escândalos internacionais, como no assassinato da família real da Rússia, na dureza dos cursos da História, na amargura de um Ser Humano tão embrutecido, cético em relação às belezas da Vida, como tomar café da manhã sentado no colo do cônjuge – o Amor é tudo. Este espelho traz a reflexão prateada, entrando para um pódio, no modo como Caxias do Sul é o segundo polo metalmecânico do Brasil, numa cultura enaltecendo o árduo labor. Nesta cena, temo um Nash querendo conciliar coisas primeiramente dissociadas, na capacidade do artista plástico em fazer associações nunca antes imaginadas por outrem, no caminho inventivo da Originalidade.


Acima, Paisagem do Iden. As toras empilhadas são a organização, numa mente saudável, que organiza e categoriza os objetos, ao contrário do acumulador, que vai estocando objetos sem critério algum organizacional, num ambiente insalubre e degradante. As toras são a força econômica, e têm uma clara finalidade, que é produzir calor e energia, nas demandas sociais de um país, num mundo tão pragmático, no qual um artista enfrenta uma grande dificuldade para se estabelecer e ser considerado digno de respeito e relevância – é um desafio. Aqui, as árvores estão todas nuas, empobrecidas, fracas e feias, como se uma guerra tivesse ocorrido neste campo de batalha, num ambiente inóspito, estéril, como um homem que já tentou ter filhos biológicos com muitas mulheres, tendo que aceitar tal vicissitude e dar amor incondicional a filhos adotivos, no modo como a Vida está aí, exigindo o máximo de todo mundo, no modo como a vida sem vicissitudes não tem sentido. Talvez estas árvores estejam no Inverno, permitindo que o Sol penetre entre os galhos nus, na inteligência que criou as árvores que ficam caducas no Outono. Vemos uma espécie de barquinho com algumas toras. O barco é o sonho de um artista, num barco navegando e aventurando-se por águas nunca antes navegadas, no modo como um artista tem que se empenhar para trazer coisas que nunca foram antes trazidas, no modo como, desculpe-me, não vejo mérito em artistas galgando caminhos que já foram galgados por outrem, ao contrário do momento áureo de Ray of Light, de Madonna, quando esta tratou de ser criativa e original. Este cenário tem um infeliz aspecto de campo de concentração, talvez num Nash debruçado sobre o fedor nazista, num mundo perplexo frente a tanto ódio por parte de um sociopata que desejava destruir o Mundo. Podemos ouvir aqui um melancólico e doente canto de pássaro, num choro, numa lamentação, num cenário tão pobre e arrasado. Não vemos uma viva alma aqui, numa tristeza desértica, num Nash catarseando um sentimento de desolação e lamúrio. Apesar disso, aqui temos uma cena limpa, muito limpa, e o chão está impecavelmente varrido, no empenho de um sociopata em ter uma aparência impecável, para, assim, poder lançar suas ardilosas teias maléficas, na questão de O Senhor dos Anéis: os personagens do Bem têm uma aparência tosca, mas causam uma boa sensação; os do Mal, uma aparência impecável, mas causam uma sensação desagradável. Talvez, isto aqui seja um campo de treinamento militar, com uma rígida disciplina, num dia a dia de trabalho e terror, assim como é o dia de Mordor, a terra negra do Mal tolkienense, num termo que remete ao termo murder, em inglês, que quer dizer assassinato, no modo como, em O Iluminado, um menino clarividente que previu uma tragédia sangrenta – um bárbaro homicídio. É o hálito negro do Umbral, a dimensão da grosseria e do sofrimento, com espíritos maltratando uns aos outros, esquecendo-se de que são irmãos; de que são iguais. Aqui, a luz do Sol é pálida, fraca e triste, muito longe de um radioso Sol num Céu de Brigadeiro. Apesar do Céu aqui estar limpo e com belas nuvens, é ainda assim um Céu melancólico, e esta cena traz pouco conforto ou contentamento, numa pessoa com demasiada agressividade, infeliz ao ponto de dar o cabo da própria vida, como num Getúlio Vargas, um homem incapaz de imaginar a Vida sem Poder, no apego humano ao Poder, ao mundano. Vemos aqui colinas ao fundo, mas também parecem ser estéreis. Aqui, temos um cenário no qual a Beleza luta para sobreviver e manter-se, numa disciplina demasiada que vai se revelando sem sentido, no modo como o Nazifascismo acabou sendo desmascarado e rechaçado, numa herança maligna que a Humanidade, até hoje, está tentando esquecer. Na porção direita do quadro, vemos um muro, que é o percalço, o impedimento. É uma proibição. Então, o artista tem que ter força olímpica para vencer tal muro, dando um salto de vara e estabelecendo-se paladinamente, erguendo a cabeça e sendo digno, como num altivo Leonardo DiCaprio recebendo seu Oscar, fazendo com que acabemos tirando o chapéu para um artista.


Acima, Paisagem de um Sonho. O pássaro se olha num espelho, num momento de autocontemplação, no modo como os espelhos, trazidos pelos navegantes europeus, causavam fascínio nos indígenas, fazendo com que estes considerassem mágicos tais espelhos. O pássaro é a Liberdade, num feliz cidadão em um estado em que as liberdades são respeitadas, no modo como são toscos os estados ditatoriais, causando desconforto ao próprio cidadão, pois só há Prazer e Bem na Liberdade, fazendo com que a desagradável ausência de Liberdade se mostre uma sucursal do Inferno, a dimensão desagradável. Podemos ouvir o som de Mar, com suas ondas rítmicas banhando a beira, como numa respiração, nas ondas indo e vindo, no enigma que ainda persiste na Humanidade: Há Vida fora da Terra? Então, o Ser Humano se sente navegando um pequenino barco em um oceano tão vasto, vasto demais. Céu e Mar unem-se aqui num continuum azul, como ouvi numa certa canção: “Eu descobri que são azuis as paredes da Casa de Deus”, no modo como o espírito desencarnado, na Colônia Espiritual, ache lá o Céu mais azul do que na Terra, quando, na verdade, é o mesmíssimo Céu aqui ou acolá. Neste quadro, vemos as armações de um biombo, só que um biombo nu, translúcido, que permite que enxerguemos através dele, assim como é Tao, o Senhor invisível que faz com que observemos com clareza, como no enigma da Matéria Escura, o “cimento” invisível que mantém o Cosmos unido, como um só, no modo como Tao é um só, sem infelizes caminhos alternativos, ou seja, sem submundos. A praia está deserta, como me disse um parente: “É deprimente vir para a praia fora do período de veraneio”. Aqui, as ondas se chocam violentamente com as rochas, desafiando a dureza pétrea, num longo trabalho de persistência, pois nunca ouvimos dizer que “água em pedra dura, tanto bate até que fura”? Este biombo projeta uma sombra azulada, num por do Sol marciano, azulado, no pontinho azul que é a Terra vista de outros pontos do Sistema Solar. Aqui, este espelho não revela o artista, o qual desaparece, numa prova de discrição e recato, num Nash que sabe que o artista não deve aparecer mais do que a própria obra, num Mundo que naturalmente desrespeita o showman, o exibidinho, o homem que quer aparecer pelo puro fetiche de aparecer, num certo vício ilusório, pois uma celebridade não ama aparecer? E se, depois, não poderei caminhar em paz na Rua? Tudo tem seu preço, numa supercelebridade que simplesmente não pode sair na Rua, como num presídio. Vemos um pássaro voando, no prazer onírico de volitar, o termo espírita que fala sobre quando conseguimos voar, numa sensação deliciosa de força, vida e prazer – é a leveza de um espírito que consegue voar como um pássaro, na força do Espírito Santo. Neste reflexo, é tudo mais vermelho, na cor de sangue de um Sol sendo assassinado, ressuscitando no dia seguinte, renascendo como a Fênix, na força que faz com que o espírito jamais morra, na grande lei universal: O espírito é único, indivisível e imortal. Dá para imaginar presente maior do que a Eternidade? É o nobre presente, que nunca perece, estraga ou caduca. Doces nuvens brancas cruzam estes céus, como algodão doce, em doces memórias de infância, a fase da Vida em que tudo é mais simples, fazendo com que as crianças ensinem aos mais velhos a lição da Simplicidade, pois, quando criança, o espírito recém saiu da Dimensão Metafísica, trazendo resquícios de tal vida maravilhosa. Neste quadro, vemos algumas esferas, como numa mesa de sinuca, no prazer de jogar algum esporte, na memória que tenho de ganhar uma bola de aniversário, na simplicidade do prazer de fazer um gol, no termo “bola dentro”, que fala de alguma atitude feliz, que atingiu seu objetivo, no gosto da realização, rechaçando as frustrações e dando a volta por cima. Essas bolas são como um colar de pérolas desmantelado, numa Iemanjá distribuindo as pérolas a seus filhos navegantes, no talento da distribuição.


