quarta-feira, 25 de março de 2020

Bravo, Baravelli!



O paulistano Luiz Paulo Baravelli, nascido em 1942, chegou a estudar Arquitetura e foi cronista do jornal Folha de São Luiz Paulo, digo, de São Paulo. Apreciador da Pop Art, LPB foi premiado pela Associação Paulista de Críticos de Arte, tendo exposto na Bienal de Veneza e até em Tóquio. Os textos e análises semióticas a seguir são inteiramente meus. Boa leitura!


Acima, Banhista. A sensação libertadora de se estar na beiramar. Aqui, temos um enfoque de perspectiva, pois o artista vê de baixo a figura humana. É uma figura bela e atlética, no masculino da Garota de Ipanema, uma menina que conquistou o poeta por ser uma menina fina e discreta. No Céu aqui, tudo limpo, com algumas inofensivas nuvens, no modo como, encarnados, jamais podemos “baixar a guarda” completamente, como, por exemplo, andar na rua nunca achando que absolutamente nada acontecerá, como ouvi recentemente: “Como é que se chama quando tudo está perfeito? Ilusão”. O quadro me remete a um episódio da animação A Pantera Cor de Rosa, quando a pantera está na beira da praia, e no desenho há um homem extremamente atlético, no termo “Tarzan de praia”, numa pessoa para a qual o excelente condicionamento físico é absolutamente capital, numa personalidade atlética. Aqui, a cabeça do homem está diminuída, ínfima, talvez numa castração intelectual, talvez com algo vazio e obtuso. É como numa certa tribo primitiva, que decepada vítimas e fazia com que a cabeça fosse diminuída por alguma técnica. Aqui, o homem parece não saber exatamente o que fazer, talvez numa pessoa perdida e deprimida, sem Norte, inerte em sua dificuldade de agir, de fazer algo da Vida. É como um certo ator, cujo nome não mencionarei, num homem que é um Apolo de atlético, mas uma pessoa medíocre, sem talento ou inteligência – por fora um deus; por dentro uma nulidade. Aqui, é a vida de uma pessoa girando em torno de uma academia, como nos infelizes rapazes cujas vidas é malhar durante a semana e puxar briga em estádios no fim de semana. A Mente tem que estar acima do Corpo. Este homem de Baravelli está cabisbaixo e deprimido, contrastando com a alegria de um dia de praia glorioso, com Sol e um delicioso Mar. O homem está absolutamente pálido, sem tomar uma gota de Sol, como se fosse um pálido londrino, num país em que dias de Sol são raros e concorridos, fazendo com que tais povos, em regiões de pouco calor, tenham a vontade de visitar lugares quentes como o Rio, e, na contramão, cariocas vão a Gramado exatamente para passar frio! É a questão da eterna insatisfação humana: se está liso, quer encrespar; se está crespo, quer alisar. E, como diz Tao, se não estou o tempo todo querendo coisas, posso ter Paz. Aqui, a areia está parte imaculada, parte maculada, como nos sentimentos de uma pessoa, sofrendo por brigar com um ente querido, mas, mesmo assim, preservando uma parte intocada, numa reserva, num retiro, na importância da pessoa ter momentos de solidão, ao contrário de um casal estressado, que convive tanto no Lar quanto no ambiente de Trabalho. Vemos ao fundo dois guardassóis solitários, desocupados. É a reserva, numa pessoa se protegendo dos impiedosos raios de um Sol de verão, no modo como é uma virtude a pessoa desenvolver tal resguardo, protegendo-se, mortificando-se emocionalmente para, assim, ver o Mundo sem ter expectativas, pois quanto mais espero tolamente, mais me frustro. Podemos ouvir aqui o doce som da orla, como adormecer na praia ao som do Mar, com os sonhos embalados pelos doces braços de Iemanjá, a Rainha para a qual todos voltaremos um dia, um belo dia, pois se, quando nasço, eles riem e eu choro, quando parto, eu rio e eles choram! A sedução da orla está neste vazio, pois Tao é isso, é o vazio, é a página branca na qual desenhamos. É a dignidade do espaço vazio, servindo ao Mundo, como num calçadão em um balneário, abrigando crianças com suas bicicletinhas e pessoas saudáveis caminhando e correndo. É como num centro de mesa, o qual tem que estar vazio, para abrigar comida, vida, alegria, como Tao, o provedor, o tal vazio que é circundado por tudo e todos.


