Volto a falar sobre o
artista plástico paulista Guilherme Callegari. O seu site, repito, é rico, com
imagens em excelente resolução. Os textos e análises semióticas a seguir são
inteiramente meus. Boa leitura!
Acima, Eye. Temos aqui um clichê, uma repetição, um carimbo, como num
passaporte rodado, cheio de registros de viagens, num espírito que já passou
por várias experiências, várias encarnações, várias etapas e várias
vicissitudes. É como no divertido termo “penteadeira de puta”, com o perdão do
termo, para classificar a Linha do Tempo no Facebook, como num artista, com
décadas de carreira, assumindo vários papéis, vários alteregos, numa estrada,
numa trajetória, como numa mala, com vários carimbos, adesivos, selos, narrando
por onde o viajante já passou, no modo como, ao Desencarne, a pessoa se depara
com um “filme” de sua própria vida, mostrando as partes mais importantes, nas
quais a pessoa mais aprendeu, no modo como um artista tem que ter muita, muita
força para virar as páginas e continuar tocando a Vida, a lida, luta, pois quem
“se atira nas cordas”, desaparece... Aqui, temos uma folha de papel cheia de
quadriculações e linhas de referência, na forma racional do Design, impondo
Ordem e Harmonia a uma obra, manifestando uma prova do intelecto humano,
fazendo do Pensamento o centro de tudo, rechaçando os tolos sinais auspiciosos
do Mundo Material. Em inglês, eye
quer dizer olho, e aqui temos dois olhos, como os olhos do antigo egípcio, na
maquiagem que traçava uma linha explícita ao lado de cada olho, dando ao olho
um aspecto de peixe, na liberdade da expressão artística, num artista que tem
que ser livre imaginar suas coisas, na miséria que é a vida de um artista a
serviço de um estado totalitário e opressor. Aqui, o termo eye tem um aspecto de arroba, no modo como minha geração ainda
testemunhou a transição do Analógico para o Digital, ao contrário da geração de
meu sobrinho, que nasceu em 2003, numa geração totalmente digital, para a qual
nada significa um telefone de gancho, com o disco para discar, no modo como as
tecnologias vêm para libertar e simplificar, fazendo da Preguiça, um pecado
capital, a Mãe de todas as grandes invenções da Humanidade, como o Elevador, na
preguiça de tomar as escadas; como a Roda, na preguiça de carregar algo; como o
Telefone, na preguiça de sair de minha casa para falar com outra pessoa etc.
Aqui, temos uma mão vigorosa, e essas arrobas se destacam, predominando no
quadro, como num filme, com atores protagonistas e atores coadjuvantes, na hierarquia
do Showbusiness, onde há atores estelares e atores sodidos, no modo como corre
solta uma indigesta bajulação em tal meio, pois o Ser Humano, infelizmente,
coloca o Ego no centro de tudo, aceitando bajulações, num Mundo meio nojento, o
qual jamais mudará... Aqui, a raiz de tal contraste cromático nasce do preto
das arrobas com o amarelado no fundo, como em linhas sinalizadoras dentro de
garagens, com a função de alertar e chamar a atenção, fazendo do Carinho, da
Cautela, uma virtude que sempre precisa ser praticada, pois a falta de Amor traz
só degradação e destruição, como num cenário de Guerra, com irmão derramando o
sangue de irmão, na ancestral e imutável crueldade humana, num Mundo com meios
sórdidos para a obtenção de poder, sempre poder, como num poderoso e infeliz
homem, apegado ao mundano ao ponto de querer se suicidar para não ser
destituído de tal poder, numa ilusão, pois, no Umbral, o Vale dos Suicidas
segue cheio de espírito infelizes, arrastando-se por escuras poças de lama, na
metáfora de Matrix: “O que um homem
poderoso quer? Mais poder”. Então, essa sede anestesia a pessoa das coisas que
importam mais, como viver a Vida com simplicidade. Aqui, temos uma sinalização,
um aviso, como num anúncio publicitário bem produzido, bem conduzido, cumprindo
a intenção de interpelar o consumidor, como os nerds de The Big Bang Theory, os quais, apesar de inteligentíssimos, são
vítimas dos marqueteiros de produtos com temáticas de super heróis, como uma
jarra de biscoitos do Batman ou uma espada que imita o sabre de luz de Star Wars.