Acima, A Estrada Menin. Um melancólico cenário de devastação e destruição, talvez num momento de devastação existencial, numa vida que se transformou numa fábrica de frustrações, num indivíduo que, de uma forma muito repentina, deparou-se com um quadro de devastação, beijando o fundo do poço, tendo que empreender um esforço gigantesco para se reerguer. É um quadro triste, sem muitas cores, na beleza que inexiste nos conflitos da Terra, algo muito longe da beleza eterna metafísica, num Ser Humano com uma ancestral vocação para a infelicidade, num talento para a violência. Aqui, há um amplo lamaçal, e as poças d’água são paradas, estagnadas, e nada flui, nada vive, nada se renova, e há apenas esta água suja e pestilenta, imprópria para uso, para consumo, e é uma água enlameada, tóxica, que faz mal a quem a beber, como um veneno, no modo como a Guerra envenena as relações diplomáticas, sem espaço para conversa civilizada, sem espaço para uma polida conversa entre dois cavalheiros. Podemos ver poucos homens na cena, talvez os sobreviventes de uma batalha sangrenta, com pessoas que passaram por uma experiência traumática, arrastando, para o resto de suas vidas, uma sequela, um trauma irreversível. As guerras são grandes funerais coletivos, e rapazes, na flor da idade, com toda uma vida pela frente, são ceifados como gado no matadouro, banalizando a vida humana – é claro que Tao não gosta da Guerra nem da Raiva. As árvores aqui estão decepadas e mortas, talvez intoxicadas com armas químicas, na crueldade humana em fazer o máximo de Mal possível. Aqui, não há Vida, e há só ausência e privação, como uma pessoa padecendo de fome na Rua, num contexto em que se perdem as noções de Tempo e Espaço, numa pessoa jogada numa calçada fria, enfrentando a inevitável indiferença do Mundo. Porém, aqui, há uma nesga de esperança, pois alguns raios de luz, retilíneos, caem do Céu para abençoar esta terra são arrasada e coitada, tão desprivilegiada. É a esperança de que os percalços serão contornados e de que um belo dia novo virá, jorrando luz e cura, curando feridas e fazendo com que uma pessoa dê a volta por cima, no grande desafio que é se reerguer, numa pessoa que não tem outra escolha, senão enfrentar o trabalho e seguir adiante. Essas poças são reflexivas, como espelhos, num momento em que Nash faz um reflexão sobre as guerras, questionando se é necessário tanto sangue sendo jogado fora, numa lamentação, num Nash que se vê impotente para curar as feridas do Mundo, pois o Mundo não muda, e a preciosa Filosofia também não muda o Mundo, mas pode mudar o modo particular de uma pessoa observar tal Mundo, numa questão íntima e pessoal, particular, numa cabeça que gravita acima das mediocridades, fazendo do sábio a promessa de uma dimensão melhor, muito melhor – é a Terra Prometida, o Reino dos Céus anunciado pelo espírito mais depurado que já encarnou na Terra, num Jesus Cristo absolutamente alheio a violências. Os céus aqui lutam para que a luz penetre e cure, nos poderes miraculosos que o Evangelho atribui a Jesus. Este cenário luta para se reerguer, encarando um longo percurso pela frente, numa demanda que exige uma Vida. Aqui, temos um silêncio cemiterial, morto, com cadáveres apodrecendo, com rapazes que sequer terão a honra de ser sepultados juntos aos falecidos de suas próprias famílias. Aqui, é como um grande depósito de lixo, cheio de entulho inútil, na inutilidade das vaidades humanas, dos orgulhos arrogantes humanos, num rei ambicioso, num rei que não está contente nem satisfeito com suas próprias terras, pois a ambição é inimiga da Paz, e se você não está o tempo todo querendo, você poderá ter Paz, pois se o que você tem, você acha que não é o suficiente, então você nuca terá o suficiente – é a simplicidade de Tao, o contentador. Este quadro é muito distante do conforto acolhedor de um lar limpo e com mesa farta. É uma miséria, com seres humanos megalomaníacos, empenhados em anexar mais e mais terras a seus mundanos domínios. Se estou contente com o que tenho, estou bem, num mundo em que o consumismo traz a sensação de vazio espiritual.

Referências bibliográficas:

Paul Nash. Disponível em <www.pt.wikipedia.org>. Acesso 19 jun. 2019.
Paul Nash Obras. Disponível em <www.google.com>. Acesso 19 jun. 2019.

quarta-feira, 19 de junho de 2019

O Gordo e o Magritte



O surrealista belga René Magritte (1898 – 1967) estudou Arte em Bruxelas, trabalhou numa fábrica de papel de parede e foi designer de cartazes e anúncios. Enfrentou o suicídio da própria mãe. A geração de Magritte viu a ocupação nazista de Bruxelas na II Guerra Mundial. A primeira mostra de RM foi em 1927, ano em que se mudou para Paris, tornando-se um vanguardista e amigo do célebre Marcel Duchamp – os semelhantes se agrupam. A partir de 1936, Magritte torna-se conhecido em Nova York, expondo no MoMA em 1965 e postumamente no Met em 1992. O surrealista veio a falecer de Câncer. Magritte teve ampla citação e homenagem no filme Thomas Crown, com Pierce Brosnan, e também em um clipe monumental de Michael Jackson. Os textos e análises semióticas a seguir são inteiramente meus. Boa leitura!


