sexta-feira, 29 de maio de 2020

Um Giro pela Arte



O pintor japonês Jiro Yoshihara (1905 – 1972) foi um vanguardista minimalista, tendo herdado um negócio de família – uma indústria de óleo de cozinha. Suas obras podem custar centenas de milhares de dólares cada. Os textos e análises semióticas a seguir são inteiramente meus. Boa leitura!


Acima, À Memória de Martha. Aqui, é como uma pessoa no fundo de um poço, olhando para cima, vendo que o poço está tapado, só sobrando uma nesga de luz ao redor de tal tampa, no termo “luz no fim do túnel”. Então, a pessoa, em meio a uma crise existencial sem precedentes, tem que empreender um esforço enorme e uma paciência titânica para contornar tal vicissitude, havendo nisto a suma necessidade de trabalho, pois trabalhar é o que coloca no chão os pés de uma pessoa sonhadora – não estou dizendo que não se pode sonhar; estou dizendo que os pés têm que estar ancorados. Aqui, é um grande anel, no famoso anel de Tolkien, fazendo metáfora com as patéticas ambições humanas, na incessante busca por mais e mais poder, como o Merovíngio de Matrix – um homem que tem poder quer ainda mais poder. É um vício, uma obsessão, como num amor apegado e obsessivo, no tal uma pessoa está irremediavelmente fixada em outra pessoa, tendo que haver aí um desapego, num exercício de disciplina, como num escritor, que sabe que tem que sentar e produzir. Aqui é uma mesa redonda, democrática, sem hierarquia, na qual cada um tem peso igual, como uma roda que gira, na roda da Economia, tão debilitada por causa das complicações do infame vírus mundial. Aqui, a intenção de Jiro é estabelecer um contraste, marcante, no termo “preto no branco”, numa pessoa que está buscando esclarecimento, clareza explícita, no sensual jogo de contrastes entre Yin e Yang, fazendo com que as Ciências Exatas e as Ciências Humanas sejam gêmeas na mesma barriga, ou lados da mesma esfera. Aqui, é um grande olho onisciente, num olho que observa o Mundo sem expectativas, sempre sabendo que o Ser Humano foi feito para errar, na metáfora da borracha apagando o lápis, num eterno recomeço, numa pessoa que, ao ver a própria vida devastada, desvirtuada e empobrecida, tem que recomeçar do zero, num trabalho de terapia, pois o primeiro passo para se sair do fundo do poço é abraçar o fato de que se está no fundo deste poço. Aqui, temos o contorno de um objeto oco, num vão, como no vão do MASP, sempre respirando, sempre deixando o ar passar, alimentando os seres vivos ao redor do globo, na grande máquina autônoma que é o planeta Terra, tão rico em Vida, tão contrastante com as inóspitas esferas do nosso pequeno sistema solar, numa singularidade, numa particularidade, com pessoas que creem que estamos cercados, no Cosmos, de muitos alienígenas, os quais nos observam discretamente, numa espécie de zoológico. Aqui, é a sensação de uma pessoa que chegou à conclusão de que está andando em círculos, como nas prisões de um submundo, um mundo que promete libertar, mas que acaba apenas aprisionando, numa ironia que até tem graça. Aqui, são as ondas propagadas por uma explosão, como num megahit musical estourando nas rádios do planeta, no poder que a Arte tem em unir pessoas tão heterogêneas, fazendo com que tal magia faça com que nos esqueçamos de que o Mundo é tão duro, como nos alegres filmes de Carmen Miranda em plena sombra bélica de uma guerra mundial. Aqui, é como um olho mágico, que nos diz quem está batendo na porta, e que proíbe que quem está lá fora veja quem está dentro, num contraste que visa proteger a privacidade, a reserva, numa pessoa discreta, empenhada em trabalhar e em aparecer o mínimo possível, com o discernimento de que tudo o que tem que ficar exposto é meu próprio trabalho, nunca minha própria pessoa, no modo como é complicado o aparecer midiático, num Luis Fernando Veríssimo que mal pode caminhar na rua sem ser abordado por pessoas querendo tirar selfies com ele – deixem o cidadão em Paz! Esta obra é a marca de um copo úmido sobre uma mesa de bar, num momento de descontração, com gravatas afrouxadas.


Acima, Círculo (1). Um prato que traz os vestígios de uma luxuriante refeição italiana, num espaguete feito por quem sabe fazer direitinho, remetendo-me a um maravilhoso restaurante portoalegrense especializado em pastas e antepastos. É como no sensual apetite de uma prostituta no filme Poderosa Afrodite, de Whoody Allen, devorando um prato de massa ao molho vermelho, como dizia Dercy Gonçalves: “Você não vai morrer de fome se você for ator, pois ninguém alguma vez vai negar a você um prato de comida”. Aqui, o molho vermelho são as sanguinolentas vísceras de um herbívoro sendo devorado por um carnívoro, como na terrível Mary Tudor, autorizando a pior forma de execução, que é queimar uma pessoa viva na fogueira, no talento que o Ser Humano tem em ser o mais cruel possível, fazendo inveja ao Diabo. Aqui, temos um Sol dourado e majestoso, na magia de um alvorecer dourado, amarelo, no prazer de se acordar cedo e encarar um novo dia, uma nova lida, pois, sendo doce ou amarga, a atual página será virada, e uma nova página virá, como na canção de Elis: “Nem sempre ganhando, nem sempre perdendo, mas aprendendo a jogar”. Aqui, é o rubro Sol japonês nascente, envolto por alvas brumas, como num gongo mágico, anunciando o passar das horas, trazendo Ordem e Disciplina a um reino, como numa rainha controlando os semáforos e a fluidez no trânsito, numa soberana que está nas notas de dinheiro e nos selos postais, na intenção de trazer unidade e estabilidade a tal domínio, a tal reino. Este trabalho de cerâmica traz uma rotação, um movimento circular, numa roda sempre girando, sempre funcionando, sempre trazendo fluidez às marés, no modo como Tao está sempre respirando, sempre criando, nas expectativas que um fã tem em relação ao novo trabalho de seu ídolo, no frescor de novidade, num artista em processo de crescimento e aprimoramento, fazendo com que o atual trabalho seja melhor do que o anterior, no termo as good as it gets, ou seja, cada vez melhor. Então, o artista vai deixando este rastro, esta carreira, mas nunca se apegando ao passado, pois não é melancólico e desinteressante um artista que simplesmente não soube sobreviver a uma determinada época? Aqui, temos uma cena de crime, de assassinato, com o sangue jorrado na cena, como na impactante sequência inicial de Instinto Selvagem, com a loira fatal assassinando o parceiro sexual com golpes de picador de gelo, no momento do orgasmo, numa viúva negra, no filme que fez de Sharon uma estrela, caindo nas graças de célebres críticos como Rubens Ewald Filho, o crítico que tinha uma bagagem cultural enorme, num verdadeiro cinéfilo. Este prato está dependurado, como elemento decorativo, como minha mãe, que adora usar lindos pratos como elementos decorativos, no modo se ver um uso alternativo ao prato, fazendo com que este não seja apenas um elemento de copa e cozinha, em cima de uma mesa. Aqui, é como o ato de, depois de se comer alguma comida rica em molho, raspar o prato com um pedaço de pão, como num amigo meu de Infância, o qual gostava de, depois de comer um estrogonofe que sua mãe fazia no aniversário dele, raspava o prato com um pedaço de pão, num ato de aproveitar ao máximo o prato, numa ocasião especial. Aqui, é uma máquina de lavar roupas, sempre em ciclo, sempre girando, nessas grandes invenções que fazem com que a vida fique mais simples, como na genial invenção de algo tão simples como a Roda. Aqui, as pinceladas são contornos, como numa mulher maquiando a área ao redor dos olhos, deixando o centro exposto e intocado, no modo como a maquiagem tem a função de realçar a beleza natural da mulher, como numa moldura, a qual tem que fazer jus à obra emoldurada. Aqui, é como uma letra O, deixando um espaço vago no meio, assim como é Tao, sempre discreto, nunca se apoderando por completo, como numa pessoa subestimada, a qual acaba por surpreender a todos, numa pessoa se reinventando, procurando novos modos de se expressar frente ao Mundo, este Mundo que por vezes pode parecer tão duto e insensível – não tenha medo.