Acima, Dentro. A mulher nua repousa tranquilamente, de costas para Baravelli e para o espectador. Ela parece ser uma escultura, como na escultura em frente ao STF em Brasília, numa Justiça a qual, cega, julga a todos igualmente. Esta musa de LPB é cinzenta, como num dia encoberto, cheio de incertezas encarnatórias, num mundo em que, apesar de termos Fé, nunca temos a absoluta certeza de que somos especiais, uma incerteza que se dissolve na Dimensão Metafísica, onde o cinzento dá lugar a iluminados dias de Sol, com raios que, apesar de poderosos, não ofuscam nossas vistas, pois, em tal nível, não estamos mais conectados a nossos respectivos corpos carnais, os quais são sensíveis ao Calor, ao Frio, ao Sol, à Dor etc. A mulher aqui está com um elegante e disciplinado coque, como Evita, com os cabelos contidos, domesticados, como num cachorro treinado, no modo como é capital o desenvolvimento de Disciplina, em contramão a uma vida desregrada; uma vida sem rumo, Norte ou sentido. Ao lado da mulher vemos uma convidativa piscina azul, num dia de diversões na água. Mas a mulher parece não se importar com a piscina, algo que me remete a uma coleguinha que tive no Ensino Fundamental, uma colega que, em minha festinha de aniversário, caiu propositadamente na minha piscina, ou seja, foi uma loucura de festa para ela, como numa pessoa que sabe aproveitar o dia, aproveitar a Vida e aproveitar as oportunidades. Há aqui uma continuidade cromática, pois o chão também é cinzento, na triste Quarta-Feira de Cinzas, nas reminiscências de uma lareira, com o calor do fogo extinto, num fogo voraz, que devorou a lenha toda, como numa pessoa ambiciosa, que tem sonhos e sonhos, como, por exemplo, merecer o respeito e a apreciação por parte de outrem, por parte da Sociedade como um todo, no grande desafio que é a imposição de Respeito. O Sol banha as costas desta modelo, e é um momento de prazer, na libertadora nudez, no termo “lagartear”, encontrando prazer em atividades simples, como estirar-se ao Sol, no modo como o melhor da Vida é de graça. Esta mulher parece ser feita de uma cerâmica cinzenta, com um artista que imita o esmero de Tao, o grande artesão, um ser produtivo, o qual está sempre trabalhando, no fato de que é só o labor o que dá satisfação a alguém, pois como são desafortunados os que não produzem! De pernas cruzadas, como em posição de índio sentado, as costas da mulher estão relaxadas, e ela não está num momento de tensão ou alarde, como numa pessoa que se mantém tranquila em meio aos histéricos alardes do infame Corona vírus. Neste quadro, há uma boa porção negra, imprevisível, no fato de que ninguém sabe exatamente cada coisa que acontecerá em sua vida, pois, se soubesse, tais coisas não aconteceriam então, pois nem sempre é permitido à pessoa prever com precisão o Futuro. São os desígnios de Tao, o Pai que quer o melhor do melhor para seus filhos, num ato de Amor Eterno, pois se não é eterno, não é Amor, não é Liberdade, não é Prazer. É como no tradicional quadro negro nas escolas de antigamente, num professor empenhado em mostrar com extrema clareza aos alunos, no paciente e persistente trabalho de se lecionar, num trabalho no qual um aluno aplicado dá sentido à vida de um professor, no prazer de ser ver o aluno aprender algo de fato, e não num aluno que simplesmente decora a matéria para, depois, esquecer-se de tudo, como numa exigente professora de Filosofia que tive, a qual exigia provas de que o aluno entendera a matéria; entendera o filósofo estudado. Aqui, temos este túnel negro, sem qualquer luz ali dentro, longe do acalentador termo “uma luz no fim do túnel”, ou seja, longe de alguma esperança, talvez num Baravelli catarseando um sentimento de imprevisibilidade; um sentimento de falta de garantias, pois não há garantias científicas da Vida após o Desencarne... São as limitações da Ciência, num esforço mental que muito ainda tem a galgar. A mulher observa tal perspectiva, calmamente ponderando se entrará ou não em tal desafio, como num espírito desencarnado que está prestes a aceitar uma nova “aventura” na Terra, ou seja, um novo aprendizado, no caminho da depuração moral.


Acima, No Museu (nº1). Vemos um pedaço de coluna quebrada, caída a chão, como se fosse um remoto vestígio de alguma civilização perdida, como no Egito Antigo, sendo perdida toda a linhagem dos faraós, pois o Tempo passa, as pessoas morrem e os fatos se perdem. É como se um terremoto tivesse acometido este museu de Baravelli. O teto é a céu aberto, azul anil, com estrelas dispostas ordenadamente, longe do caos cósmico, com galáxias jogadas na imensidão como conchinhas à beiramar. É como um vestido de Elizabeth I, com pérolas bordadas, na missão de um líder em dar tranquilidade ao próprio povo, na noção de ordenar o caótico, como num presidente acalmando os temores do povo em relação a alguma pandemia ou epidemia. Na porção esquerda superior, uma fração de um templo egípcio, no modo como a Arquitetura pode ser um aliado que ajuda algum governo a se impor, com templos grandiosos, que tentam imitar a maravilhosa grandiosidade dos lugares metafísicos, lugares estes que cumprem incondicionalmente os sonhos de um arquiteto de mão cheia, talentoso. É no termo “casa grande”, que significa “faraó”, fazendo metáfora com as mansões da Vida Eterna, num Tao empenhado em acolher seus próprios filhos da melhor forma possível, tendo que haver, na Terra, um contentamento, numa pessoa conformada em morar, provisoriamente, em um apartamento regular de dois quartos, quiçá um quarto, numa frase ensinada pelo meu pai: “A maior riqueza é se contentar com pouco”, pois se estou o tempo todo querendo e ambicionando, como posso ter Paz? Na porção inferior do quadro, um princípio de escadaria, com mágicas escadas, fazendo com que plainemos por seus degraus, na deliciosa sensação de leveza e liberdade, como no orgasmo de uma supernova explodindo, como num artista estourando pela TV ou Rádio, na ambição de qualquer pessoa em brilhar como um diamante, uma lição ensinada por Tao, a grande estrela. Esta escadaria também tem aspectos de arquitetura clássica grega, no modo como a Grécia se tornou tal pilar do Mundo Ocidental, dando-nos Democracia, Ciência e Filosofia, por exemplo. Esta escadaria projeta uma sombra no chão, como no asilo de um guardassol em um dia tórrido de Verão, no modo como posso ser inocentemente ofuscado por outra pessoa, ensinando-me uma lição importante, uma lição que nenhum livro pode ensinar... Quase ao centro do quadro, parece haver uma tábua de vidro, na qual está desenhada um par de coxas e um bumbum, como numa deliciosa coxa de frango, talvez harmonizada com um bom vinho branco. É um respeitável corpo atlético, no modo como os espíritos desencarnados têm a graça e a força de corpos muito atléticos, havendo no atleta, aqui na Terra, uma noção estética das intenções de Tao quando este criou o Ser Humano. Não podemos ver aqui se é um corpo masculino ou feminino, como anjos sem sexo, e parece um atleta pronto para dar um elegante e disciplinado salto, no modo como é capital o desenvolvimento de Disciplina, como numa professora de balé que conheci, uma pessoa extremamente séria, exigente e disciplinada, como diz Marília Pêra na ótima peça teatral Master Class, interpretando uma altiva Maria Callas: “Se vocês acham que vão obter sucesso sem se dedicar ao má-x-imo, há! É só isso que tenho a dizer: Há!”, numa metalinguagem, pois é esmagadora estrela falando de esmagadora estrela. O chão deste museu a céu aberto é de um verde desmaiado, discreto, longe de um vibrante verde de um campo de futebol. É como se alguém estivesse fraco, desmaiando, no que me remete a um desmaio que tive certa vez num restaurante, desmaio causado porque fiquei muito tempo virado com a cabeça para trás, pressionando um nervo do pescoço! E, por fim, vemos no fundo um quadro com motivos de artesanato indígena, num bordado com formas geométricas, na claustrofobia de O Iluminado, na fragilidade da mente humana em situações de confinamento, como no estresse inevitável de participantes de um Big Brother.