Acima, Golconda. Uma chuva de cavalheiros, como uma agressiva chuva de granizo, trazendo transtorno aos agricultores, no modo como o Ser Humano é suscetível às intempéries da Natureza – são as vicissitudes materiais, um mundo imperfeito, muito abaixo de um mundo mais nobre, num mundo material em que o Ser Humano, infelizmente, trata de ser o mais cruel e duro possível, num mundo duro principalmente para um artista, para uma pessoa sensível. O cenário aqui é uma vizinhança apolínea, perfeita, com prédio de aparência imaculada, perfeitamente pintados e mantidos pelo zelo da pessoa que quer fazer com que este mundo se apreça ao máximo com a dimensão acima. Estes senhores estão indo trabalhar, talvez se espremendo dentro de um trem ou um ônibus, nas demandas do dia a dia, do labor, das obrigações diárias que trazem a rotina de sempre, num exercício de disciplina, no modo como, por mais sensibilidade uma pessoa possa ter, é necessário que haja disciplina na hora de sentar e produzir, nas duas faces de um mesmo trabalho – liso e áspero. Os telhados aqui são rubros como fogo, talvez sangrando, nos modos humanos de estabelecer os de “sangue azul”, fazendo nada mais do que separar as pessoas em castas, fazendo da pirâmide social uma ilusão, pois todos somos de sangue estelar, acima do sangue azul, e somos todos príncipes herdeiros do mesmo Rei, que é Tao, o grande regente de todas as dimensões do Universo, num Ser Humano ainda tão pequenino, ainda tão jovem apara entender o Cosmos ao seu redor. Estes senhores levitam como Mary Poppins, no livre arbítrio do espírito para levitar e voar na dimensão acima, desafiando as regras da Física, regras estas presas ao fato de estarmos presos na dimensão da matéria, da carne. Aqui, temos uma diversidade mas, ao mesmo tempo, todos os senhores são iguais, idênticos, e pode se tratar do mesmo homem, só que em momentos diferentes. O artista odeia ser apenas mais um, odeia ser medíocre, partindo em busca de sua identidade, de sua marca registrada, como nos círculos e bolas de Yayoi Kusama, numa identidade que faz com que as pessoas possam reconhecer e dar o devido valor à originalidade de um determinado artista. Mas, apesar disso, a reinvenção é necessária, pois a pessoa não pode ficar a vida inteira fazendo a mesma coisa, pois, se o fizer, parará no tempo e virará uma peça empoeirada de museu, um fóssil, algo morto que, um dia, teve glória mas que, hoje, não mais causa efeitos ou comoções. É o desafio de tocar a Vida para frente. Estes senhores estão de preto, a cor da discrição e da seriedade, do luto, do respeito. Todos estão devidamente usando um chapéu, pois o chapéu é a proteção, o resguardo, a preservação, no modo como uma pessoa tem que ter siso e juízo para se proteger de situações tóxicas ou de pessoas tóxicas, no inevitável modo como os sociopatas estão entre nós... Portanto, cuide-se, mas sem paranoias. O céu aqui está limpo, de Brigadeiro, na limpeza de percepções, como o espectador se sente de banho tomado ao apreciar algo que um bom artista fez, pois a indiferença do espectador é a maior dor que um artista pode sentir: “Por favor, lembrem-se de mim”, implora o artista. Todas as janelas aqui estão de cortinas fechadas, na separação entre público e privado, num ato de recato, de cuidado, de preservação. É o mistério que ronda a Vida, com verdades nem sempre escancaradas. Estes senhores estão discretos, como se soubessem que o showman, o exibido, nunca obtém respeito. E não é o respeito o cimento sobre o qual a Sociedade se sustenta?


Acima, Os Amantes. Aqui, há uma proibição, um percalço social entre duas pessoas, num amor impossível, talvez num Magritte catarseando o sentimento de despertencimento social, num amor que contraria regras e conveniências, talvez com dois amantes que levam vida dupla, debatendo-se entre Amor e Dever. Talvez esses dois amantes estejam já casados com outrem, mas num casamento frio, de conveniência social, como nos casamentos arranjados, como acordos entre duas famílias aliadas, numa vida social cruel, que pouco se importa se o indivíduo está feliz, como na popular Diana, a qual, ao se deparar com um casamento frio e infeliz, decidiu mandar tudo para lá, abraçando a felicidade e ganhando o carinho e a identificação do Povo, num caminho de transgressão, por ninguém merece ter um cônjuge frio, que pouco se importa com a felicidade e o bem estar do outro cônjuge. Aqui, os sacos são uma proibição, talvez fazendo metáfora com preservativos, camisinhas, talvez num amor nunca consumado, como na avassaladora paixão entre Ellen e Newland em A Época da Inocência. Aqui, é como chupar bala com a embalagem, num amor que nunca se realiza de fato. Os amantes aqui estão cegos, e não conseguem ver ao outro, e o beijo é somente uma fantasia, algo que não tem como se realizar, no modo como uma pessoa estrutura a própria vida ao ponto de simplesmente não poder visualizar algo dentro desta cilada autoestruturada, ou seja, somos reféns de nossos próprios medos. Esses dois amantes têm medo de se envolver, e é algo que fica só na fantasia, na imaginação, e nunca um relacionamento de fato. Podemos ouvir a respiração ofegante dos amantes, num fervoroso desejo de se envolver, e eles têm um romance que não se adéqua aos limites sociais, como no romance proibido de Anna Karenina, uma mulher que sofreu todas as punições por ter desafiado regras sociais, tornando-se malvista, como uma Maria Madalena, ou uma Eva no Éden, tornando-se maldita, malfalada, sem ter como saber como é o sabor do Respeito. Este é um quadro sombrio, no qual pouco podemos observar, e o céu noturno ao fundo é bem fechado, muito distante num dia claro de Brigadeiro, muito distante de um contexto onde tudo está elucidado e esclarecido, num romance sem pé nem cabeça, numa ilusão que pouco tem como se adequar às demandas do dia a dia – é uma ilusão, uma falácia, uma mentira. Os amantes aqui estão ensacados e não podem ver um ao outro, ao contrário de um casamento socialmente aprovado, no qual os cônjuges se adaptam perfeitamente à vida social um do outro, formando um casal, a entidade dupla que tem peso ritualístico, fazendo do homem o representante dos homens e fazendo da mulher a representante das mulheres, no fato de que, depois do Desencarne, os casamentos não são mais necessários, e os cônjuges, desencarnados, tornam-se puramente amigos, mas só se souberam se respeitar reciprocamente durante a Encarnação – no fim das contas, tudo se reduz a Amizade, ou seja, Amor Fraternal. E talvez não haja Amor Fraternal entre esses dois amantes, pois eles não conseguem vislumbrar a vida um do outro, não podendo, assim, entrar em harmonia com a vida do seu amante. É a dança entre Razão e Sensibilidade, entre Yang e Yin, e ambos precisam estar em harmonia para que a pessoa tenha Paz em seus dias na Terra. Este amor de Magritte é um amor que nunca se realizará. Podemos ouvir a respiração ofegante dos enamorados, mas é algo além de ser concretizado, pois talvez esses dois amantes tenham muito medo de entrar em conflito com o corpo social ao seu redor; medo de se tornar maldito; medo de ser excluído. Aqui, é um ambiente fechado e claustrofóbico, num romance que, ao invés de libertar, aprisiona. Então, o siso entra em cena com toda sua dureza habitual, fazendo com que a pessoa faça um esforço enorme para conciliar o Liso com o Áspero, num caminho do meio, equilibradinho – não é impossível ser feliz.