Acima, Círculo (2). Uma gota caindo incessantemente, aos poucos, em passinhos de bebê, num processo se desenrolando de forma silenciosa, discreta, ao ponto da pessoa não perceber isso em andamento, só se dando conta no último momento, em que o quadro está irreversível, numa pessoa que precisou cair e reerguer-se. É como a gota na sessão de tortura, caindo incessantemente sempre no mesmo ponto da cabeça do torturado, numa das inúmeras manifestações da crueldade humana, numa pessoa que, definitivamente, não sabe o que é compaixão nem o que é se colocar nos sapatos do outro, do irmão, do igual. Aqui, temos um quadro vibrante, colorido, como na flora e na fauna de um ecossistema tropical, luxuriante, encantando as nações de clima temperado, menos exuberantes, como ouvi falar de uma mulher americana que, ao desembarcar do avião no Brasil, o fez de botas de cano alto, temendo que imensas cobras tropicais estivessem andando tranquilamente pela pista de ouço e decolagem, no modo como Carmen Miranda se tornou essa espécie de embaixadora das terras latinoamericanas. Aqui, temos uma ilha no centro, bem isolada, cercada de água, como uma pessoa que foi se fechando aos poucos, entristecendo-se aos poucos, chegando a um ponto de ter uma vida solitária, digna de um lobo solitário uivando sozinho numa noite enluarada. Aqui, um grande olho contempla o espectador, desafiando este, desnudando este, como no inclemente olho onisciente do Big Brother, invadindo privacidades, como no filme Invasão de Privacidade, com câmeras secretas bisbilhotando a vida íntima de um condomínio inteiro, no redentor final, em que os monitores do voyeur são destruídos, numa libertação, como numa pessoa fofoqueira, que leva uma vida desinteressante ao ponto de nada produzir, só lhe restando cuidar da vida dos outros, enquanto ninguém está cuidando da vida do fofoqueiro... Aqui, o azul traz um Sol majestoso, algo raro como um país brumoso e gélido como a Inglaterra, com a raridade que são lá dias de Sol vibrante, acalentador. Então, a pessoa se refugia nesta ilha, talvez numa rotina disciplinada de produtividade, na “bagunça organizada” que é o atelier de um artista, num microssistema em que só o próprio artista consegue se encontrar e organizar-se, num ambiente orgânico, em que a pessoa tem intimidade de irmão para se encontrar em algo que, aos olhos dos outro, é puro caos. Aqui, é como o planeta Vênus passando pelo Sol causando um insignificante eclipse na Terra, na louca dança de planetas, satélites e planetas anões em tantos e tantos sistemas solares, numa vastidão que dá uma ideia do poder imensurável de Tao, o Pai que nos deu o presente da Vida Eterna, pois, na finitude da Matéria, nada tem sentido. Aqui, é como aqueles castelos medievais, como em desenhos animados de Pica Pau, com ávidos crocodilos nadando ao redor da edificação, tratando de espantar quaisquer bárbaros saqueadores, na avidez humana por riqueza, com túmulos de faraós sendo saqueados aos poucos, anos ou meses depois do enterro no Vale dos Reis, a Disneylândia dos arqueólogos, no modo como me excita visitar o novo Grande Museu Egípcio, no Cairo, nesta terra tão árida, tão dependente das águas do Nilo. Aqui, é como um anel, tentador como o anel de Tolkien, seduzindo o caráter dos homens mais íntegros, seduzindo pelo Poder, esta droga que ceifa tantas almas íntegras, num Getúlio Vargas, poderoso e infeliz ao ponto de ceifar a própria vida, numa Cleópatra suicida, lendária, no exemplo de como o Ser Humano ignora Tao, que é a razão de tudo. Aqui, é o ânus pelo qual sai o que é dispensável, num trabalho diário, numa rotina, no termo “enxugar gelo”, como na repressão da drogadição e do tráfico, no modo como a Cocaína, por exemplo, tem o poder de destruir vidas, como um senhor que conheci, sequelado, condenado a viver o resto de seus dias numa clínica psiquiátrica. Aqui, temos um círculo querendo se impor ao outro, numa competição, nos jogos que tanta audiência televisiva dão, no prazer de se assistir um embate de titãs, nas feias carnificinas que são os concursos de Beleza.