Acima, Hoosier. Aqui, temos uma predominância do dourado, como num belo
amanhecer, quando parece que o Mundo é feito de ouro, como nos tesouros da
tumba do rei Tut, numa majestosa máscara mortuária de ouro, no modo como as tradições
dão a impressão de que o Tempo não passa, na tentativa humana de apreender e
imitar a imutabilidade da Dimensão Metafísica, o plano onde o Tempo não existe,
como na cerimônia de coroação de Elizabeth II, dando-nos a impressão de que
estamos, de fato, em tal plano atemporal, conquistando a confiança de um povo,
o qual se sente bem sendo governado por tal cetro atemporal, no inevitável modo
como tudo na Terra gira em torno da dimensão acima, numa hierarquia
interdimensional. Aqui, temos uma sobreposição de logomarcas que remetem a
marcas de carro ou a postos de gasolina, algo recorrente na obra de Callegari,
talvez num artista aficionado pelo Mundo Automobilístico, na trágica morte de
Senna, o brasileiro que trazia para o Brasil este gostinho dourado metafísico,
numa vitória fazendo metáfora com a Vitória Metafísica, quando a espírito
desencarnado goza de plena liberdade dourada. Callegari gosta de usar letras e
números, num jogo vibrante e complexo, quase confuso, e rico, com vários
carimbos sobrepostos, como numa harmonia rítmica complexa, africana, aquosa e,
ainda assim, de frieza matemática, revelando a majestade do Pensamento
Racional, na exatidão rítmica, com repetições que se estendem com perfeição.
Aqui, escudos podem ser vistos, e os escudos são a defesa, o impenetrável, num
guerreiro todo blindado no campo de batalha, rechaçando as flechas inimigas,
como numa vacina que dá imunidade, ou como num site seguro, livre de vírus
ardilosos. É a armadura de uma pessoa que sabe da importância de dizer NÃO,
numa pessoa que decidiu assumir as rédeas de sua própria vida, não mais se
sujeitando a andar de “cadeira de rodas”, como num homem que está farto de ser
menino, no modo como os filhos não são criados para os respectivos pais; são
criados para o Mundo. Aqui, vemos a conchinha da logomarca da Shell, fazendo
alusão aos recursos fósseis, como na riqueza do petróleo brasileiro, no modo
como os barões do petróleo estão temerosos com a quarentena do Coronavírus, com
cada vez menos carros transitando pelas ruas, pois “castelos” podem ruir, como
numa poderosa agência publicitária portoalegrense, uma instituição que entrou
em colapso, ou como o ator americano Charlie Sheen, o qual, antes o ator mais
bem pago da TV americana, perdeu tudo, e hoje está no fundo do poço, num
momento em que a pessoa tem que empreender um esforço ENORME para se reerguer.
Aqui, Callegari se diverte com todos esses carimbos, esses clichês, num artista
que encontrou prazer no que faz, trazendo-nos uma produtividade notável, num
site tão vibrante. Esta concha da Shell é a concha da Vênus de Botticelli,
saindo das entranhas misteriosas dos oceanos, trazendo o cheiro de peixe
fresquinho, como num bom restaurante de sushi, ao contrário de certos
estabelecimentos, que me serviram peixe não tão fresquinho, o que me deu
cólica... É como a bela atriz Uma Thurman, interpretando tal Vênus em um filme,
numa deusa séria, triste e maravilhosa, na magia das estrelas matutina e
vespertina, estimulando a imaginação humana, numa Humanidade que, desde cedo, viu-se
obrigada a explicar o Mundo ao seu redor, seja por Mito, seja por Ciência.
Aqui, é como um mural de recados que já foi usado por muita gente, numa
mensagem complexa, talvez numa competitividade, numa pessoa querendo ser mais
marcante do que a outra, na inevitável competitividade, que já começa cedo, na
escola. Aqui, temos um quadro quente, como na etérea luz solar da Argentina, um
país que tem tal charme cromático, seduzindo o Mundo com o charme de Evita, a
pessoa argentina mais famosa da História, superando até o próprio marido, em um
mundo patriarcal, onde elas estão sempre abaixo deles. Aqui, são como anúncios
publicitários concorrendo entre si, como numa Times Square, nos apelos que buscam
distinção e diferenciação, no termo formidável “por um lugar ao Sol”.