Acima, O Espelho Falso. Uma pessoa sonhadora. A íris aqui é como o Céu, numa mente produtiva, sempre inventando, num artista em busca de meios para se expressar da forma mais forte, grandiosa e arrebatadora possível. Este olho arregalado é um momento de revelação, com algo sendo claramente descortinado, revelado, solucionado. É um olho sem cílios, sem os pelos que nos fazem primatas, como se fosse uma raça alienígena, de outra proveniência, de outra raça, algo que nada tem a ver com o Homo sapiens. Este olho não pisca, não tem interrupções, como num programa de TV sem intervalos comerciais, como um espírito desencarnado, que não sente fadiga nem necessidade de se deitar para descansar, da glória de juventude eterna, o grande presente que nos espera incondicionalmente, certamente, fazendo da Fé um espectro fora do alcance da Ciência – temos Fé, mas não certeza, no grande desafio que é ter Fé. Este quadro olha nos olhos do espectador, num momento de identificação, de compaixão, com um ser humano se colocando nos sapatos de outro ser humano, fazendo do compadecimento a estrada que leva ao Amor Incondicional, o combustível que move toda a Dimensão Metafísica, ao contrário da Terra, onde tudo gira em torno de arrogante dinheiro... Como é tosco o Ser Humano! Esta pupila é o mais próximo que podemos entrar em alguém, fazendo com que muitas pessoas tenham medo de contato visual, achando este uma invasão, uma indecência, um desconforto. Este pupila é o olho do furacão, pois quando tudo ao redor está no mais perfeito caos, a pessoa tem o controle emocional para se sentir estável e tranquila. A pupila é um portal, um túnel, e nunca ouvimos dizer que os olhos são o espelho d’alma? É como dois grandes amigos, amigos de verdade, que estão há décadas sem trocar palavra, e quando se encontram por acaso na Rua, olham nos olhos um do outro, com a sensação de que foi ontem ou anteontem a última vez em que se falaram, ao contrário dos amigos fúteis, com os quais estamos há décadas sem falar, e quando nos encontramos, parece que fazem décadas, como dois estranhos olhando no olho um do outro, não podendo ali reconhecer um amigão de fato. A pupila é um portal interdimensional, na teoria dos Buracos de Minhocas, portais que cortam o tecido de Tempo e Espaço, abreviando distâncias e fazendo da Luz uma velocidade lenta como uma minhoca. O entorno deste olho, as pálpebras, parece ser feito de argila, na atividade do artesão, sempre produzindo coisas novas, na satisfação de uma vida produtiva, como Tao, sempre criando, no poder terapêutico do labor, como a idosa Rose em Titanic, rechaçando as riquezas mundanas e abraçando uma vida simples, estável e maravilhosa. Este céu, nesta íris, está estável, de bom humor, com estabilidade invejável, na dádiva que é uma pessoa calma, que não se desespera, que não perde o controle. Podemos ouvir o canto de pássaros neste belo dia de Sol, na dádiva que é um fim de semana de tempo estável. Podemos sentir a leve brisa que carrega as nuvens lentamente, enchendo nossos pulmões de ar, simplesmente ar, na alegria de momentos em que tudo de que precisamos é de nosso coração batendo, no modo como a Vida é preciosa e inigualável, num momento de harmonia entre Físico de Metafísico, neste portal que interliga as duas dimensões, fazendo de tudo a grande obra de Tao, o Oscar Niemeyer de todo o Universo. Este quadro é um portal que nos convida a entrar na mente do artista, como entrar na casa de outra pessoa, como na interessante visita guiada à casa de Jorge Amado, em Salvador, entrando na casa de outrem e sentindo o hálito do lar alheio, o cheiro do vizinho, como um cão na Rua farejando o xixi dos outros cães. É um olho belo, portal de uma alma bela, num impecável azul anil. É como uma perfumada cama de hotel, com lençóis limpinhos, no prazer de se deitar numa cama limpa e perfumada. É um olho sensível e contemplador, muito puro e inocente, na inocência de um artista que quer simplesmente fazer com que as pessoas vejam as coisas do modo como o próprio artista vê, num convite, numa sedução, como se “render” a um professor e permitir que este dê lições preciosas.