Acima, sem título (1). Algo aqui a ser assinalado, delimitado, como num trecho importante num texto, ressaltando um momento importante, uma parte representativa. É como um monitor de televisão, no modo como é desinteressante ficar zapeando ao léu, buscando pequenas drogas de pura distração, no posicionamento espírita: Televisão é só para que eu assista a algo que eu realmente quero assistir, pois, quando este programa acaba, tenho que desligar o aparelho e ir fazer outras coisas. Aqui, é uma metalinguagem, com retângulo falando de retângulo, ou seja, retângulo acolhendo retângulo, como a mar, digo, a mãe com o bebê, na poderosa imagem do binômio Virgem & Jesus. É como na logomarca da Rede Globo, com um grande globo abrigando um globinho, sendo este emoldurado pelo formato da tela de TV. Aqui, a linha é incerta, humana, talvez infantil, no modo como a personagem Phoebe de Friends, a qual se sentiu acariciada ao ouvir que sua letra se parecia com letra de criança, no encanto da Ciudad de los Niños, na Argentina. Este retângulo vazado pulsa inquieto, nunca perfeito, nunca presunçoso, ciente de que as imperfeições são o canal para que se aprenda, no eterno perdão de Tao, que sabe que seus filhos estão crescendo, num filho que almeja, um dia, tornar-se um espírito perfeito, um arcanjo, para, assim, gozar da suprema felicidade intergalática, no modo como o trabalho, o labor, jamais cessa, pois qual seria o objetivo de uma eterna aposentadoria? Ou seja, você pode se aposentar, mas não pode ficar improdutivo, pois a vida improdutiva é um sofrimento. Aqui é um plano todo negro, denso, sem permitir que o vejamos muito além, como observar o Mundo com um véu na cabeça, impedindo que façamos juízo preciso, no modo como o Desencarne é a remoção deste véu, num espírito que pode, então, ver tudo do modo mais realista e pés no chão possível, e só o trabalho traz tal lucidez, no modo como só o trabalho é o que pode fazer uma pessoa dar a volta por cima, como num ator, que ficou por anos ocioso, tendo que se reencontrar com o velho mercado, voltando a produzir com seriedade e disciplina. Aqui, é como uma letra O, no modo como as letras permitem que haja um vazamento, para que possamos ver através da letra, na sabedoria da letra, que é nunca se opor ao plano de fundo, sempre deixando este respirar, como numa pessoa que sabe que ninguém, absolutamente ninguém pode mudar o Mundo, pois nem Jesus Cristo, nosso Supremo Senhor, soube varrer as guerras da face da Terra. O que pode (e deve) mudar é o modo como me relaciono com tal Mundo. Aqui, é uma espécie de planeta quadrado, com suas quinas esperando para ser aparadas, como nos cantos de mesas de vidro, polidos, para que o usuário não se machuque, numa pessoa que decidiu amar o Mundo, poupando este de se ferir, como jogar cacos de vidro no lixo seco – sempre coloco os cacos numa caixa fechada, com um expresso bilhete na tampa, sinalizando de que se tratam de perigosos cacos cortantes, pois amar é se colocar nos sapatos do outro. Aqui, a dura perfeição matemática é desafiada pela tortuosidade humana, na relação irônica de continuidade entre racional e fluidio, no modo como apolíneo e dionisíaco são extremos da mesma corda, pois o Universo, com todas as suas dimensões, é um só, numa suprema Internet, interligando os confins eternos do ventre de Tao, nossa Mãe Fina, Virtuosa e Eterna. Aqui, é como um fantasminha, como na divertida mansão assombrada no parque de Disney, na Flórida, um lugar sombrio e, ao mesmo tempo, divertido, como na turma de Penadinho, do genial cartunista Mauricio de Souza, no tato de se falar de assombrações sem assustar as crianças, no dom que Walt Disney teve em tocar as mentes e os corações das crianças, um dom divino de amar e compreender as crianças, pois dizia Jesus: “Vinde a mim as criancinhas!”. Aqui, é um rascunho, como num designer, um publicitário rasurando algum anúncio, alguma inteligente manobra de Mercado, empenhado em encantar as crianças, como criar o universo de um super herói, no modo infantil e inocente de se acreditar em magia, longe dos adultos empedernidos.


Acima, sem título (2). É como a visão aérea de uma bomba, nos incríveis genocídios dos quais o Homem é capaz. É a visão aérea de um furacão, na contradição de que, no olho dele, no centro, está tudo calmo e estável, como dizia o slogan de uma fragrância de Jennifer Lopez: “No olho do furacão, estou estável”. É uma roda que nunca para de funcionar, como Tao, sempre funcionando, sempre produtivo, tirando também momentos de lazer, no inferno que é a vida de um desencarnado que não quer trabalhar, como num filme espírita, num espírito indolente que disse: “Já estou há seis longos anos desencarnada”, e um espírito, buscando auxiliar, indagou: “Mas minha filha, não há um trabalho aqui, no Plano Metafísico, que desperte teu interesse?”. É como uma pessoa de minha família, uma pessoa que vivia ao sabor do vento, e que nada construiu em vida, contando ainda com um grande percalço – o Alcoolismo. Tudo que eu quero é que esta pessoa, lá em cima, esteja tendo uma vida produtiva, pois é maravilhosa a sensação de se sentir útil ao Mundo, no modo como, quando vou à casa de alguém para jantar ou almoçar, faço questão de ajudar a lavar os pratos. Aqui, é um biscoito, ou um donut, o lanche preferido do personagem gordinho Homer Simpson. É um disco de long play ou um CD, na revolução que está acometendo a indústria fonográfica mundial, pois se foram os tempos do fetiche, do material, do ir a uma loja e adquirir um produto, chegar e casa e colocar o negócio para tocar – hoje é tudo download, e é uma coisa muito louca, pois uma discoteca inteira cabe num pequeno pendrive. Aqui, é um círculo, uma aldeia indígena, com uma fogueira ao centro, o astro rei, o regente aquecendo e iluminando um sistema inteiro, num pai zeloso, que nunca nada deixou faltar em casa, ou como uma mãe zelosa, que sempre deixou a casa na mais completa ordem, dando conta do serviço de lavar e passar as roupas da família inteira, na loucura do dia a dia de uma casa com vários filhos, como me dizia minha mãe ao me acordar cedo: “Acorde e vá enfrentar a vida!”. Então, entra em cena a Disciplina, e o Id, o princípio do Prazer, tem que ser derrotado por tal fator disciplinador, como numa professora de balé que conheci, uma pessoa de uma disciplina espartana, mas, em compensação, uma pessoa com pouco senso de humor, como diz Caetano: “Cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é”. Aqui, é algo circular que protege o que está no meio, talvez numa mulher grávida, talvez numa embalagem para proteger um frágil instrumento musical, no instinto do bom pai e da boa mãe, que é proteger o filho e, ao mesmo tempo, nunca sufocar o mesmo, pois a pessoa tem que se relacionar com o Mundo lá fora. Aqui, é como o buraco da gola, na pessoa enfiando a cabeça para se vestir. É o princípio do vazio de Tao, pois temos que entender que ser vazio é ser útil ao mundo, pois Tao é um Pai que jamais sufoca ou reprime o filho, sempre deixando respirar, funcionar e viver, pois sabe que Liberdade, Felicidade e Amor andam juntos, ao contrário dos estados totalitários ditatoriais, os quais, simplesmente, proíbem que o cidadão se expressar com Liberdade. Aqui, Jiro quer fazer um contraste entre o vibrante laranja e o denso preto. O preto é a cor da Discrição, entrando em plena moda nos Anos 90, numa pessoa divertida que conheci, a qual, quando via alguém vestido de preto dos pés à cabeça, perguntava: “Onde é o enterro?”. Aqui, este anel é imperfeito, pois as perfeições podem ser maçantes. Como ouvi certa vez um astrônomo brasileiro: “São exatamente as imperfeições o que faz o Universo funcionar”. Aqui, é como um achado arqueológico, numa peça que sofreu erosão com o passar do tempo, como na descoberta da intacta tumba do rei Tut, a tumba que sobreviveu ao apetite impiedoso de saqueadores, como no personagem de cartum Hagar, o bárbaro que saqueava reinos da Europa. Aqui, é uma pérola barroca, imperfeita, interessante em sua despretensão, na ilusão que é buscar a perfeição, numa Vida que não foi feita para ser perfeita.