Acima, IMG-7492. Temos aqui um pouco de Basquiat, com traços cândidos de
Infância, numa simplicidade, num aconchego rústico, no modo como não devemos
querer obter perfeição – as perfeições são ilusões. Vemos aqui três formas
negras que parecem ser olhos fechados, numa criatura mística, com três olhos,
um acima do outro. É um sono, um repouso, num momento que entorpece, que droga,
talvez numa pessoa anestesiada, que se cerca de puxassacos, pois estes
anestesiam as percepções da pessoa bajulada. Aqui, é como uma zebra mística,
com seu pelo que tem a função de camuflar, preservando-se dos predadores, na
irrefutável teoria da Seleção Natural – os mais espertos e mais discretos
salvam-se; preservam-se. É um grande desafio – ser famoso e, ainda assim,
retirado, como na atitude de vida de uma Meryl Streep, uma pessoa que, apesar
da glória profissional e da fama, leva uma vida simples, pois a Vida só é boa
quando é simples, como um amigo que tenho, que fica alguns dias da semana
retirado em seu sítio, no prazer de estar em casa, num lugar onde as pretensões
do Mundo ficam lá, longe, do lado de fora. Callegari gosta de usar numerais e
letras em seus trabalhos, numa transmissão de informações, como no confuso
mundo do filme Blade Runner, com uma
proposta sobrecarregada de anúncios publicitários, numa concorrência atroz, no
modo como foi feita, há tempos, uma limpeza visual na Avenida Paulista,
proibindo anúncios de qualquer natureza, cortando um pouco aquele tesão das
grandes campanhas, de suntuosos anúncios que desafiam o espectador,
interpelando o consumidor da forma mais grandiosa possível. Hoje, tal avenida é
impessoal, árida, sem aquela grandiosidade que esperamos na maior cidade da
América Latina – como é bom passear por Sampa! Aqui, o fundo é branco, vago,
vazio, no modo como Streep – ó ela de novo! – disse que ser um bom ator é ser
uma página em branco, na qual o personagem deve escrever, na tarefa do ator,
que é desaparecer perante o personagem, fazendo com que esqueçamos que é um
ator que está li na tela ou no palco. Por todo o quadro, vemos vários círculos
negros vazios, como numa massa de pastel arregaçada na mesa, cortada por um
mesmo prato ou copo, fazendo as massas individuais de pastel, na delícia que
são programas televisivos de culinária, num trabalho interessante, podendo ser
desempenhado até por pessoas esnobes como a personagem Dona Florinda, a personagem
mexicana que odeia pobres. Aqui, é como uma tela de TV, e os anúncios vão
passando, concorrendo para permanecer na lembrança do consumidor, no termo recall, ou seja, lembrança, no modo como
as poderosas campanhas publicitárias são raras, campanhas que causam comoções
federais, como na associação de Guaraná Antártica com pipoca salgada, fazendo
com que as mensagens mais simples sejam as mais poderosas, no desafio de se
diferenciar simplicidade de pobreza, numa linha tênue, a qual é frequentemente
perdida, como num jornal, um espaço visualmente saturado – onde não é texto, há
imagens –, pois quanto mais limpo é o anúncio, melhor. E então vem a questão da
limpeza, do banho bem tomado, de dentes bem escovados, de Saúde, no modo como a
Dimensão Metafísica é mais do que limpa – é higiênica. E aí vem a questão de
Tao, o limpo, como numa mulher limpa e perfumada, ou como num homem sem
frescuras, sem afetações, simples. Os círculos são como bolhas de espumante, na
gloriosa sensação cremosa que o espumante causa na boca do consumidor,
preparando o estômago para a refeição. Callegari gosta de carregar com rabiscos,
com ensaios, numa criança na Escola, que está aprendendo as lições básicas de
Vida, na magia do primeiro dia de aula do ano letivo, no reencontro com os
amigos e no desafio de novas lições a ser aprendidas, no modo como a pessoa
encarnada tem que encontrar esse tesão, essa vontade de viver. Aqui é uma
festa, na questão da diversidade, a qual deve ser respeitada, pois Tao nunca
faz dois filhos iguais, dotando-nos de singularidade.