Acima, O Filho do Homem. Certamente, esta é a obra mais célebre de toda a carreira de Magritte, fazendo com que o quadro desse uma inconfundível identidade ao autor. A maçã é verde porque é imatura, e ainda é azeda, num espírito jovial, que não se sente velho ou ultrapassado, na dádiva que é uma alma jovial, que não perde a irreverência, o precioso senso de humor. A maçã tapa o rosto do homem, como se quisesse tomar conta do quadro e ser a grande estrela, nas ambições humanas em obter dinheiro e influência, nada a ver com o líder sábio, o homem ultrapolido que nunca se coloca contra o próprio povo. A maçã busca ter identidade, para quem sabe um dia, quando estiver vermelha e madura, possa saber como viver e como se expressar. É a maçã do Éden, na transgressão de Eva ao colher um fruto proibido, fazendo da serpente os inocentes pecadinhos como a Gula, no modo como há fabulosas confeitarias na Dimensão Metafísica, segundo o Espiritismo. O casacão do homem é elegante, sem qualquer amasso, e representa a elegância de um senhor que respeita outrem, fazendo pequenas e valiosas gentilezas como segurar a porta para um idoso passar. A gravata vermelha remete a Trump, o truculento que comprou briga com a CNN e com meio Mundo, num líder um tanto longe de Tao, pois este se revela um grande líder, pois Tao não tem as vaidades do Ego humano. As mãos do homem estão calmas, recatadas e discretas, e não são rudes ou calejadas, mas mãos de um homem que exerce trabalho de labor mental, como criar Arte ou experimentar Ciência. A camisa branca faz contraste com a gravata sangrenta, e traz um pouco de respiro e Paz, no modo como muitos espíritas julgam que uma roupa branca é uma bela imagem, uma bela tonalidade, entrando em harmonia com a Medicina, nos jalecos brancos dos médicos – o Ser Humano é universal. Dois botões aqui estão abotoados; o terceiro não. É o botão rebelde e desajustado, na porçãozinha transgressora que qualquer artista tem, fazendo uso do falo agressor, erguendo um imponente obelisco, na altivez de uma diva como Barbra Streisand, uma mulher falo, imponente, quase intimidadora. Ao fundo, um plácido e doce oceano, num mar perfumado e calmo, algo difícil de se ter na Dimensão Material, fazendo com que as praias paradisíacas da Terra sejam uma mera fotocópia de algo melhor e mais perfeito. É a vastidão oceânica, que sempre desafiou tanto os navegadores da Renascença, com lendas de horríveis monstros oceânicos que engoliam barcos e tripulações, na imaginação humana frente ao desconhecido. Acima do mar plácido, um céu dúbio e cinzento, prestes a cair em tormenta, ameaçando com suas trovoadas e perigosos raios elétricos, no martelo de Thor, na tendência humana em deificar a Natureza. O céu cinzento é o sentimento dúbio entre dor e prazer, como uma bela rosa com espinhos, num sabor total de agridoce. Uma forte mureta separa o homem do fundo do quadro. A mureta é o discernimento de que o Ser Humano não pode tudo, pois o que Tao faz, o Homem só faz uma rude fotocópia. A mureta é a consolidação, a força de uma fortaleza, com tijolos pacientemente sendo construídos, num homem se fazendo na Vida, construindo uma carreira, um legado, com o prazeroso sentimento digno de fazer algo em prol do Coletivo, da Sociedade. Este homem está muito sério, e é difícil o imaginar sorrindo, numa sisudez, nos pepinos que vão surgindo durante um ordinário dia de trabalho. O chapéu coco é elegante e protetor. O chapéu é o resguardo, a força acolhedora do Lar, o espaço em que temos muita Paz, ouvindo na Rua o reconfortante canto de bem te vi, em ruas plácidas, absolutamente desprovidas de violência ou feiura, no modo como é frágil e Paz da Dimensão Material. Podemos ouvir aqui o som do Mar em suas doces ondinhas requebrando, no odor libertador que é a brisa da beiramar, no sentimento de libertação, como um prisioneiro que conta os dias para ser solto, tendo que fazer algo de seus dias na Terra – e algo produtivo.


Acima, O Terapeuta. A bengala é o sustentáculo, o apoio, a estrutura mantenedora. É o falo da Lei, assustando aquele que estiver pensando em cometer algum crime ou infração. É a simplificação do pensamento racional, abreviando meandros e indo direto ao ponto, como um preciso diagnóstico médico, apontando a patologia e indicando tratamento e medicação – é o dever da Ciência, o ambiente universal de pensamento lógico. A gaiola aberta é a Liberdade, com os pássaros não mais mantidos em cativeiro, tendo o livre arbítrio de entrar ou sair, como é a libertação do Desencarne, no momento em que a pessoa cumpre a sua missão na Terra – hora de voltar para casa, como na vida da política gaúcha Nega Diaba, que foi prostituta e presidiária, superou as vicissitudes, deu a volta por cima e morreu com dignidade. Esta gaiola não é mais uma prisão, mas um lar onde todos convivem em Paz e Harmonia, e podemos ouvir o doce canto dessas aves, cantando alegremente pelas ruas pacíficas da Divina Dimensão. São os pombos do Espírito Santo, trazendo alento aos que vivem na Terra, prometendo uma vida (muito) melhor – não poderemos resolver os problemas do Mundo, mas poderemos ser a promessa de outro dia. Aqui, o Céu é de Brigadeiro e o Mar é doce e plácido, num Magritte desejoso de Paz, para poder produzir em Paz em seu estúdio, na tranquilidade diária do labor, em momentos produtivos em que a pessoa esquece do Mundo lá fora. Este homem não tem face, e não sabemos se é um homem ou uma gaiola, num apelo surrealista, mesclando elementos, na missão do artista plástico em combinar elementos diferentes e produzir algo novo. O manto é da cor do vinho, do sangue de Jesus bebido na Última Ceia, no fascínio que a bebida exerce há séculos, na sensação de relaxamento e embriaguez, fazendo metáfora com a deliciosa sensação de Paz e Liberdade do Mundo Acima, no modo como o vinho é apenas uma (deliciosa) cópia... O ar circula tranquilamente por esta cena, alimentando os seres vivos, provendo como Tao provê, alimentando com Ar, Água, Terra e Fogo. A impressão que temos é de que, aqui, trata-se de um senhor idoso aposentado, tranquilamente sentado num banco de praça, proseando com outros senhores, na identificação que existe em um grupo de amizade onde os membros têm mais ou menos a mesma idade. Na outra mão deste senhor, um saco marrom escuro, num mistério: O que a Vida nos trará nas próximas esquinas? Pouco se sabe. O saco tem um rasgo que está costurado, como se tivesse sofrido uma facada, como na facada de Bolsonaro, num momento público de agressão e dor intensa. São as cicatrizes da Vida, ensinando-nos que os percalços são não só inevitáveis como também necessários, no modo como uma pessoa não pode ficar no “mimimi” nem ficar reclamando da Vida. Este saco é a reserva, como na fábula da Formiga e da Cigarra, com a Formiga trabalhando o Verão inteiro para ter suas reservas no Inverno, na lição de Responsabilidade e Realismo – temos que pensar no futuro e em uma aposentadoria. Esta cena é praiana, pois o chão é arenoso, no hálito primordial oceânico, na Mãe Iemanjá que trouxe Vida à Terra, nas pérolas submersas dos mistérios aquosos, na sensação deliciosa e gloriosa de liquidiscência, num momento em que um filho se entrega nos braços de Tao, o Pai caridoso e clemente. Podemos ouvir o som do Mar, e a brisa desta beiramar é doce e suave           , dando o prazer de libertação a esses pombos, no modo como são grandiosas as nações que propõem Liberdade aos seus cidadãos, pois Liberdade dá prazer, e tudo o que é agradável é do Bem. Este senhor surrealista usa um chapéu, talvez para proteger do Sol inclemente. O chapéu é o telhado da casa, do invólucro, da estrutura, no gesto de respeito ao se tirar o chapéu para outra pessoa, no próprio termo “tirar o chapéu”, denotando reverência, no modo como uma pessoa que não é respeitada é uma pessoa que tem uma certa lacuna existencial, na desafiadora missão de se obter respeito. Este senhor está esperando por esta libertação, por este recreio, por este retorno. Cedo ou tarde, a porta da gaiola se abrirá.