Acima, sem título (3). É o teste antidrogas feito pela Polícia Federal nos aeroportos do Brasil, num reagente químico rosa que, pingado no pó branco, fica azul e prova que aquilo é cocaína, nas tristes histórias dos “mulas”, as pessoas aliciadas pelo Tráfico para fazer o transporte clandestino internacional. Aqui, é uma flor rubra lutando para sobreviver num mundo frio e inóspito, na luta pela Vida, por um lugar ao Sol, no modo como só o Trabalho é que pode fazer uma pessoa dar a volta por cima, como numa pessoa que conheço, uma pessoa que está deprimida e desnorteada, sem saber um norte para sua vida, como me dizia uma pessoa que me ama: “Tu vais dar um norte para a tua vida”. Aqui, é como uma grande esfera azul, com vastos oceanos, e um tímido e pequenino continente no meio de tudo, como num reino isolado, numa ilha, como o Havaí, produzindo uma cultura popular única no Mundo, no modo humano em imaginar o que vem depois de tudo, como no Homem Europeu de outrora, na crença de que a Terra era plana e de que, num certo ponto, os mares caíam num precipício infinito. Aqui, é como a foto aérea do continente gelado, a Antártida, um lugar que dá uma amostra da inospitabilidade das esferas de nosso sistema solar. Aqui, o vermelho é como uma infecção crescendo e tomando corpo, num processo que vai tomando forma, até condenar por completo tal organismo, numa deficiência imunológica, numa doença perniciosa que ceifa lentamente uma vida. É um embrião se desenvolvendo lentamente, dia após dia, na polêmica do aborto: A partir de qual ponto o embrião é um ser humano? Aqui, é como uma panela sendo mexida com um fundo predominante e uma pitada de algum ingrediente, num processo de incorporação, de mistura, como numa pessoa que vai lentamente se entrosando com colegas do colégio ou faculdade, num processo absorvente. É a mancha de sangue no absorvente da mulher, mostrando à menina que ela não mais é menina, no ato espontâneo que é a criança, ao se desinteressar pelos brinquedos, guardar estes, entrando na pré adolescência e começando a se interessar por Sexo. Aqui, é um pingo de exceção, num pingo minimalista, nunca querendo se apoderar do quadro inteiro, num recato discreto, na forma como, num baile de gala, os vestidos mais simples são os mais belos, pois a simplicidade de Tao é limpa, na gloriosa sensação de se sair de um banho bem tomado, na sensação de renovação, de revigor, como cortar o cabelo, sentindo-se de volta ao status de ser civilizado, na gloriosa sensação de se ir a Porto Alegre e visitar os museus da capital gaúcha. O traço de Jiro é trêmulo e incerto, infantil, como em Basquiat, com traços que trazem essa deliciosa imaturidade, no modo como é importante que todo adulto conserve, dentro de si, uma porção infantil, brincalhona. Aqui, é um bombom com recheio, cortado ao meio, no modo científico de cortar e analisar, como na exposição de cadáveres dissecados, revelando os segredos do complexo Corpo Humano. Aqui, o tímido rosa é como um cachorro recém chegado numa casa nova, com novos donos, e é necessário um período de adaptação, para que o cachorro comece a ter afeto pelo dono, confiando neste. É como no ato de se fazerem novos amigos, como numa criança, no primeiro dia de aula, encarando novos amiguinhos, novas pessoas, até atingir o ponto do entrosamento, com amigos que começam a ser uma parte tão importante da vida da criança. Jiro traz este minimalismo japonês, esta elegância polida nipônica, num povo limpo, polido, recatado. Aqui, é o nenê no colo da Virgem, na nutrição do leite materno, no modo como, já disse neste blog, é gloriosa a sensação de se chupar uma caixinha de leite condensado, na magia dos lanches da tarde, assistindo desenhos animados. É como um bolinho recheado, ou um churro, recheado de doce de leite, no divertido episódio de Chaves, às voltas com churros, no fascínio que os doces exercem sobre o Ser Humano, no modo como, no Plano Metafísico, há confeitarias!