Acima, O Círculo RBK. Temos aqui um nu feminino, só que pós moderno, inusitado. A cabeça é um recorte oval, na magia de um colorido ovo de Páscoa, com seu doce perfume sedutor, num dia de gula e alegria, no modo como é necessário que sempre guardemos dentro de nós mesmos uma porção de tal infância, evitando nos tornar empedernidos demais. Vemos um grande círculo bege abrigando uma pose não ultrajante nem agressiva, como numa pose da revista Playboy brasileira, com um nu de bom gosto, visando o erótico sem o vulgar, ao contrário de outras revistas, as quais tratam o nu de forma estritamente sexual, maliciosa – é uma honra para uma mulher posar para a Playboy brasileira, como numa sessão de autógrafos que fui em Porto Alegre na edição da atriz negra Isabel Fillardis, no modo como seria tsunamicamente bombástica uma Playboy com Maysa. Esta mulher estranha de Baravelli parece estar com os braços atrás da cabeça, como em panfletos de bordéis distribuídos aos transeuntes no centro de Caxias do Sul, na diferença cultural entre Brasil e EUA, onde prostituição é crime, num cidadão que não tem autonomia sobre o próprio corpo – logo nos EUA, que se dizem o paladino baluarte da Liberdade. Aqui, vemos uma vulva tímida, um tanto encoberta, como numa Lua minguante ou crescente, num nu instigante, que nunca se revela por completo, evitando o óbvio, na brincadeira do Erotismo: parece que é o Sexo, a genitália, quando, na verdade, não é! Esta estranha mulher de Baravelli parece usar um tomaraquecaia, escondendo os seios, na beleza de uma mulher com os ombros expostos, como numa provocante Evita almoçando com o Papa, na atriz exibindo um dos ombros, como numa Sharon Stone em uma edição da entrega do Globo de Ouro, com uma das alças do vestido caída, numa provocação tão inocente, como no polêmico livro Sex de Madonna, um livro que, apesar de ter causado tanto frisson, é um livro de nu artístico de extremo bom gosto, sem nus agressivos ou óbvios. Nesta figura, há uma certa porção negra, escura, como num túnel negro, como na horrenda e sombria toca de Laracna de Tolkien, num útero maldito, malfalado, amaldiçoado, longe do iluminado e imaculado útero de Galadriel do mesmo autor, numa escuridão sendo iluminada pelo uso da Razão, do Raciocínio, da Inteligência, pois, já ouvi dizer, tudo o que Joãozinho deve mostrar é a própria inteligência de Joãozinho, na bipolaridade de Disney entre Bem e Mal, dando noções morais para uma criança, no discernimento entre mundano e virtuoso, a lição que o livro de Tao tenta ensinar. As pernas desta modelo são douradas, como no corpo da Garota de Ipanema, havendo no ouro a metáfora com o grande astro rei que rege o sistema solar, a grande e verdadeira pérola sem a qual a Vida não seria possível. Este vestido tem uma faixa verde no busto, num fértil reino regido por um rei que respeita o cidadão, como se fosse um médico, zelando pela saúde e pelo bem estar do povo, curando doenças e conquistando o respeito do povo, pois um líder desrespeitado não pode governar, pois é uma piada; não é levado a sério. Abaixo desta faixa de fértil campo, vemos a cor da sedução e da luxúria, num vermelho, no encanto sensual de uma mulher que veste vermelho, numa maravilhosa Kelly LeBrock em uma comédia dos anos 80, parafraseando Marylin Monroe na cena de um vento levantando a saia da estrela, no talento que certas pessoas têm em flertar com o Público, fazendo da Arte uma inocente e formidável provocação, afetando a atingindo as pessoas, no dever que a Arte tem em mexer com as pessoas, gozando de Liberdade, longe de sistemas ditatoriais, que fazem com que o artista seja uma simples e mera ferramenta de ideologia nacional. Este círculo bege é como uma Lua, perfeitamente redonda, como numa Julia Roberts no pôster do filem Um Lugar Chamado Notting Hill, com a estrela iluminando com a suave luz do luar, na pérola barroca que tem suas próprias regras, ignorando a ordem linear da sucessão de dias e noites, num Sol sisudo, compartimentado, com diz Chico Buarque, na mulher atrapalhando e seduzindo home que está saindo para trabalhar.