Referências bibliográficas:

René Magritte. Disponível em <www.pt.wikipedia.org>. Acesso 12 jun. 2019.
René Magritte Obras. Disponível em <www.google.com>. Acesso 12 jun. 2019.

quarta-feira, 12 de junho de 2019

A Candura da Arte



O russo Wassily Kandinsky (1866 – 1944) foi um pintor que obteve cidadania alemã e francesa. Kandinsky é conhecido como um introdutor do Abstracionismo, e viveu o auge do estilo Art Nouveau. A princípio, estudou Direito e Economia na Universidade de Moscou, mas em 1910 já fazia suas obras abstratas, convivendo com o célebre Piet Mondrian – uma galera vanguardista. Apreciador de Monet, WK, depois de estudar em áreas que não lhe traziam realização, estudou Arte, definindo seu rumo de carreira. Os textos e análises semióticas a seguir são inteiramente meus. Boa leitura!


Acima, Círculos em um Círculo. Vários ovos sendo chocados num mesmo cesto, como numa família, na barriga de uma mulher fértil, na fertilidade de uma mente inventiva, como vários anjinhos ao redor de Nossa Senhora. Aqui, temos um grande conjunto, que é o Mundo. Dentro dele, temos subconjuntos, submundos, cada um com suas próprias regras e parâmetros, no fato de que nossos pais nos colocaram no Mundo para o Mundo, e não para um submundo, uma realidade paralela, uma alienação de algo muito importante – o Senso Comum. Aquele que perde o link com o Senso Comum, sofre numa deturpação de valores, de noções. O entorno desta obra é serrilhado como as bordas de um selo de correio, no modo como o artista vai emanando suas obras, sua Arte, buscando desesperadamente um retorno, um feedback, e este enche o artista de alegria, pois faz com que o artista se sinta parte do Mundo, e não parte de um submundo de merda – desculpe o termo. É como uma sonda espacial sendo emitida no espaço sideral, numa Humanidade sedenta por fazer contato com outras civilizações, no choque que foi a colonização europeia do Continente Americano, arrancando as terras dos indígenas, reduzindo estes a pedintes miseráveis nas ruas de Caxias do Sul. Quase no centro do quadro vemos algo que parece ser um olho de íris avermelhada, como olho sangrando, no sofrimento de uma pessoa que vaga incessantemente pelo submundo, uma pessoa perdida e solitária, com muita dificuldade em encontrar um Norte, uma noção, uma referência, no modo como é sofrida a Vida de uma pessoa não centrada, estando num labirinto cheio de meandros traiçoeiros, cheios de malícia, de despropósito, de inutilidade. Então, a Sociedade trata de punir severamente o andarilho do submundo, numa Vida desperdiçada, vivida em vão, numa pessoa que precisa, desesperadamente, dar a volta por cima e se reencontrar. O quadro é cortado por uma espécie de x, como os raios de dois holofotes, no x de Xuxa, a grande marqueteira, no modo como trabalhei certa vez com um ex-paquito da Xuxa. São dois raios que se encontram, unindo forças para manter o grupo coeso, na qualidade do grande líder, um homem extrapolido que nunca faz algo que possa perturbar a Paz de seu reino, pois a Raiva é inferior à Paz, e se há algo que reina na Dimensão Metafísica, esse algo é a Paz, numa sensação deliciosa de aceitação, de Liberdade. Aqui, o grande círculo vazado de linha negra é o que impera numa matriarca empenhada em manter a família unida. Temos aqui toda a magia de uma diversidade cromática, como cores de lustres de cristal, como na logomarca de uma edição passada da Festa da Uva de Caxias, com um cacho de uva com cada bago de uma cor diferente, na alegria de confetes coloridos de Carnaval, num momento de festa social, de integração em torno de algo, em torno de Tao, em torno da cornucópia abundante e abençoada, como nas safras de alimentos, num Mundo ainda tão desigual, com tanta fome e miséria. Muitos destes círculos aqui são translúcidos, como balas coloridas, na magia colorida de bolas de gude, numa candura infantil, num Cidadão Kane que, no leito de morte, clamou por seu velho trenó de neve da infância, o Rosebud. E não é feliz aquele que mantém infantil uma parte de si mesmo? Como numa pessoa que jamais perde a jovialidade e o senso de humor. Aqui são bolhas borbulhantes de um espumante festivo. Uma explosão de fogos de artifício. Vários olhos observando o artista. O quadro é ainda cortado por vários traços retos negros, tentando impor a Racionalidade Matemática e formas tão orgânicas e insinuantes. São como antenas de TV, unindo as audiências de uma nação inteira.


Acima, Estudo de Cores – Quadrados com Círculos Concêntricos. Aqui, temos uma relação, uma organização, na tentativa humana em catalogar as coisas e trazer ordem ao caos, na luta das luzes da Racionalidade sobre as sombras da Ignorância, no modo como a Ciência é altamente universal, assim como a Arte. Vemos aqui um pouco de Andy Warhol, pegando uma mesma forma e dando várias versões cromáticas, várias leituras, várias dimensões, vários enfoques. São como diversas impressões digitais, numa alegria carnavalesca, num WK sedento por um pouco de alegria, frente a um Mundo tão duro e sisudo. É como um rol de vários planetas, várias esferas, cada uma com particularidades, como numa família de vários filhos, em que cada um desenvolve suas próprias aptidões e percepções, como cada filho de um jeito em particular. É como numa turma de colégio, ou como num rol de professores, cada um responsável por uma matéria, um assunto. É uma sucessão monárquica, com cada monarca com um estilo pessoal, no fato de que não são todos os monarcas que se transformam em homens de Tao, em homens da Paz e da Harmonia, pois a Humanidade tem uma eterna fome por desavenças e guerras, destruindo nações e deixando rastros de fome e devastação. São como várias categorias de gripe, cada uma com suas características, sintomas e diagnósticos. É o mesmo aspecto sendo observado em momentos diferentes, como nas épocas do ano, ou nas horas do dia, num cristal mágico que vai se quebrando em várias cores, sendo cada quadro uma fase da vida da pessoa. É como os anéis de um sistema solar, na hierarquia gravitacional, num Saturno rodeado por anéis, como na divertida abertura do extinto seriado de TV Third Rock From the Sun, em que os corpos celestes dançavam como em uma boate. Uma sociedade é construída como tijolos numa parede, e é importante que cada pessoa se sinta livre para ser o que quiser, rechaçando os toscos sistemas ditatoriais, nos quais o cidadão é um servo, um escravo, um prisioneiro do Estado. A mãe zelosa entende que cada filho é especial de um modo em particular, e tudo o que é necessário é respeito às diferenças. Mas o Ser Humano não é assim, não é pacífico, e os desentendimentos giram em torno do Narcisismo, pois o narcisista acha que todos devem ser como ele próprio. É a vaidade humana, num Ser Humano ainda infantil, ainda aguerrido. Os espíritos elevados sabem do valor do respeito, pois sem respeito não há Paz, e sem Paz não há Vida; só destruição. Aqui, são várias supernovas estourando ao mesmo tempo, numa comoção, num Universo tão vasto, tão arrebatador para um Ser Humano que simplesmente não pode observar a totalidade do Cosmos, visto a lentidão inacreditável da velocidade da Luz. Aqui, é como um programa de culinária com uma câmera aérea que filma a panela de cima, com vários pratos sendo feitos, na criatividade de um chef que sabe que o cardápio tem que se diversificar sempre, pois, do contrário, a audiência cairá, no modo como a Vida é luta, sempre. E se eu parar, vou desaparecer, no modo como, na Dimensão Metafísica, não falta trabalho. Aqui, são várias goteiras gotejando, emanando suas ondas, suas irradiações, suas repercussões, na áurea Era do Rádio, como hoje vivemos o fortíssimo paradigma da Internet. Essas formas de WK são uma família, pois comungam da forma de círculos concêntricos. Mas cada forma é ela mesma. Aqui, há uma regra, mas uma regra mínima, nunca muito rígida, e é uma regra que visa a Harmonia, e não a Opressão. A Vida em Sociedade é feita de regras morais, havendo o tenebroso Umbral para os seres humanos de atraso moral, na inesquecível imagem da Serpente da Malícia sendo esmagada pelos alvos pés de Nossa Senhora. Aqui temos vários membros da mesma banda, numa união musical na qual o individual some e o coletivo aparece. São como várias espécies de maçã, ou várias espécies de felinos, na Grande Família Metafísica, o poderoso clã espiritual, como no nosso evoluidíssimo irmão Jesus Cristo, numa poderosa mensagem que deverá ecoar por tempo indeterminado. É o Bem, o único poder de fato.