Referências bibliográficas:

Jiro Yoshihara. Disponível em: <www.en.wikipedia.org>. Acesso em: 19 mai. 2020.
Jiro Yoshihara. Disponível em: <www.inavaluable.com>. Acesso em: 19 mai. 2020.
Jiro Yoshihara. Disponível em: <www.phillips.com>. Acesso em: 19 mai. 2020.
Jiro Yoshihara. Disponível em: <www.wikiart.org>. Acesso em: 19 mai. 2020.
Jiro Yoshihara Obras. Disponível em: <www.google.com>. Acesso em: 19 mai. 2020.

quarta-feira, 27 de maio de 2020

Interrupção

Por motivo técnico de força maior, estou temporariamente impedido de postar. Assim que tudo voltar ao normal, aviso vocês. Abraço

quarta-feira, 20 de maio de 2020

O Pulo da Gata (Parte 2)



Volto a falar sobre a artista plástica paulista Yuli Yamagata. Os textos e análises semióticas a seguir são inteiramente meus. Boa leitura!


Acima, A Guy. Temos aqui um rosto triste, com um olho só, numa perplexidade, num abandono, na Vida mostrando toda a sua dureza, no poder que as catarses têm em lavar a alma do artista. A boca aqui parece uma lagarta, planejando dar a volta por cima, transformando-se em uma majestosa e colorida borboleta, numa pessoa que, antes subestimada e considerada um patinho feio, volta e mostra a que veio, na inesquecível frase de uma grande professora: “Não deixe o fracasso lhe subir à cabeça”. A cor rosa aqui é de bebê, e podemos os inevitáveis choros, muitas vezes em plena madrugada, encurtando a noite de sono dos pais que se veem com a enorme responsabilidade de criar uma criança. Podemos sentir aqui o cheirinho de talco, num indivíduo que, desde pequenino, depara-se com os rituais de purificação que são os banhos, como me narrou minha mãe: Quando ela teve minha irmã, o primeiro banho foi tenso, nervoso, inseguro. Depois, quando me teve, o primeiro banho foi mais tranquilo, pois minha mãe já era marinheiro de segunda viagem, pois tudo é oportunidade de se aceitarem desafios, como ingressar num curso universitário e se esforçar para caprichar nos trabalhos exigidos pelos professores, numa oportunidade de crescimento e superação. Uma grande lombriga cruza a obra, discreta, da cor do fundo, como numa esperteza de camaleão, numa malandragem moldada por muitos anos de evolução, de seleção natural – a esperteza instintiva é passada de pai para filho, como numa pessoa que, apesar de não ter tido a oportunidade de estudar, tem um instinto de esperteza muito maior do que muitos garotos ricos que têm acesso a caras instituições de Ensino. O olho aqui está arregalado, sem pálpebra, como no tenso olho de Sauron, o senhor maléfico de Tolkien, o terrível olho onisciente, assustador, malicioso, fascista, esmagador, psicopático. No canto direito superior, vemos um rasgo, um estupro, uma violação, como no ato estuprador de se abrir uma embalagem de produto, no prazer da violação, como entrar na casa de uma pessoa, sentindo ali o hálito do lar, o hálito do anfitrião, no modo como nem todas as pessoas são excelentes anfitriãs, negando um simples cafezinho à visita. O olho aqui é hipnótico, estático, talvez num bebê que está recém abrindo os olhos, conhecendo o Mundo e as pessoas. O rasgo aqui revela um fundo branco, como no acidente de uma sonda em Marte, a qual, por acaso, acabou revelando gelo logo abaixo do solo marciano, numa prova de que os sustos, as falhas e as imprevisibilidades acabam por ajudar, no popular ditado de que Tao escreve certo por linhas tortas, num Pai que, além de amoroso, é muito, muito engraçado, num espírito de palhaço, no modo como é privilegiada a pessoa que aprecia as ironias da Vida em geral. O rosa aqui revela um quarto de menina, pois o indivíduo, mesmo antes de nascer, já é soterrado pelos preconceitos de Mundo, numa imagem de ultrassom da barriga materna, sendo o Mundo um lugar tão duro em relação a tais preconceitos, como num reino inteiro tendo expectativas viris em relação a um príncipe recém nascido, numa pressão esmagadora, num indivíduo que se vê numa cilada terrível, a qual só pode ser vencida com muita força e coragem – nunca deixe o Mundo lhe dizer como você tem que viver, rapaz. A cobra aqui cruza o quadro de ponta a ponta, talvez querendo separar o quadro e organizá-lo, como o que faço aqui, analisando parte por parte para, no final, ter uma visão abrangente, tentando entender o ímpeto do artista por trás da obra. Na porção inferior da obra, vemos um dissidente, um rebelde, uma pessoa querendo avidamente se libertar, como numa pessoa internada psiquiatricamente, contando os minutos para receber alta, como num homem certa vez narrou que, em um sonho, ia entrando num lindo salão, cheio de gente bela, e uma dessas pessoas veio a este homem e disse-lhe que ainda era cedo para o retorno ao Lar, ao apolíneo salão, no modo como temos que cumprir uma certa missão antes de voltar à maravilhosa Dimensão Metafísica, o lugar onde a Vida é mais simples.


