quarta-feira, 27 de novembro de 2019

Respirando o Ar da Arte



O francoamericano Arman (1928 – 2005) nasceu Arman Pierre Fernandez, desde cedo adquirindo intimidade com os objetos da loja de antiguidades do pai. Aos dez anos de idade já começa a pintar, e, em 1961, depois de expor na Europa, faz sua primeira mostra em solo novaiorquino. O site de Arman preserva tal legado. Os textos e análises semióticas a seguir são inteiramente meus. Boa leitura!


Acima, Brush Stokes. 1992. É como se os pincéis estivessem competindo entre si, para ver quem deixa a marca mais indelével, no modo como a mediocridade pode ser competitiva, pois, se sou único e original, ninguém pode competir comigo. As pinceladas vermelhas são como sangue, como numa pessoa altruísta doando sangue, num verdadeiro gesto de fraternidade, numa pessoa que observa que há pessoas precisando de tal doação, numa pessoa que realmente precisa de um ato de caridade, numa dúvida – devo dar esmola? Essas pinceladas rubras são como vinho tinto, no fascínio que o álcool exerce sobre tantas culturas diferentes, na universalidade do Ser Humano – vamos tomar um trago? A tinta aqui, apesar do quadro estar sequinho, parece estar bem fresca, bem nova, bem prematura, quase escorrendo pela tela, ameaçando nos melecar se tocarmos a obra com os dedos. É a liquidiscência de Tao, aquele que sempre flui, sempre ruma, em um infindável processo de depuração, pois pobre daquele que acha que já aprendeu tudo, ou seja, é necessário desenvolver humildade, pois não é insuportável uma pessoa arrogante e presunçosa? As pinceladas douradas parecem enriquecer o quadro, na universalidade do Ouro, este metal tão cultuado em tantas civilizações diferentes, como no Egito Antigo e na América Pré Colombiana. Os pincéis parecem dançar juntos, numa certa concórdia, como numa valsa fluindo majestosamente em um garboso salão de festas. As pinceladas parecem querer concórdia, numa vizinhança pacífica, ou num reino bem governado, atendido por um líder que sabe que a Paz é o que há de melhor para qualquer reino. As hastes dos pincéis são furadinhas, como numa orelha com um brinco – este vazio é Tao, o reservado, o subestimado, pois tal furinho é uma utilidade, uma conveniência, possibilitando que o instrumento seja dependurado num prego na parede. É o enigmático Vazio, sempre respirando, sempre fluindo, na dica de decoração – a sensualidade reside, precisamente, nos vazios, pois estes atendem às demandas do dia a dia, visto que aquilo que não tem utilidade é deletado da mente das pessoas, no desafio que é um artista se mostrar útil a um Mundo tão insensível, duro e cruel, na tentativa do artista em provocar e sensibilizar. Podemos ouvir aqui uma valsa de concórdia, e os pincéis dançam juntos como irmãos numa barriga, com no recente caso caxiense de um nascimento de quadrigêmeos. É a lição de que somos irmãos, logo, não devemos brigar, na incansável intenção de Tao em estabelecer a Paz em um reino tão aguerrido, nas nobres intenções diplomáticas. Este quadro é um espaço vazio que quer ser pintado, preenchido, numa força gravitacional. Estes pincéis dançam conforme a imaginação permite, e é como um grupo de amigos, curtindo, dentro do carro, a mesma música, numa das maiores riquezas que podemos ter – amigos. A junção deste dourado com este vermelho resulta em laranja, uma cor quente, numa fruta cítrica, com aquele pequeno toque de acidez necessário, num toque abrasivo, agressivo, na sensação de se tomar, pela primeira vez na Vida, um espumante brut. Estas ferramentas estão em plena atividade, ocupadas, fazendo obras, como numa esteira industrial, sempre suprindo o Mundo, num capim que cresce incessantemente. Aqui, são como prédios curvilíneos, desafiando a Lei da Gravidade, em sonhos de arquiteto, colocando o melhor de si em folhas de papel, ou num computador. São como cachecóis envolvidos, tremulando como bandeiras. São fitas de um presente de Natal, fazendo metáfora com as fitas que mantêm uma família unida, mesmo com distâncias geográficas – os vínculos de família não se dissolvem com o Desencarne.