Acima, No Branco II. Duas paladinas lanças cortam o quadro, como no formato de um raio de tempestade, como um deus do trovão, castigando os humanos na Terra, ou como um Zeus, reinando soberano sobre os outros deuses, na ideia hierárquica de que a Universo foi concebido por uma inteligência suprema. Uma das lanças parece uma vara de pescar, como num indígena, tendo que ir ao rio para trazer a riqueza do dia, impedindo que a tribo passe fome, no fato de que a Vida é luta e labor tanto para os civilizados quanto para os neolíticos, na batalha diária. No canto inferior direito vemos traços retos, formando uma faixa de pedestre, provendo uma zona de conforto para um artista produzir confortavelmente, no fato da Vida em Sociedade ser repleta de regras (necessárias), havendo uma política de punição aos que não respeitam leis como a faixa. As faixas se alternam entre noite e dia, no modo humano de organizar a Vida como compartimentos, com uma jornada por vez, dia após dia, na disciplina necessária a um artista, tendo que produzir sem ficar exposto às tormentas e às instabilidades das emoções – Arte é cabeça. Pelo quadro podemos ver espécies de tabuleiros de Xadrez ou Damas, na espécie de jogo que é a Sociedade, num acordo – eu faço tal trabalho e você me remunera. Os jogos existem para estimular a Inteligência, e a pessoa, desde muito pequena, é desafiada a ser boa de jogo, como num campo de batalha, no qual os militares de alta patente regem os de baixa patente, nas inevitáveis hierarquias sociais. No quadro vemos peças translúcidas, como vitrais de igreja, no modo como as religiões conquistam a fé da pessoa, na tentativa religiosa em entender o plano divino para conosco, os encarnados. Então, não há certezas, e a Fé e a Esperança entram em jogo, nunca garantindo, nunca provando algo, sempre desafiando a mente do encarnado. Neste quadro há várias pontas de faca, várias quinas cortantes e agressivas, no inevitável formato agressivo piramidal, num paradigma arquitetônico universal, em várias civilizações, no modo como há muitas pessoas que creem que a Humanidade nasceu e se desenvolveu só por causa de uma intervenção alienígena antiga, numa espécie de colonização, como uma Europa, impondo padrões ocidentais a culturas exóticas ao redor do Mundo, na eterna arrogância humana em se achar perfeito. O fundo branco traz a predominância da Paz, e este quadro é como um grande conflito, uma grande briga, um grande arrancarrabo, com pontas de faca brigando, no sangue de tantos jovens derramados em nome de uma disputa de vaidades, num país querendo dominar o outro, num rei que nunca está contente com seu próprio reino, sempre querendo mais, sempre rompendo com a Paz, sempre aguerrido, raivoso. Essas quinas são como bumerangues, no fato de que tudo retorna à pessoa, e Amor retorna na forma de Amor, na conhecida questão de que a pessoa recebe direitinho o retorno das coisas, tendo que aprender a ser mais gentil, humana e ética. Do contrário, Umbral, ou seja, sofrimento. Vemos um pequeno círculo negro vazado no quadro, que é um ovo sendo colocado, nos mistérios biológicos, na simples questão de não sabermos o que faz um coração bater, como uma bateria de energia, uma pilha. Este círculo é a centralização, o objetivo, o equilíbrio, numa pessoa feliz que tem algo para se centrar na Vida, numa Vida organizada, centrada no labor, no esforço, numa cabeça que é colocada para trabalhar. Dentro do círculo há um ponto vermelho, como um olho, ou um olho mágico em uma porta, no privilégio que uma pessoa tem em visualizar mentalmente alguma coisa do Futuro, do porvir, como uma bola de cristal, no fato de que a Vida é, em geral, um vidro opaco, com pouca translucidez... Então, o imprevisível se torna inevitável, mas a pessoa ainda tem algo que pode prever, como numa intuição, uma inteligência emocional. Este quadro é rico como uma caixa de bombons, coloridos, deliciosos, uma espécie de tesouro da Gula, o pecadinho gostoso, no modo como, na Dimensão Metafísica, há confeitarias com doces divinos, os quais, veja só, não engordam!