Acima, Color Ovo. Um Céu de Brigadeiro desponta majestosamente, como no céu do televisivo infantil Teletubbies, com uma criancinha alegre e sorridente sendo um Sol radiante, no carisma de uma Zila Turra, uma rainha da Festa da Uva caxiense, uma rainha de simpatia arrebatadora. Este quadro tem certas protuberâncias da mesma cor de azul, como no diabólico Alien do Cinema, saindo dolorosamente do estômago da vítima e rasgando a pele da vítima para sair. É um relevo, uma marca geológica, com tantas colinas e montanhas submarinas, escondidas nos segredos profundos do Mar, a Mãe Iemanjá primordial, como na mãe de Dalí, posando nua num divertido Complexo de Édipo. Aqui, temos a candura de desenhos infantis, como nos trabalhinhos feitos na Escola. Na porção superior, vemos um ovo frito, no modo como muitas pessoas gostam de comer um bife com tal ovo. O ovo é a nutrição, a luta diária pelo pão sagrado. O ovo é o mistério da Vida, como cachorrinhos nascendo numa ninhada, no poder que a Mulher tem em trazer Vida ao Mundo, como diz uma canção cantada por Cher: “É um mundo de homens, mas um mundo que nada seria sem uma mulher ou uma garota”. Então, é constituída a Sociedade Patriarcal, numa espécie de “vingança”, no Homem querendo ser tão poderoso quanto a Mulher. O ovo é a revelação, com a casca sendo desbravada e o interior ser revelado, numa dourada manhã de Páscoa, com os milagrosos ovos surgindo como mágica em uma cesta, como na cesta que carregava uma menina muito bonita em primeiro cortejo alegórico da Festa da Uva, uma menina que, apesar de ter a identidade perdida, foi a inspiração comunitária para a eleição de uma rainha, de uma representante, num momento em que o Masculino se curva perante  Feminino, pois cada sexo tem seus encantos. O ovo é o mau gosto de um trote numa brincadeira estúpida, que só agride. Abaixo do ovo, uma faixa verdejante, em vastos campos, cavalgados, no prazer da Vida ao ar livre, num Ser Humano que, infelizmente, só admira os palácios, ignorando as vestes majestosas e maravilhosas dos campos e das florestas, com a rica seiva sempre fluindo, sempre nutrindo, no modo como Tao é a grande teta que nutre todos os planos do Universo, numa mãe capaz de fazer de tudo pelos filhos, como uma cachorrinha que tive, a qual ficou desnutrida por ter tanto amamentado as crias. No centro do quadro, vemos uma espécie de girafa cor de rosa, nos incertos traços do desenho infantil, numa criança se esforçando para expressar o que lhe vêm à mente. O pescoço é forte e enorme, descomunal. O pescoço é o esforço, o empenho, na lida diária para trazer o alimento à mesa. A cabeça é enorme, desproporcional. A cabeça é o que mais interessa, que é a Inteligência e o Amor, no modo como, se uma pessoa é basicamente boa, tudo o que tem a fazer é expressar Inteligência. A cabeça aqui é um grande olho, ou um balão estressado, pronto para entrar em colapso e explodir, como numa panela de pressão, esquecida no fogo, não mais conseguindo suportar tanta pressão, explodindo impiedosamente, como uma pessoa que está farta de sofrer pressões, como numa Whitney Houston, a infeliz cantora que perdeu a voz pelas drogas, numa artista que passou a sofrer enormes pressões após lançar um dos maiores megahits da História – I Will Always Love You. Se obtenho sucesso, serei cobrado a me manter em tal nível doce de reconhecimento. No entanto, os altos e baixos são inevitáveis. Em um dos cantos do quadro aqui, um elemento que parece ser um pé de meia multicolorido, na inevitável bagunça de um quarto de adolescente, ou numa casa com criança pequena, sempre com brinquedos espalhados pelo chão, numa mãe em um constante trabalho de reorganização. Ao redor desta meia, uma meia maior, dourada, numa taça de campeonato, num momento que se assemelha à Glória Metafísica, uma glória inacessível ao Mundo Material. E em outro canto aqui, uma fagulha rubra, numa vontade incessante de trabalhar e brilhar, ardendo no Céu como a Estrela Rubra dos batalhadores.


Acima, Diabo. O Diabo é o mundano, na loucura de uma pessoa que não quer se desapegar de suas cargas materiais, negando-se a deixar para trás, no Desencarne, tudo o que corresponde ao Mundo Físico, num prisioneiro que não que sair da prisão, numa pessoa que não quer a sensação redentora de chegar em casa e retirar de si a máscara higiênica antiviral. O Diabo é um mito, pois não há contraponto de Tao, pois este é absoluto, soberano em quaisquer planos. O Umbral, que os católicos chamam de Inferno, é ausência, é carência de Amor, pois não existe Ódio – somente falta de Amor. O que existe, isto sim, são espíritos que vagam pelo Umbral, maliciosos, sádicos, malévolos, que passaram suas vidas na Terra tentando subjugar seus irmãos de caminhada, num espírito malévolo, que perdeu tempo, muito tempo, numa pessoa que, naquela encarnação, não tinha chance alguma de regeneração, necessitando de muitas encarnações para se purificar e tomar consciência da Virtude e da Irmandade – é uma longa caminhada, num Pai que sempre perdoa, visando o aprimoramento do filho, num Tao que quer ter orgulho de nós. Um dos cornos do diabo extrapola o quadro, numa invasão, numa violação, num estupro, como um rei querendo saquear o reino vizinho, num vizinho que não tem a noção de que qualquer vizinhança boa tem que ter Paz. O diabo aqui tem um rosto todo vermelho, tal qual uma pimenta, numa fascinante comida condimentada, apimentada, numa apimentada Scarlet O’hara, num gênio forte e rebelde, numa personagem que teve que tirar força da fraqueza. É como na sala de estar de uma pessoa que conheci, com uma parede toda pintada em vibrante vermelho, um elemento decorativo que atiçava nos convidados um comportamento apimentado, ousado, às vezes impulsivo, como numa bruja que vi em Porto Alegre, uma vistosa mulher em um vestido vermelho, da cor do sangue, da cor do que nos faz humanos, na beleza eterna da juventude verdejante, abundante, com pulsante seiva rubra, na icônica imagem de uma jovem Marilyn Monroe nua em uma cama com um lençol de seda rosa, ou de algo que o valha, numa artista que tratou de estimular e provocar o espectador, no dever da Arte, que é nunca passar despercebida, sempre atiçando o fogo, sempre trazendo Vida e renovação, sempre com novidades, como numa Paris pulsante, no nervo do Mundo Ocidental, num Louvre inesgotável. Aqui, temos uma máscara, numa fantasia de carnaval veneziano, como na magia de um Halloween, com as pessoas expressando suas fantasias, num ato de diversão, colorido, provocante. O manto deste diabo é de cor vinho, no prazer de, depois de um dia de disciplina e atividade, abrir uma garrafa e apreciar num Sol poente, no dia que morre rubro, tal qual um fatal tango, na cor bordô de um vinho chileno. Este quadro tem uma grande porção negra, da cor do Umbral, sem noção, sem placas, sem referência, num espírito que está deprimido e desnorteado, numa crise que se desdobra em toda a sua seriedade. É um túnel sem luz no final, algo que exige paciência e persistência da pessoa, pois ninguém pode ir de zero a cem em um piscar de olhos, nos longos processos necessários da Vida. Vemos aqui uma porção rosa bebê, numa candura, no cheirinho de talco de bebê, na enorme responsabilidade que é cuidar de um infante, tentando incutir valores morais na mente deste, como meu pai, que sempre dizia: “A melhor hora para parar de fumar é antes de começar a fumar”, por exemplo. Vemos aqui algumas nesgas de verde, num campo de futebol, nas comoções competitivas que levam multidões aos estádios e vendem enormes espaços comerciais pela televisão, na diversão que é a competitividade da Vida em Sociedade, como dois homens num octógono, chegando a sangrar no ringue, tal a dedicação. Vemos uma nesga de Céu de Brigadeiro, na esperança de que, em meio à escuridão umbralina, sempre há um irmão estendendo suas mãos para mim, para que eu saia de tal contexto degradante – os anjos existem, e são nossos irmãos, nossos iguais – só é mendigo quem o quer.