Acima, Paisagem com Dois Personagens Poderosos. Aqui, temos um emaranhado de linhas retas e tortuosas, numa suruba.  Vemos uma mesa farta, digna de rei, na fartura de uma galeteria, assustando o turista, que não está acostumado com tal opulência gastronômica. É a mesa farta com a qual o imigrante italiano da Serra Gaúcha sonhava, no duro início da vida do imigrante no Rio Grande do Sul. Vemos um volumoso peixe em uma travessa ricamente guarnecida, remetendo ao milagre de Jesus da multiplicação dos peixes, numa interferência sobrenatural, no poder da dimensão acima da nossa aqui na Terra, no modo como, em hierarquia, tudo na Dimensão Física gira em torno da Dimensão Metafísica, e uma das provas disso é o atual surto de Coronavírus – são as cidades daqui, da Terra, que tentam desesperadamente imitar a cidades de lá, do Céu. Vemos aqui muitas frutas, numa granja farta, remetendo-me a uma querida vizinha, a qual sempre visitava o vizinho levando algo de seu próprio pomar, num ato de generosidade, no prazer de presentear alguém, num coração generoso, algo distante do egoísmo sociopático, numa base de comparação, pois se digo que algo é belo, é porque conheço o oposto, que é feio, ou seja, esta é a função do Mal – delinear, reconhecer e valorizar o Bem. Essas linhas retas cortam o quadro da esquerda para a direita e de cima para baixo, como numa cidade como Manhattan, num kilt, com linhas se encontrando, como pessoas passando umas pelas vidas das outras, como certa vez conheci um amigo, e ambos estávamos passando por um momento devastador, só que cada um de um modo, nas perfeitas teias da Divina Providência, numa forma de poder tão sutil que mal pode ser vista, havendo no homem sábio, na Terra, um representante de tal poder benevolente. Neste quadro, temos um jogo complexo de contraste, e porções brancas contrastam com pardo, vermelho e azul marinho. É como se o quadro tivesse sido cortado impiedosamente por um estilete, como nas garras agressivas do carismático herói Wolverine, no ato de um artista deixando sua marca no Mundo, provocando cicatrizes psíquicas, na capacidade de algumas pessoas em marcar épocas, com artistas que se tornam figuras emblemáticas de suas próprias épocas, fazendo da Arte tal instrumento impositivo. Na porção esquerda superior, vemos um cesto com vários ovos, numa granja fértil, na magia de um farto ninho de Páscoa, ou no desenho de Pica Pau, com o esfomeado personagem comendo tudo o que vem à sua frente. Os ovos simbolizam a Vida, na força misteriosa que traz seres vivos ao Mundo, pois a Vida é um grande mistério, pois qual é o “combustível” que faz um coração bater? Ao olharmos para esta farta mesa de Baravelli, podemos ouvir o burburinho do interior de um restaurante, e podemos ouvir o tilintar dos talheres tocando nos pratos, no ritual polido que existe numa refeição, numa pessoa polida, usando os talheres elegantemente, havendo na alimentação o ato mais elementar da Vida. A travessa oval é um planeta circundando uma estrela, no poder das forças gravitacionais, no modo como algumas pessoas pensam que a Terra é plana... Neste quadro de natureza morta, podemos sentir o cheiro de um peixe fresquinho, num urso esfomeado capturando um salmão na correnteza de um rio, na tarefa diária de se partir em busca do sagrado alimento, no ato de se rezar e agradecer pela comida, antes de cada refeição, havendo na gratidão uma gigantesca virtude, como num filho, eternamente grato por sua mãe, no maravilhoso fato de que os vínculos de família não se desfazem com o Desencarne, ou seja, qualquer desentendimento de família terá término, e a harmonia sempre virá e impor-se-á. Estas porções brancas deste quadro remetem à magia de um dia que amanhece nevado, na beleza de uma terra branca e imaculada, havendo na Beleza a promessa de um mundo melhor, muito além na pequenez dos conflitos terrenos – o Mundo não mudará, mas poderá haver promessas de uma dimensão melhor.


Acima, sem título. Temos aqui silhuetas de mulheres formosas, numa dança erótica que tanto esconde quanto revela, provocando a imaginação do público, na famosa cena da vulva de Sharon Stone, nunca revelando tudo por completo, no cruzar de pernas mais famoso do Cinema, caindo nas graças do finado crítico Rubens Ewald Filho. Aqui, é como um papiro, no papel do papel na História da Humanidade, havendo na Escrita o que trouxe o Ser Humano à Civilização. No centro da cena, uma figura que remete a um Oscar, na cobiça que move o Ser Humano, na obsessão por sucesso, fama e dinheiro, havendo um fetiche materialista no troféu mais famoso do Mundo, num mundo onde tudo gira em torno de quem está por cima no momento, na gangorra da Vida, pois ninguém está por cima o tempo todo, pois, já disse e repito, o Sucesso é um amante infiel. Este papiro é leve, muito leve, quando o fino se sobrepõe ao grosso, ou seja, é a vitória da polidez sobre a estupidez, havendo no homem de Tao o líder extremamente polido, representando dignamente todo um povo, toda uma civilização, na arte de bem receber e bem acolher, no modo como dá gosto sentar e conversar com uma pessoa educada e humilde, uma pessoa que sabe que não é o centro do Universo, e é exatamente esta humildade o que torna tal homem o dono do Mundo, na divertida contradição taoista. Este papiro é dividido entre antes de depois, num marco, na passagem de Jesus pela Terra, numa pessoa que tem o dom de inclinar o Ser Humano a um patamar mais alto e mais nobre, como num esforçado professor, empenhado em ensinar o que é válido e correto, num trabalho de muita paciência, pois o Ser Humano está o tempo todo sendo seduzido pelos atalhos traiçoeiros da arrogância, confundindo esta com altivez, no modo como pode ser difícil ensinar tal discernimento. O papiro é ladeado por duas figuras femininas, com amplos quadris, numa mulher fértil, como numa rainha Victoria, trazendo filhos e mais filhos ao Mundo, no modo como o Patriarcado infelizmente vê a mulher como tal instrumento de produção, no incrível machismo que irrita profundamente qualquer feminista. Uma dessas mulheres é branca; a outra, negra. É como num desfile de Moda com Naomi Campbell e Claudia Schiffer, no discernimento de Yin e Yang, onde tudo carrega em si sua própria contradição, ou seja, no Cosmos, nada mais natural do que a sombra projetada pela luz. A mulher negra posa com as mãos atrás da cabeça, num ato de entrega, numa mulher apaixonada, entregando-se por completo, sabendo, pela primeira na vida, a diferença entre fazer sexo e fazer amor, num ato de rendição, numa pessoa abrindo o seu coração e os seus sentimentos a outra pessoa, num momento mágico de confiança, fazendo que com o cônjuge saiba das tristezas do companheiro, num lindo momento de confidência, no modo como tudo pode ser comprado, menos Amor, num filme que vi quando criança, quando um homem, atendido por um gênio da lâmpada, podia dar tudo para uma pretendente, menos Amor... Já, a mulher branca está com as mãos nas ancas, dançando numa liquidiscência, como num rio tortuoso, circundando terras como uma fértil serpente, na letra de uma canção brega (e fascinante): “Um animal que ronda no véu do luar”. Aqui, temos uma dança de striptease, e podemos ouvir o som vibrante de batidas, como no filme em que Demi Moore, no auge de sua forma física, interpreta uma stripper, arrastando seus seios sobre a passarela de um clube de strippers. É como uma chama em uma vela, sensível, deixando-se levar por qualquer pequena corrente de ar, dançando ao sabor do vento, como diz a canção célebre: “A mulher se move como o vento”. É como uma sacola de plástico voando ao léu, como um surfista surfando sobre uma onda, na capacidade de uma pessoa em saber surfar em tais “ondas”, buscando carona nas oportunidades, numa pessoa pegando carona em um cipó, como no cavalinho branco, que é montado no momento exato. Aqui, o vermelho quebra a sisudez preta e branca, na cor dos bordéis, cheirando a Sexo, ou cheirando à erótica marca Victoria’s Secret.