Acima, IMG-7820. Callegari tem uma paixão por logomarcas, e vemos
novamente aqui a Shell e a Volkswagen, no poder e no dinheiro do Oriente Médio,
no teor econômico e petroleiro que foi a Guerra do Golfo, nuns EUA xerifões,
que se sentem responsáveis pela Paz no Mundo, no auge de grandes impérios, como
no Egito, que no passado foi uma potência e hoje é apenas um sítio arqueológico,
pois o Tempo passa, as pessoas morrem e as culturas se perdem. Parece eu temos
aqui uma prancha de desenho, de exercício gráfico, num desenhista fazendo
vários ensaios, tentativas e brincadeiras, almejando a excelência, o
aprimoramento, no sentido de que o Sentido da Vida é o aprimoramento moral,
numa pessoa que reconhece que, em encarnações anteriores, perdeu tempo enganando
e passando os outros para trás, na eterna nova chance, no novo recomeço que é
uma nova reencarnação, na questão do eterno perdão, num Pai absolutamente
paciente, que sabe que novas oportunidades devem ser dadas. Callegari usa letterings simples, sem serifa, ou seja,
usa a fonte Arial, que é simples e elegante, num artista sem afetações
pernósticas, querendo se expressar da forma mais clara e simples possível, pois
Simplicidade quer dizer Limpeza, e não é o Umbral um lugar feio, escuro,
fedorento e imundo? É como uma pessoa jogada numa poça de lama, aguardando que
um anjo venha e a salve, num momento em que o espírito, no Umbral, tem que
reconhecer amplamente que precisa de uma ajuda, pois todos precisamos de ajuda
na Vida, como as pessoas, os queridos amigos de Facebook que permitem que eu
divulgue meu blog em seus murais na rede social – o que seria de mim sem tais
ajudas? É como um colunista jornalístico, que recentemente me ajudou,
divulgando meu trabalho. Aqui, temos bastante movimento, como uma escola de
Samba passando vibrantemente por uma avenida, no modo como o Carnaval
Brasileiro é o maior espetáculo da Terra. Vemos aqui letras maciças e letras
vazadas, no sensual jogo entre vazio e preenchimento, nos movimentos cósmicos
que unem os opostos, como rei e rainha, em torno do mesmo propósito, que é a Vida,
a Evolução, o Aprimoramento, pois qual seria o sentido da Vida se não o
Crescimento? De que serviria uma vida inútil, sem lições? Que professor seria
esse, que não exige dos aluninhos? Em um primeiro plano aqui, vemos letras
grandes em tons de rosa, como na cor do universo perfeito de Barbie, a boneca
mais famosa do Mundo. É um universo perfeito, perfumado, numa trégua, numa Paz,
numa pessoa que pode se deitar e dormir profundamente, no prazer de se despir e
deitar-se em meio a lençóis suavemente perfumados, na sensação de lar, de
segurança, de útero, de invólucro, sentindo-se seguro, como em um condomínio de
alta segurança, muito, muito longe de criminosos ou de pessoas
malintencionadas. Aqui, a concha está de cabeça para baixo, no ato engraçado
que é observar um céu estrelado, só que de cabeça para baixo, na imensidão
cósmica na qual não sabemos o que é acima, o que é abaixo; o que é norte, ou
que é sul; o que é ontem, o que é hoje. É um útero infinito, pois, se é finito,
não é Tao, o nobre presente de aniversário; um presente que dura para sempre,
como o dom da Melodia, por exemplo. De dentro de tal concha, vem a pérola
barroca, imperfeita, rústica, acolhedora, no empenho que um psicopata tem em
ter uma aparência acima de qualquer suspeita; um psicopata que quer que acreditemos
que este é perfeito, numa cilada, tal qual teia de aranha capturando moscas
desavisadas. O fundo dourado, aqui, sofre então várias interferências, mas
segue predominante, num quadro que, apesar de tantos elementos complexos e
confusos, segue firme no sustento de tal obra, como num incansável Atlas, sustentando
o Mundo, ou num pai herói, que sempre proporcionou tudo de bom e de melhor para
os próprios filhos. Aqui, é como um átomo sendo cortado e analisado, numa
explosão de frenesi científico, nas grandes mentes empenhadas em desvendar o Universo.
Aqui, são como várias camadas, como nas páginas plásticas da famosa
Enciclopédia Barsa, com folhas delgadas mostrando cada camada do Corpo Humano.