Acima, French Kiss. Yuli adora beijos, e de língua, como na lasciva personagem Perséfone de Matrix, sempre querendo beijar na boca para ter experiências sensoriais. Aqui, vemos um escorpião, perigoso, venenoso, e temos que manter distância desta “ponta de faca”, deixando a faca lá, quietinha no canto dela. É a força da Natureza, servindo de almoço para predadores resistentes a tal tóxico, na grande piada que é a Cadeia Alimentar, num ciclo que se fecha com perfeição, tal qual um intrincado enredo policial. O escorpião é aqui um intruso, como numa grande e peluda aranha que vi, ameaçadora, amedrontadora, perversa, num bichinho que causa tanto medo, como no inocente fantasma Gasparzinho, sempre assustando pessoas das quais queria ser amigo, num personagem triste e melancólico, que fala sobre preconceito e estigma, como no estigma que acompanha os ciganos, por exemplo, no estigma que cobre quem circula por algum submundo, algum gueto. Neste quadro vemos listras aristocráticas, disciplinadas, no modo como Evita, que tanto odiava a Aristocracia Argentina, imitava o estilo das damas ricas daquele país, numa relação de Amor e Ódio, como num certa artista, a qual, inconscientemente, ama e odeia uma certa estrela mais famosa e mais bem sucedida, pois Raiva e Admiração andam juntas. Vemos aqui gotas, como lágrimas, como uma pessoa saindo de um redentor banho depois de um dia de sujeira, bactérias e poeira. É como na imagem do palhaço que, apesar de trazer alegria ao Mundo, chora por dentro, numa carência afetiva, numa melancolia existencial, deparando-se com a inevitável dureza de tal existência. Aqui, a boca negra beija a boca verde, num relacionamento feliz, com o casal tomando café da manhã juntos, com um sentado no colo do outro, trocando beijinhos, pois a riqueza da Vida está em simples aspectos, e não em castelos de ouro maciço – você não precisa ser dono de meio Mundo para ser feliz. O fundo deste quadro tem uma cor incerta, no termo divertido “cor de burro quando foge”. É um rosa bebê acinzentado, numa cor incerta como bege, neutra, nunca revelando completamente o que quer ser, numa pessoa reservada, que nunca entrega o jogo, agindo silenciosamente, cuidadosamente, nos bastidores, num processo longo que se desdobra discretamente, pois como posso surpreender se não sou subestimado? É como Jô Soares, que surpreendeu a todos tornando-se um exímio entrevistador, sacudindo a poeira em sua vida, reinventando-se – Vida é uma hecatombe nuclear da qual precisamos sair vivos. Aqui, há algo mútuo entre estes namorados, pois um se entrega nos braços do outro, como na obra de um certo artista plástico, com duas figuras humanas em gesso, em tamanho natural, com uma se jogando dos braços da outra, numa rendição bela e cálida. Vemos aqui uma gotinha prateada, no termo silver screen para designar o Cinema, no modo como a Arte tem essa capacidade de fazer com que as pessoas sonhem, pois a Vida não é só carpir um lote; é também sonhar em atingir níveis desafiadores, ao contrário de uma pessoa que é somente dona de casa – ninguém precisa ficar o dia inteiro cuidando de uma casa, como numa Grace Kelly, que largou uma carreira brilhante, e largou tudo por um caralho coroado, desculpe o termo chulo. Entre essas bocas desses amantes, uma faixa cor pêssego, perfumada, no modo como os perfumes finos vendidos em lojas fazem metáfora, giram em torno do que importa, que é o perfume existencial da bondade, da virtude, pois de que adianta eu ser um assassino malévolo cheirando a um carésimo perfume Versace? Os dentes de uma boca são azuis, no modo como o Céu Metafísico parece ser mais vibrante do que o Céu Material, quando, na verdade, têm a mesma intensidade – tudo depende de um estado mental. E vemos uma discreta faixinha bordô, numa espécie de Barbie séria, adulta, consciente das carências e das feiuras do Mundo, como numa linda psiquiatra que conheci, um mulherão balzaquiano.