Referências bibliográficas:

Luiz Paulo Baravelli. Disponível em: <www.catalogodasartes.com.br>. Acesso em: 18 mar. 2020.
Luiz Paulo Baravelli. Disponível em: <www.pt.wikipedia.org>. Acesso em: 18 mar. 2020.

quarta-feira, 18 de março de 2020

Ceramista com Certeza (Parte 2)



Volto a falar do artista plástico recifense Francisco Brennand. Os textos e análises semióticas a seguir são inteiramente meus. Boa leitura!


Acima, sem título (1). Aqui, temos uma bifurcação, como numa pessoa bipolar, dilacerada por sentimentos em oposição, no termo “abraçar o Mundo com as pernas”, numa pessoa indecisa existencialmente. Temos aqui um ser exótico, com a cabeça equivalendo à cauda, como no enigmático cachorro de Cebolinha, num bicho dúbio, nunca se revelando pro completo, assim como é o mistério formidável de Tao: Confronta e não verás rosto; vai atrás e não verás cauda. É como diferenciar sensual de sexual, numa espécie de castração mental. É como despir uma pessoa e, ao se confrontar com a genitália, vemos que não é exatamente a genitália o que atrai – é o senso de humor divino, no ancestral e ótimo talento humano para a Comédia. Aqui, temos um ser se contorcendo em vida, querendo viver, explorar o Mundo, como numa pessoa dentro de casa “arranhando as paredes” em um sábado à noite, louca para sair, beijar, dançar e viver, pois é patética a pessoa que não se permite viver, pois sou meu próprio inimigo... Aqui, é como uma caixa de água cheia, sempre provendo, sempre nutrindo irmãos num mesmo condomínio, na questão do compartilhamento, pois só há graça em se ter as coisas quando podemos compartilhar estas, como na lição de Quico em seu aniversário, repreendido pela mãe quando ele desejou que ninguém fosse ao aniversário, para que Quico pudesse comer tudo sozinho. Este ser de Brennand olha para o Céu, talvez querendo buscar alguma inspiração, como no homem primitivo, olhando para o Céu noturno e vendo deuses nas estrelas, como no mais fino cristal, como na mítica construção do grande panteão hollywoodiano, transformando seres humanos em deuses, atiçando a imaginação do público, na grande ambição de um artista em se tornar estrela, como no nome de uma banda de Pagode, a Constelação, ou seja, cada membro da banda sendo um astro em si, numa reunião. Aqui, é como um cavalo pronto para ser montado, num cavaleiro se aventurando por campos virgens, como nos conquistadores europeus, na barbárie da crueldade humana: os indígenas, que por séculos foram senhores de tais terras, hoje têm descendentes miseráveis. É o infeliz talento humano para o termo “levar tudo a ponta de faca”. Este bicho exótico de Brennand tem certos anéis circundando seu pescoço e cauda, no modo como não canso de remeter às sensuais colunas barrocas, as quais parecem se contorcer tais quais a serpente maligna do Éden, como em certas culturas a serpente não remete ao Mal, mas à Fertilidade e à abundância liquidiscente, ou seja, ao prazer de se sentar numa privada e fazer um delicioso xixi, no prazer de se esvaziar a bexiga. Aqui, é como um alegre cachorrinho balançando a cauda para dono, no modo claro e autêntico com o qual o cão se expressa, ao contrário do gato, que é mais enigmático. É como numa pessoa autêntica, a qual deixa muito claro quando está contente ou descontente, como num brutal Hulk, o super-herói ultra agressivo que deixa claro quando está furioso. Como deve ser lindo e plácido este parque de esculturas de Brennand! Aqui, este ser nos convida a montar e tirar uma foto, como num souvenir, numa lembrancinha comprada para que tenhamos uma recordação. É a coragem do artista em expressar o que há dentro de si, na purificação dos vômitos catárticos. Este ser parece ser um inocente filhotinho, tendo muita vida ainda pela frente, recém aprendendo os passos mais básicos, cercado dos cuidados de pais zelosos, assim como é o zelo de um artista fazendo uma obra, tentando imitar o infindável amor de Tao quando este cria algo, depositando sua integral atenção em tal momento conceptivo. Como são interessantes estes seres estranhos de Brennand, num artista com completo repúdio ao óbvio, ao medíocre, no modo como o grande mestre educador gaúcho Tatata Pimentel desprezava as mentes medíocres. Salve, professor! Certamente Tatata olha, lá do Céu, para todos os seus alunos.