Acima, IMG-9907. Temos aqui uma camiseta dependurada, como num varal, mas
com manchas, talvez num sabão que frustrou a promessa de remover tais máculas,
no modo como as experiências de Vida vão se acumulando, até chegar a um ponto
em que a pessoa fica mortificada, desprovida de ilusões e idealizações, no
caminho do Pensamento Racional, numa pessoa que tem que parar de “acreditar em Papai Noel”, deixando
de perseguir totalmente sinais auspiciosos, como áreas vips de boates. Esta
camiseta conta uma história, uma proveniência, como num vinho que vem do Vale
dos Vinhedos, por exemplo. Aqui, é como a roupa de um soldado abatido no campo
de batalha, na insanidade bélica de príncipe matar príncipe. Aqui, temos um
campo de batalha, e os escudos automobilísticos se enfileiram como escudos na
batalha, vedando, bloqueando a passagem do time opositor. É como os soldados
bradando, batendo as espadas contra os escudos, numa forma de amedrontar o
campo inimigo, como num certo estádio, cujo vestiário para times visitantes era
pintado de cor de rosa, a cor da Feminilidade, com o intuito que fazer com que
os opositores se sentissem acuados pela virilidade do oponente, mas é uma moeda
de duas faces, pois tudo tem duas leituras, sendo uma a contradição da outra:
na contramão, o tal vestiário pode ser interpretado como a feminilidade do time
anfitrião, ou seja, num tiro que sai pela culatra... Aqui, são como vários
guardachuvas amontoados em uma São Paulo
de garoa, numa certa característica, numa identidade local para o Mundo, como
nos tradicionais anúncios da vodca Absolut, sendo que, em um destes, São Paulo
era mostrada como tal terra de umidade. Por todo o quadro há respingos, como
numa tábua de testes de algum atelier, em experimentações, exercícios, num
artista examinando possibilidades, como na força de vontade do próprio
Callegari, o qual se empenhou em fazer um site exemplar, dando-se ao trabalho
de fotografar inúmeras obras, no termo “batalhar”, numa pessoa que tem que se
dar conta de que não existe autossuficiência, e de que todo mundo precisa de
uma ajudinha, quebrando o mito egoísta do “eu sou o máximo, logo, de ninguém
preciso”. Aqui, são como escamas de peixe, de réptil, numa armadura, numa
blindagem, como no busto blindado de Mulher Maravilha, combinando beleza feminina
com dureza áspera masculina, como na flor metálica em Buenos Aires,
homenageando os mortos no conflito das Malvinas, talvez numa menção à Dama de
Ferro, Thatcher, combinando um visual chique e feminino com um punho de ferro
patriarcal, no modo como cada um de nós tem, dentro de si, um lado masculino e
outro feminino, e cada um tem que partir em busca, dentro de si, de tal
equilíbrio, sem projetar em outrem o seu Yin ou o seu Yang. Esta camiseta
maculada é como um pano usado para secar pincéis no atelier, e aqui temos uma
ironia de metalinguagem – atelier falando de atelier, ou seja, numa metáfora,
como no termo “A Aurora do Homem” em 2001,
num plano fazendo metáfora com a aurora de um dia pré histórico. As obras de
Callegari têm esses rabiscos, essas imperfeições, talvez numa pessoa sábia, que
sabe que, no Plano Físico, as perfeições são impossíveis e inacessíveis, fazendo
do Plano Metafísico o lar imaculado onde a Saúde reina plena, num plano em que
os que amam trabalhar e estudar se sentem num paraíso total e absoluto. Estes
múltiplos escudos não são todos iguais, e cada um tem uma identidade cromática,
como filhos que vieram da mesma barriga e que foram criados debaixo do mesmo
teto, sob os mesmos valores – cada um sai a seu modo em particular. Aqui,
os sisudos escudos bélicos têm uma alegria carnavalesca, num salão colorido,
com finos cristais emanando o seu fascínio multicolorido, como límpidas
estrelas no Céu noturno, no modo humano de construir panteões, fazendo metáfora
com os espíritos evoluídos, que habitam uma esfera superior, para o qual todos
voltamos, cedo ou tarde, ou seja, uma vez cumprida a missão, hora de voltar
para casa.