Acima, Swinging. O fascinante da Arte Abstrata é que cada um vê o que quiser na obra, rendendo múltiplas interpretações, como nos testes em consultórios de Psicologia, nos quais o terapeuta mostra imagens dúbias ao paciente perguntando o que este vê, podendo, então, traçar um diagnóstico psicológico. Este quadro é como uma fábrica, numa esteira de produção, com bens sendo feitos para um sedento mercado, como numa China, um gigante industrial, uma nação que, de jure, é comunista, e, de fato, é capitalista. Podemos ouvir o som das fábricas, com seus equipamentos funcionando, fazendo ruídos com os quais seus trabalhadores já estão habituados. As fábricas têm odores característicos, como na indústria química que nasceu com minha família, num cheio de vinho no ar. Aqui, há equipamentos complexos, de última geração, num parque industrial arrojado, produzindo riqueza e empregos. Vemos círculos ou bolas levitando no ar, como balões festivos, na magia infantil dos balões coloridos, no cheiro de látex em festinhas com balões, no boom de um balão estourando, como o Big Bang, na explosão, no orgasmo primordial. No canto esquerdo superior vemos linhas liquidiscentes, como nos hieróglifos do Egito, com um fonema correspondente às águas do Nilo, no modo como há no Xintoísmo uma deusa responsável pela fluidez, seja no ar ou n’água. Este processo de fabricação é uma operação truncada, dura, num processo repleto de etapas, como numa linha de montagem de carros, num processo longo e complexo, no qual o produto, para ser concebido, tem que galgar um caminho tortuoso até a conclusão, como numa Vida, numa encarnação, na qual a pessoa passa por muitas, muitas experiências, colecionando vivências que visam o aprimoramento moral do indivíduo, num processo de depuração e crescimento. Abaixo das linhas liquidiscentes, vemos uma meia lua produzindo bolas, como bolas de futebol, ou bolas de tênis, ou bolas de enfeite de Natal, fazendo metáfora com Tao, a incessante fábrica inteligente que está sempre criando, na brecha, na porta aberta da qual tudo emana. Ao lado, quadradinhos coloridos, num quadro bem colorido, num WK sedento por um pouco de alegria, numa pessoa que viu a Rússia se tornar União Soviética, numa parte do Mundo mergulhando em algo cinzento e triste, no modo como as ditaduras não trazem felicidade ou contentamento ao cidadão. Este vitral faz a luz ficar divertida e leve, no fascínio dos lustres de cristal, como numa sala de estar chic, com um anfitrião altamente polido e agradável, numa recepção tão elegante, nas avassaladoras salas metafísicas, num momento de interação social cheio de felicidade e propósito, havendo no Umbral (e no pensamento imoral) uma pornográfica falta de sentido, de modo que a Lógica e o Bem são aliados – gêmeos siameses. Podemos ver pelo quadro algumas pontas de flecha, numa matéria prima sendo processada para virar produto, no modo como o Mercado á altamente concorrido, e, ao entrar em cena, o há o espírito guerreiro do indivíduo, sabendo que precisa ser muito, muito competente e nobre se quiser vencer em um terreno tão concorrido. Podemos ver um pouco de Picasso aqui, numa época em que a Arte rompia com velhos padrões acadêmicos, fazendo da Arte uma precursora, que avisa quando novos tempos estão chegando, como uma ave anunciando a tempestade, ou um galo anunciando um novo dia – a Arte é um essencial instrumento de transformação. O fundo deste quadro é predominantemente cinzento, talvez num WK catarseando um sentimento de tristeza ou de descontentamento, numa pessoa querendo se encontrar, fazendo algo que lhe dê projeção e satisfação, no desafio do autoencontro. Acima de praticamente tudo no quadro, um grande círculo negro, como uma pupila arregalada, observando o Mundo, querendo trazer este para uma tela no atelier, buscando ser visto por este mesmo Mundo, nas ambições hollywoodianas em causar comoções de bilheterias, marcando épocas e arrebatando troféus. Na porção mais abaixo, vemos uma meia luz translúcida, como uma lente de contato, no modo como o artista faz com que vejamos o Mundo com mais clareza.


Acima, Vários Círculos. Microorganismos nos princípios da Vida na Terra, nos mistérios que perduram pelos tempos: o que é a Vida? Estamos aqui numa profundeza oceânica escura, com seres ainda não descobertos, numa multiplicidade e numa variedade incríveis. O fundo deste quadro remete a um Mapa Mundi, num Homo sapiens que surgiu de uma forma tão misteriosa, no chamado Elo Perdido, quando a escrita de repente surge, trazendo as luzes da Civilização, na linguagem universal que une os inteligentes. Aqui é uma face da Terra que está mergulhada na noite, na irônica alternância barroca entre claro e escuro, num contraste, fazendo da noite uma ilusão, pois o Sol, na verdade, jamais de põe, e os parâmetros humanos de tempo e espaço são insignificantes na imensidão espacial, fazendo da Terra um barquinho ínfimo que vaga por um oceano eterno e desmedido. Aqui, são como várias gotas coloridas caindo, causando a irradiação de ondas, como o Sol irradiando, na capacidade artística de irradiar percepções e iluminar a mente das pessoas, tocando fundo nas percepções catárticas, esses vômitos maravilhosos que causam no espectador, ao sair da sala de Cinema, a sensação de alma lavada, no Bem vencendo o Mal, como nos desenhos animados para crianças, num herói que ensina que a Virtude é melhor do que a Malícia, numa educação espiritual que visa formar cidadãos de bem. Em todos estes círculos, há uma hierarquia, pois uns são menores; outros, maiores. Eles estão em momentos diferentes de desenvolvimento, e os maiores regem os menores, visando que estes, um dia, cresçam, no lógico caminho evolutivo do espírito, visando o constante aprimoramento moral, como uma pessoa se desprendendo do corpo carnal e se tornando um anjo assexuado. Aqui, é como um grande planeta com várias luas ao redor, numa dança de rotação ao redor da Grande Mãe, do Lar, da referência, no modo como uma boa alma, ao desencarnar, sente-se indo para um lugar onde se sente muito segura e bem disposta, pronta para trabalhar e continuar tocando a Vida para frente – o Reino dos Céus não é só feitos de anjinhos barrocos tocando harpas. Temos aqui muita diversidade, alegria em meio a um fundo tão escuro e imprevisível, com a irreverência quebrando o gelo, trazendo um tanto de confetes em um baile carnavalesco, num momento de euforia e interação social, com casais se encontrando e se apaixonando – escrevo esta crônica em pleno Dia dos Namorados! Aqui é como uma sopa de olhos, com muitos e muitos olhos nos olhando, como se estivéssemos num filme, com multidões de audiência, observando nossa trajetória e nossas escolhas. WK gosta de fazer jogos cromáticos, com cores se misturando. Aqui, são como várias religiões convivendo em Paz, sendo umas grandes e outras pequenas, no fato de que o qualitativo deve estar acima do quantitativo, guardando as proporções, não importando para uma pessoa se esta está numa cidade grande ou pequena. Estas bolas são como túneis na teoria científica dos Buracos de Minhoca, portais estelares que, em um dia remoto, possibilitarão à Humanidade surfar pelo Universo em uma velocidade muito mais rápida do que a da Luz, fazendo com que cientistas sonhem, pois o sonho é o combustível que move a Ciência, fazendo da Razão um meio de descoberta. Neste quadro, não temos elementos fálicos ou agressivos, e tudo flui tranquilamente, como num casal feliz, em que um se entrega ao outro, numa total ausência de tensão, com um tomando café da manhã sentado no colo do outro, num momento em que o Mundo lá fora fica lá fora – o Amor é lindo. Vemos aqui um grande círculo negro, como um buraco negro, nos mistérios de força que sugam até a Luz, nas inúmeras demonstrações do poder de Tao, num Universo realmente imenso, sendo difícil ao Ser Humano entender o que é o Infinito, pois o Ser Humano é finito. A Eternidade é o maior presente de todos, pois é feita de um material nobre, que dura para sempre.

Referências bibliográficas:

Wassily Kandinsky. Disponível em <www.ebiografia.com>. Acesso 5 jun. 2019.
Wassily Kandinsky. Disponível em <www.pt.wikipedia.org>. Acesso 5 jun. 2019.
Wassily Kandinsky Obras. Disponível em <www.google.com>. Acesso 5 jun. 2019.