Acima, sem título (2). Um soldado devidamente protegido e resguardado atrás de um capacete, pronto para a sanguinolenta batalha. Seu pescoço também está protegido, impedindo que ele fique numa posição cômoda ou agradável, castrando sua liberdade, seu livre arbítrio de movimentos, como os governos ditatoriais castram a inteligência do cidadão, fazendo da Censura a ilusão de que está tudo sob controle. Dois pequenos orifícios permitem a visão do soldado, mas é uma permissão limitada, restrita. É como a terrível tortura da máscara de ferro, com a pessoa sufocada, morrendo lenta e dolorosamente, remetendo às mortes atuais pelo ultrainfame Coronavírus. Aqui, o soldado é um jovem rapaz, arrancado de seu lar para lutar em nome das vaidades elitistas, no modo como o povo gaúcho virou massa de manobra das elites no episódio da Guerra dos Farrapos. O rapaz está barbeado, com disciplina, aprumando-se para a terrível morte que o aguarda, como num filme de Woody Allen, em que este expressa seu medo de morrer na batalha, sendo castrado pela própria mãe, a qual o enviou à Guerra: “Obrigado, mãe! Esta é minha mãe!” diz um sarcástico e inteligente Woody. É claro que aqui o soldado não sorri, pois como posso ser feliz ao matar meu próprio irmão? Os lábios estão fechados, como num escudo impenetrável, sem lugar para Amor ou intimidade, como numa pessoa que passou por um processo embrutecedor, tendo dificuldades para se ressocializar. Aqui, o nariz mal consegue respirar, sufocado em meio a tantas agressões e crueldades, na feiura devastadora dos campos de batalha, deixando rastros de fome e privação, pois não há Beleza na Raiva, como diz Tao: “A Paz é melhor do que a Raiva”. A pele branca do rapaz, remetendo ao branco, traz uma nesga de esperança, no modo como uma pessoa, que muito sofreu na Terra, encontra alento e libertação na reinserção metafísica, abraçando uma vida cheia de virtude, sem as intempéries materiais, como disse uma velha amiga da adolescência: “Tudo acaba bem. Se não está bem, é porque não acabou ainda”. Mas, infelizmente, esta amiga me excluiu por causa de uma bobagem sobre Política, no talento amargo humano em brigar e se desunir. Não faça assim, amiga! Acabaremos unidos novamente, mesmo que só depois do Desencarne. Uma delgada linha vermelha corta o capacete, como se fosse sangue jorrando de um ferimento de batalha, como no sangue em octógonos, num espaço de glamour zero, onde só a agressividade prevalece, num momento em que o lutador tem que ter um enorme controle emocional, para não levar os golpes para nível pessoal. O soldado aqui está calado, castrado, sem poder ter uma opinião própria, sendo oprimido por um estado vampirizador como Matrix, fazendo do cidadão uma pilha alcalina que só serve para dar energia a um sistema sem sentido, nos meandros de loucura da sociopatia, num líder se apoderando de um estado inteiro. Bem acima na peça, vemos uma saliência, como numa lombada em uma estrada, fazendo com que o condutor tenha cautela, forçando este a diminuir de velocidade, sob a pena de estragar o próprio carro, no modo como a cautela é uma grande virtude, como num líder atravessando um rio, com se tal líder soubesse que há perigos abaixo da água. É como se fosse o penteado punk, como uma grande crista ladeada por um couro cabeludo raspado, nos inícios, plenitudes, decadências e mortes das modas passageiras, dando o tom estético de cada época, como na avassaladora moda feminina de cabelos de Gisele. Aqui, temos um Meridiano de Greenwich, separando tudo entre antes e depois, como na passagem pela terra de espíritos sábios, no modo humano de dissociar e analisar os organismos, engavetando cada especialidade médica. É a organização cronológica humana, compartimentando os anos, meses e dias, no modo como, a nível cósmico, as referências humanas nada significam. Aqui, o rapaz foi forçado a lutar, na insanidade de irmão derrubando irmão, na esperança espírita de que uma dimensão (muito) melhor nos aguarda sempre, sem as pressas cronológicas.


Acima, sem título (3). Parecem nádegas, tendo acima de si um pescoço delgado, sem cabeça, talvez num animal sendo sacrificado e desmantelado para produzir carne. O topo deste pescoço tem anéis, como numa certa civilização tribal que circunda de anéis de ouro os pescoços das mulheres, na brutalidade patriarcal que impõe coisas horrorosas às mulheres, sempre reprimindo a sexualidade feminina, nunca permitindo que uma mulher seja livre para desenvolver uma vida sexual de fato, no arquétipo da Virgem Maria, uma mulher que simplesmente jamais transou, havendo, porém, uma nobre intenção – a de fazer metáfora com a imaculada Dimensão Metafísica, o útero primordial que nos concebeu de forma imaterial, mental, longe das vicissitudes materiais. Esta peça é um tanto fálica, remetendo à formação rochosa Dedo de Deus, na Região Serrana do Rio de Janeiro, com um longo dedo apontando para cima, na brutalidade patriarcal, fazendo com que vejamos Tao como um homem experiente, um patriarca, o que é uma bobagem, pois o espírito é assexuado, como os anjos, havendo, na dimensão acima, uma espécie de castração, de mortificação, mas numa castração psíquica, nunca literal, no modo como o Espiritismo condena a ação de mortificar o corpo físico – “mortifique o espírito, não o corpo”. O topo deste falo tem um aspecto de parafuso, num artesão atencioso, aprimorando sua técnica, sempre produzindo, como no pai carpinteiro de Jesus, havendo uma metáfora com Tao, o grande carpinteiro, sempre pulsando, sempre trazendo novidades, como numa pessoa que se conscientizou de que não pode parar de trabalhar, apenas, no máximo, tirando férias. O parafuso agressivo perfura a parede, num ato de intervenção, de posicionamento, como num intelectual que faz críticas vorazes a certos vícios sociais, como o Racismo ou o Machismo, havendo, no Mundo, uma questão delicada, num mundo que continuará sempre o mesmo, quer eu queira, quer não. Então, o Mundo se torna todo este palco de debate, numa pessoa que quer demonstrar inteligência para, assim, ser respeitada e apreciada, pois a Vida de uma pessoa desrespeitada é um inferno. Aqui, o artista revela tais nádegas, na divertida frase do genial Luis Fernando Veríssimo: “Quem mostra a bunda em Caras não mostra a cara em Bundas”, em relação à “revista” Bundas criada por LFV. As nádegas são de um nenê recém nascido, com o bumbum agredido por um tapinha do médico, numa agressão de boas vindas, no modo como as dores encarnatórias são inevitáveis, fazendo com que a pessoa conviva com tais dores, até o momento de libertação ao final de uma vida material, havendo a loucura dos que não aceitam que o Desencarne chegou, como num prisioneiro que não quer sair da prisão... Estas nádegas me remetem à bunda de um travesti em uma praia de Florianópolis, com dois rapazes comentando, após o passar do travesti: “Isso não é bunda; isso é fábrica de churros”. São como as nádegas do Davi de Michelangelo, uma parte da obraprima que não é revelada ao público, no modo como seria interessante que a Pietà, do mesmo artista, fosse exposta por todos os lados. Aqui, são como duas frutas, ou uma fruta em mutação, bipartindo-se, como nos processos biológicos de Mitose e Meiose, com uma infecção aumentando, multiplicando-se, trazendo doença e mal estar. É um organismo se bipartindo, nas dilacerantes dores de um parto, como numa princesa Isabel do Brasil, sofrendo o diabo numa cama, em um parto complicadíssimo, nos inúmeros sacrifícios que uma mãe faz pelo filho, como minha mãe, a qual depois de eu nascer de cesariana, teve acidentalmente rompidos os pontos da cirurgia, tendo que receber transfusão de sangue, tendo que haver, por parte de um filho, uma eterna gratidão, no lindo modo como os vínculos de família não se dissolvem com o Desencarne – as famílias são eternas. Aqui, são como dois seios, lactantes, cheios de vida e abundância, no prazer de mamar numa caixinha de leite condensado, na magia dos doces, com doces deliciosos sendo feitos na Dimensão Metafísica, mas doces que não engordam! Aqui, são dois testículos que fertilizam a mulher, no modo como a Vida é algo avassalador e implacável, na força de Tao, o Criador.