Acima, Por Junto Aproximar-se. Aqui, temos algo mondriânico, com blocos
assimétricos, desafiando os padrões clássicos de Simetria. Temos uma espécie de
desordem organizada. Os quadros foram aqui reunidos, associados, na básica
tarefa do artista plástico em geral, que é combinar elementos dissociados e,
associando-os, criar coisas novas. Aqui, é algo lúdico, com movimentos,
parecendo que os quadros estão constantemente se reorganizando, como placas
tectônicas, acomodando-se sempre, trazendo todos os transtornos do Plano
Material, num Ser Humano sempre subjugado aos caprichos da Natureza, na
promessa de que, na Dimensão Metafísica, tais vicissitudes se perdem por
completo, num plano em que a Ordem reina absoluta. Aqui, é um jogo irônico, como
numa pessoa que, querendo alcançar a perfeição, está o tempo todo reajustando
tais placas, e sempre há um defeitinho aqui ou ali, como na Vida, quando, ao
finalizarmos uma tarefa organizacional, uma nova desordem se desdobra ante
nossos olhos, no grande piadista que é Tao, como num arquiteto fazendo uma
diagramação de espaço – sempre haverá um defeitinho, como uma manchinha preta
sobre um majestoso Sol, ou seja, quando alguma dor acaba em meu corpo, outra
dor aparece, na constante tarefa de se organizar um lar, pois sempre há algo a
ser feito, como numa pessoa que, diariamente, cuida de alguma coisinha
diariamente, dentro de casa. Aqui, é como se as placas estivessem querendo se
libertar, cada uma migrando para um lado diferente, como numa família, na qual,
depois de tirada a fotinho, cada um vai par ao seu lado, só havendo uma
harmonia de família, de fato, no Metafísico, pois os vínculos de família são
importantes ao ponto de serem mais fortes do que o Desencarne, a inevitável
morte do Corpo Físico. Neste jogo de quadrados e retângulos, temos algumas
linhas diagonais, como ouvi certa vez: a Cultura de Massa vai pela horizontal;
a Erudita vai pela vertical; a Popular vai pela diagonal, como na paixão de
Ariano Suassuna pela Cultura Popular Brasileira, num plano em que tal cultura
vem do Povo e a este pertence, no modo como os caxienses são os verdadeiros
donos da Festa da Uva, nunca sendo esta pertencente a alguma agência
publicitária... Aqui, temos pitadas de verde água, no fascínio que as entranhas
oceânicas exercem, como nos mitos de séculos atrás, quando acreditávamos que a
Terra era plana e que, nas bordas de fim de Mundo, havia monstros que devoravam
embarcações, no modo como a Ciência veio para rechaçar tais mitos, mas numa
Ciência que ainda não conseguiu apreender a Fé em uma dimensão melhor do que a
dimensão da Terra. Vemos aqui uns toques de rosa pink, num perfume de frutas
vermelhas, no fascínio que as fragrâncias exercem sobre as pessoas, como num
colega que tive no colégio, um colega que há anos se suicidou – não sei se ele
ainda está no Umbral, no Vale dos Suicidas, mas ele compartilha comigo o gosto
por perfumes, pois este colega adorava chegar perfumadíssimo nos lugares,
fazendo metáfora com o perfume comportamental dos espíritos moralmente evoluídos,
sendo que os perfumes têm a ver com a essência limpa de Tao, o essencial. Temos
aqui também alguns traços negros, como carvão em churrasqueiras, na magia de
domingos com o meu pai assando churrasco, na memória que tenho de minha mãe
adorar a carne com cebola, assando o vegetal junto com a carne na brasa. O
preto aqui são as sujeirinhas inevitáveis, no prazer de se tomar um banho
depois de um dia de transpiração, nos irresistíveis rituais de purificação e
renovação em torno de água saindo pelos buraquinhos de um chuveiro. Em dos
cantos desta obra de Callegari, vemos bolinhas azuis amontoadas, como bolinhas
de uvas, só que dissociadas do cacho e organizadas, no modo humano de impor
Ordem ao Caos, como numa dona de casa zelosa, deixando a casa na mais completa
ordem, zelando por uma família, no fato de que ser apenas uma dona de casa não
vai te dizer quem tu és... Ou seja, seja mais do que só o cuidador de um lar.
Livre-se as amarras e ouse colocar ao Mundo tua própria inteligência, sempre
sabendo que ninguém faz tudinho sozinho.
Referências bibliográficas:
Guilherme Callegari. Disponível em: <www.guilhermecallegari.com>. Acesso em: 15 abr.
2020.