Acima, Língua Dobrada. Parece um intestino, processando a comida, nos processos da Vida, os quais levam seu tempo para um desdobramento. É como na impactante cena de guerra de um filme de Spielberg, com soldados feridos, com suas tripas para fora, desesperados, recolhendo suas tripas e buscando recolocá-las na barriga. Aqui, é como uma grande linguiça, no divertido termo “encher linguiça”, que é quando alguém faz algo para ludibriar o espectador, no termo “embromar” ou “enrolar”. É como uma grande serpente, quando vi certa vez, no asfalto de uma estrada, uma agonizante cobra atropelada, quase partida em duas. É a magia das serpentes, movimentando-se como água escorrendo, no modo como em certas culturas as serpentes são seres de fertilidade e fluidez, quando que, em outras culturas, as serpentes são linkadas ao Mal, como na maliciosa serpente do Éden, seduzindo o Ser Humano e conduzindo este para o descaminho, na misoginia que coloca uma mulher como a causadora de todas as desgraças da Humanidade, tendo o Homem como o sexo perfeito, o sexo primordial, no infeliz modo como as próprias mulheres são machistas... Yuli adora bocas, e aqui temos uma bocona aberta, como num consultório de dentista. O fundo da boca é negro e misterioso, sem revelar o que há por trás, nos mistérios da Fé, exigindo que acreditemos na Vida pós Morte mesmo não tendo provas científicas de que a Vida na Terra é sucedida por uma Vida desprendida e gloriosa, no grande plano divino para conosco, num Pai que quer o melhor para seus filhos, seus adorados príncipes – somos todos especiais, todos fruto de uma divina concepção, mas o problema é que, na Terra, há uma dúvida cinzenta, entre Céu e Inferno, num fechado e misterioso dia nublado, encoberto, cinzento, numa fria tarde de Inverno, na qual tudo o que queremos é entrar debaixo de uma coberta e comer um pinhão quentinho, nos prazeres simples do aconchego, da despretensão, no prazer de se deparar com uma lareira em uma fria e úmida tarde de sábado invernal – a maravilha da Vida está na Simplicidade. Aqui, temos uma descomunal língua, numa língua de serpente, farejando presas, ratos desavisados, no modo como a pessoa tem que tomar cuidado para não se tornar uma presa de psicopatas ardilosos e manipuladores, pois os “vampiros” estão entre nós... Aqui, os dentes são amarelados, dourados, talvez num implante de dente de ouro, nos tesouros de um túmulo faraônico, nas tentativas humanas em compreender o Desencarne, pois, na Vida, nada mais natural e inevitável do que a Morte, na dificuldade que um psiquiatra – com todo o respeito que tenho pela Psiquiatria – tem em ter Fé para esperar uma vida leve, produtiva e maravilhosa, reencontrando-se com entes queridos, no fato de que os vínculos de família não se desfazem com o Desencarne, fazendo com que sejamos eternamente gratos a nossas próprias mães, essas pessoas sem as quais nossa encarnação não teria sido possível, numa espécie de ponte, que nos transporta entre uma fase anterior e uma fase posterior. Aqui, é como uma criança sapeca mostrando a língua, na simplicidade da cabeça da criança, na responsabilidade que é incutir na cabeça infantil os princípios de virtude, causando discernimento entre Bem e Mal; entre o que vale a pena e o que não vale, numa criança que, desde cedo, nota a necessidade do aprimoramento moral, sendo instruída a mentir o mínimo possível. Aqui, a boca está aberta e receptiva, como num generoso anfitrião, fornecendo música e bebida aos convidados, no prazer de se fazer uma bela festa de aniversário, nas festas metafísicas de retorno, quando, depois do Desencarne, deparamo-nos com os entes queridos que deixaram a Terra antes de nós, pois nada teria sentido sem a Eternidade – é uma questão de pura lógica matemática, como num quebracabeça sendo pacientemente montado. Delgados fios sustentam esta obra, no sentido de que a grosseria é fraca e a fineza é fortíssima.


Acima, Pizza. A comida que veio da Itália para o Mundo, na universalidade da Gastronomia, na sensação agradável de se receber uma pizza quentinha por telentrega, podendo sentir, antes de abrir a caixa larga, o aroma dos condimento, do queijo e do pepperoni – cozinhar nos faz humanos, no modo como as especiarias orientais ganharam a Europa das Navegações. Aqui, não temos uma pizza de perfeição geométrica, mas uma pizza deliberadamente imperfeita, no modo como a Vida é naturalmente imperfeita, fazendo das irônicas imperfeições o senso de humor divino, na virtude de uma pessoa que, mesmo envelhecendo, permanece brincalhona e jovial, como na divertidíssima entrevistadora americana Ellen, cujo passatempo preferido é pregar peças e assustar equipe, plateia e convidados, na divertida reação da pessoa que é vítima do susto. Aqui, temos uma pizza estranha, com cores que normalmente não vemos em pizzas. A borda é marrom, talvez de chocolate, talvez dourada no calor do forno, num delicioso queijo gratinado, no engraçado episódio de uma prima minha que, ao pedir uma pizza por telefone, solicitou a pizza sem recheio na borda, mas o atendente entendeu que ela queria a pizza sem qualquer borda, apenas com a parte interior da pizza, entregando uma pizza debilitada! Esta pizza gira como uma roda, uma mandala, como água abaixo pelo ralo, ou como uma galáxia girando, nos mistérios da Cosmos – O que diabos há no centro de uma galáxia? O que faz tudo isso funcionar? Aqui, a pizza é fatiada irregularmente, de forma extremamente assimétrica, talvez numa partilha de herança, num irmão querendo passar o outro para trás, nas patéticas guerras humanas em torno de poder e dinheiro, num Ser Humano que, normalmente, e infelizmente, identifica-se sempre com a Matéria, e nunca com o Espírito, no indagamento taoista – O que vale mais para você: ser feliz ou só parecer ser feliz? Então, um infeliz mundinho de aparências fúteis se constitui, e a pessoa se vê refém das expectativas do Mundo – ninguém diz a você como viver, mas, mesmo assim, á uma armadilha. Portanto, mostre o dedo do meio para o Mundo, pois que vida é esta, na qual sou um prisioneiro? Esta pizza roda como uma roda, na vogue dos rodízios de pizza, na fartura interminável. Vemos aqui gotas brancas, talvez de marshmallow. São gotas puras, de Paz, ilhas de bem estar em meio a um Mundo tão instável e aguerrido, tão raivoso, tão desprezando o cocidadão. São como manchas de Vitiligo, num espírito que, na marra, tem que aprender a se desprender das vaidades mundanas, como se soubesse que, no Mundo Real, ou seja, a nível metafísico, a Beleza é eterna e inabalável, fazendo da Terra tal lar provisório, no qual Beleza não põe à mesa – é um terreno de guerra, onde temos que ter espírito de coragem. Estas manchas brancas são como roupas carcomidas por traças, nas imperfeições da Natureza, num Mundo em que as imperfeitas traças são inevitáveis, como gramíneas espontaneamente brotando das rachaduras em calçadas, no contraste entre canteiros bem cuidados e canteiros mal cuidados; no contraste entre Amor e a ausência deste. Esta pizza tem uma predominância rosa, feminina, no sabor tuttifrutti  de chicletes na Infância, a época simples em que só temos que estudar e brincar. Esta pizza é divertida, dinâmica, e parece ter vida própria. É como numa piscina, na qual o movimento da água distorce as linhas retas dos azulejos, na liquidiscente sensação gloriosa de prazer e libertação que é a Experiência Extracorporal, quando o espírito se desprende provisoriamente do corpo carnal, numa sensação de Paz, na qual percebemos a necessidade de aprimoramento técnico do espírito, num Pai que não quer que entremos em estagnação. Aqui, é como um clã de leões partilhando uma gazela que foi capturada, no processo de crescimento de um filhote que começa a se desinteressar pelas mamas da mãe e passa a achar interessante a carne banhada de sangue, num processo de crescimento, numa criança que se desinteressa naturalmente pelos brinquedos.

Referências bibliográficas:

Works. Disponível em: <www.yuliyamagata.com>. Acesso em: 9 mai. 2020.