Acima, sem título (4). Esta mulher está olhando para cima, com a boca aberta, como se quisesse beber uma gota da chuva, num ato de aceitação, como no passe em um centro espírita, quando a pessoa tem que posicionar as palmas das mãos para cima, para assim receber o que Tao coloca em nossas mãos, na felicidade de uma pessoa que se aceita numa boa, num autorrespeito, pois se não aprecio a mim mesmo, como posso ser feliz com meus dias aqui na Terra? A mulher está com o busto exposto, na sensação de liberdade de uma mulher fazendo topless numa praia do Rio, o que me remete a uma capa e um encarte de um CD de Marisa Monte, com o desenho de uma mulher nua, um material gráfico que foi censurado nos EUA, trazendo certas diferenças culturais, na dificuldade protestante em lidar numa boa com Sexo e Nudez, sendo estas naturais no Ser Humano. Esta força feminina parece ser uma esfinge, metade mulher, metade leoa. É o seio da leoa alimentando a ninhada, como na famosa loba amamentando Remo e Rômulo, com traços mamíferos de aleitamento, numa mãe que dá tudo de si para os filhos, num espírito que resolveu encarnar mãe, aprendendo uma lição, como no termo: “Ser mãe é padecer no paraíso”. Aqui, esta forma está num pedestal, como em pedestais em igrejas, no modo como não esqueço do que um padre disse em uma missa: “Essas imagens são mais do que adornos; são exemplos de conduta”. São os nossos irmãos depurados, os quais, apesar de ser tão superiores em apuro moral, amam os seus irmãozinhos “menores”, por assim dizer. Esta mulher tem uma boca faminta, tais quais os bicos de filhotes esfomeados de ave, com pais zelosos que levam comida ao ninho, dando comida ao mais faminto, com a boca mais aberta, como em algum concurso ou competição, sendo premiado aquele que mais merece, na importante questão da Meritocracia em escolas, acostumando a criança com a ideia de que, para se obter algo, é necessário mérito digno, luta. Esta coluna/pedestal é adornada, como numa mulher com autoestima, que se arruma antes de sair de casa, como se soubesse que, no momento de interação social, muitos olhos repousarão sobre tal mulher, pois eu tenho que ser a primeira pessoa que ama a mim mesmo. A mulher parece estar tomando um banho de Sol, como na pele bronzeada da âncora gaúcha Cristina Ranzolin, havendo no banho de Sol um momento de entrega, como se o Sol, em tal momento, fosse um cirurgião intervindo sobre o corpo de um paciente. O pescoço da mulher é firma e forte, como na Catedral de Caxias do Sul, templo erguido sobre uma rocha, sendo, por muitas décadas, o ponto mais elevado da cidade, conotando poder, no estilo “sou eu quem aqui manda”, com as escadarias convidando o fiel a um momento de elevação espiritual, como nesta mulher de Brennand, erguendo-se altivamente, como numa Nefertiti tropical de cerâmica, com sua franca nudez libertadora, conectando-se a tal Céu de Brigadeiro, no delicioso momento da vida escolar – o recreio, fazendo metáfora com a libertação do Desencarne, com tantos clubes cujos nomes remetem a isso, como Clube Juvenil ou Recreio da Juventude, no modo como o espírito desencarnado rejuvenesce e vive jovem e vigoroso para sempre, no modo como a “Juventude Feliz” é uma invenção de velhos, pois, na Terra, cada parte da vida tem vicissitudes, só havendo trégua na Dimensão Metafísica, o verdadeiro clube de recreio e libertação. Aqui, a nudez á altiva, e nunca é reprimida por puritanismo hipócrita. É o modo como o Corpo Humano tanto inspira gerações e gerações de artistas, no modo como Tao foi tão feliz ao inventar coisas lindas, como o cavalo, por exemplo. Aqui, é como uma cantora, uma diva embalando os sonhos do Mundo, fazendo da Música uma forma divina de expressão e Comunicação, no modo como a importância da Arte reside no fato de própria Arte nos diferenciar de todos os outros seres vivos que conhecemos. É a forma humana que ver na Beleza aquilo que nos remete ao nosso próprio sangue divino estelar.


Acima, sem título (5). Temos aqui uma mulher altiva, como numa bailarina que conheci certa vez na PUC de Porto Alegre, uma moça que exalava classe e elegância, como na altivez de Madonna na capa do álbum True Blue, como uma loba solitária uivando, chamando machos para o acasalamento, num poderoso instinto, como numa Sharon Stone assassina em Instinto Selvagem, como uma viúva negra que mata o macho na cópula, logo depois de ser fecundada, ou seja, o macho não mais tem função. O estilo do cabelo desta dama de Brennand remete aos sofisticados anos 1920 ou 1930, na febre das melindrosas, numa revolução estética, como numa Coco Chanel, uma feminista (na prática) que libertou as mulheres das saias e vestidos, dos cabelos compridos e das joias verdadeiras, mostrando que, na barata bijuteria, o que importa é o efeito, num ímpeto de Chanel, cheia de frescor e coragem, mostrando ao Patriarcado que uma mulher tem que ser livre, ora bolas, como numa Mulher Maravilha, dotada de sua armadura, rechaçando os tiros de espingarda machistas, numa mulher que tem o integral controle da própria vida, mostrando ao marido quem é mesmo o dono de quem, ou seja, cada um(a) é senhor(a) de si. Esta musa de Brennand faz uma espécie de renúncia, rejeitando presentes caros de namorados, como se soubesse que, antes de românticos buquês de flores, o pretendente tem que se mostrar sério e íntegro, digno de respeito. Aqui, é como o dedo do meio sendo erguido, como num Neo em Matrix, percebendo as insinuações fascistas de um mundo de mentirinha, assim como as ditaduras são mundos de mentirinha, com artistas sendo horrivelmente forçados a produzir em nome da ideologia vigente – que piada. É o simulacro de Matrix, querendo iludir o cidadão, como no estado totalitário do ousado desenho animado de Aeon Flux, na tirana dinastia Goodchild, do inglês, Boa Criança, e o que é uma boa criança num sistema opressor? É um cidadão que simplesmente não pensa por si mesmo, havendo na castração da inteligência um insulto gigantesco, como uma pessoa que, tempos depois, noto que me insultou mentindo, nesta mesma pessoa achando que sou um tolo sem eira nem beira. Esta musa está de olhos fechados, talvez num artista sonhador, sonhador como qualquer outro artista, com seus sonhos de ser reconhecido estelarmente, na ambição de fazer sucesso e ser muito bem respeitado e bem tratado, no modo como, infelizmente, na Terra, na Dimensão Material, tantos e tantos sonhos são frustrados diariamente, nesta boulevard dos sonhos despedaçados, exigindo muita força do indivíduo, como me disse uma querida professora de Língua Portuguesa: “Não deixe o fracasso subir à sua cabeça!”. E a Vida não exige que sejamos fortes? Talvez tenhamos aqui uma mulher transando, mas não vemos o parceiro. É o direito da mulher em ter uma vida sexual vibrante e interessante, como na personagem Samantha de Sex na the City, uma mulher que vive em plenitude sua liberdade sexual, transando com “meia Nova York”, numa mulher que, definitivamente, não tem vergonha de viver sexualmente, detonando com os arquétipos de mulheres santas, desprovidas de vagina. Esta obra de Brennand me remete a uma escultura que certa vez adquiri em uma loja de decoração, uma escultura que trazia uma mulher muito altiva, com o mesmo gesto de rejeição desta deusa de Brennand. O pescoço desta mulher é longo e forte como o de uma girafa, num animal que nasceu forte, preparado para as exigências do dia, numa leoa circundando gazelas desavisadas, no felino caminhando tão silenciosamente, tão secretamente, até chegar perto o suficiente da presa, abocanhando esta, no termo “matar um leão por dia”, ou seja, aceitar que a vida é luta, como numa Margareth Thatcher de Meryl Streep, dizendo que cada dia de sua vida foi deito de luta, como numa Dercy Gonçalo, digo, Gonçalves, fazendo comédia de uma boca desbocada e suja, no modo como os palavrões, de certo modo, fazem parte de nossas vidas, pois o machucado interior tem que vir à tona, curando a alma de um artista que quer se destacar, no termo em inglês prove yourself, ou seja, mostre ao que você veio.


Acima, sem título (6). Colunas nesta praça à beiramar, como num templo, mas sem teto, como num templo do Egito Antigo, com tanto de si levado embora por milênios de erosão, num fóssil, algo reminiscente, num vestígio, como cinzas numa lareira após uma noite de fogo. São como totens indígenas, numa hierarquia vertical, com a divindade mais poderosa ao topo, como num Zeus, o Rei dos Deuses, ou num Odin, o pai de Thor, num mundo que desde cedo cria as crianças nessa relação social, na necessidade de se respeitar as posições de poder no Mundo, como numa família de realeza, acumulando um grande poder tradicional representativo. Aqui, é como um templo a céu aberto, como nos templos solares do faraó herege Aquenáton, com templos simplesmente desprovidos de teto, bronzeando os fiéis, na adoração do disco solar como a única divindade em todo o Universo, sendo o restante filhos de tal Pai Supremo, dando de presente o que de melhor pode ser dado – a Eternidade, relegando à danação todas as coisas materiais, na concepção de que até um diamante está fadado à danação, à ruína, mas com um Ser Humano que ainda não entende que tudo gira em torno do Pensamento, do Metafísico, da dimensão ligeiramente acima da nossa na Terra – é a promessa de um mundo melhor, um mundo muito além das amargas brigas e desentendimentos terrenos. Aqui, esses pilares são fortes, como se sustentassem o firmamento. Na extrema direita do quadro aqui, vemos um totem alado, com três pares de asas, o que representa a Liberdade, o livre arbítrio que tem que permear qualquer atividade artística, como num pássaro com a liberdade de ir e vir, voando majestosamente, demonstrando a genialidade de Tao, com animais majestosos, belos, deslumbrantes. Alguns dos totens aqui têm figuras faciais ao topo, numa observância, numa sentinela, prevendo a aproximação de inimigos em altomar, num trabalho de vigilância de fronteiras, com pessoas flagradas em tentativas de Tráfico Internacional de Drogas, com almas infelizes, seduzidas pelo dinheiro prometido pelos traficantes. Os totens mais à frente no quadro não são completamente retilíneos, mas têm um aspecto de gaita, ou como uma cobra vagando como água num córrego, com marcas de entalhes, como cicatrizes ou rugas, com marcas que mostram uma proveniência, uma estrada, uma história, com homens charmosos, cujas linhas faciais mostram uma certa vivência, fazendo metáfora com a trajetória do espírito, numa alma que já passou por um catatau de encarnações, crescendo e aprendendo, num espírito que percebeu a necessidade de aprimoramento moral, abraçando as vicissitudes inevitáveis de uma vida na Terra, tendo espírito de aventureiro, de desbravador, como num colono chegando à Serra Gaúcha, encarando terras virgens, cheias de índios e animais selvagens. Esses totens são como peças num tabuleiro de Xadrez, numa diversidade de papéis sociais, num jogo em que cada elemento mostra sua particularidade, na diversidade que tem que haver no Mundo, pois Toa jamais faz dois espíritos iguais, jamais se repetindo, havendo em cada filho de Tao um ser único, indivisível e eterno, pois qual seria a razão de tudo sem a Eternidade, sem o poder imenso de algo que jamais cessará? Que poder, hein? O pilar quase ao centro do quadro parece usar uma armadura, como num cavaleiro templário, nas atrocidades que o Ser Humano comete dizendo agir em nome de Tao, fazendo crueldades que Tao jamais faria. Temos aqui a magia dos museus a céu aberto, numa sensação de Liberdade, de Arte sincera, na magia de um anjo voando com suas asas, na sensação deliciosa de Liberdade, como numa Experiência Extracorporal, na piscina quentinha do Útero Divino dos domínios da Eternidade. Aqui, a ereção dos pilares é a força de vontade, numa pessoa que tem muita vontade de viver e de vencer na Vida, pois, sem vontade nem tesão, há solução? É o problema do deprimido, o qual fica chocho e desanimado, prostrado com as durezas da Vida.

Referências bibliográficas:

Francisco Brennand. Disponível em: <www.pt.dreamsite.com>. Acesso em: 4 mar. 2020.
Francisco Brennand. Disponível em: <www.pt.wikipedia.org>. Acesso em: 4 mar. 2020.