Acima, Les Chaussures. 1964. O fascínio da Feminilidade, numa mulher que vê graça e diversão em usar salto alto, algo diferente para mulheres mais masculinas, que veem salto alto como imposição social. Aqui, são sapatos de diferentes cores, numa variedade, num convívio entre diferentes. É um cardume multicolorido, como salmões batalhando para subir rio acima e, ao chegar ao destino, morrem no orgasmo. O sapato preto é a cor do luto, no modo como nos anos 90 o preto entrou na moda para nunca mais sair, deixando de ser exclusivamente a cor do luto. É a cor da dúvida, nos negros confins do Universo, na incapacidade humana em apreender o Infinito – somos pequenos demais. Já, o rosa é a cor da Barbie, do doce perfume feminino, na letra de uma canção em inglês: “Lábios como açúcar. Beijos de açúcar”. O rosa é a cor da pele virgem, da candura. Neste quadro, podemos ouvir o toctoc dos sapatos, no prazer que a mulher tem em sentir tal barulho, na imposição daquilo que é considerado feminino e agradável, como no fascínio exercido pela marca Victoria’s Secret, como diz o personagem heterossexual de Woody Allen ao filho: “As mulheres são a melhor coisa que você vai ter na Vida”. Como no filme Perfume de Mulher, na icônica cena do tango dançada por um personagem cego. O amarelo é a cor da recompensa, do prêmio, como numa taça dourada, na conquista que vem após um longo período de esforço e dedicação. É a cor do Sol que nos banha, no modo como a Vida seria impossível sem o astro no meio de um sistema. É como o artista busca ser, um astro rei que aglutina para si mesmo um grande poder, uma grande influência gravitacional, nas ancestrais tentativas humanas de um artista querer ser tal força, pois é insuportável a um artista ser ignorado ou esquecido. O fundo cinzento tem um aspecto aveludado, e é a cor de um dia encoberto, invernal, cobrindo o esplendor solar, jogando dúvidas existenciais, no modo de uma pessoa querer descobrir o propósito da Vida, da existência, da encarnação, e o propósito é crescimento, numa pessoa que morre estando melhor do que como era ao nascer. Estes sapatos de Arman parecem estar num redemoinho, num quadro com um certo movimento, girando, como num centro galáctico, exercendo muito poder, poder o suficiente para comover uma infinidade de estrelas e sistemas solares. É o poder de um furacão, na contradição do olho de tal furacão, num olho que, apesar de estar no centro de tal distúrbio, está plácido, na capacidade de uma pessoa em se manter realista, humilde, com os pés no chão, pois o Poder e o Sucesso podem facilmente subir à cabeça de uma pessoa – se queres conhecer alguém, dê poder a este alguém. Aqui, são como roupas em uma máquina de lavar, num carnaval, numa mistura, como numa paella, ou numa salada de frutas, numa sociedade justa, na qual cada cidadão se sente respeitado, pois não é insano um governante que quer que todos sejamos indistintos tijolos numa parede, em um sistema que suga a vida do cidadão? Aqui, cada cor de sapato compõe uma camada, como nas várias camadas de segurança que povoam o momento de eleições no Brasil, com urnas eletrônicas à prova de fraude. São como várias peças de roupa sobrepostas, numa composição que, apesar de carregada, tem um aspecto leve, como um nariz respirando normalmente, e não é Tao tal arejamento? É a Vida, que deve sempre fluir, nunca num ponto final cadavérico. Aqui, é como uma sopa de letrinhas, fascinando as crianças. São como várias setas confusas, apontando para todos os lados, proporcionando uma escolha, uma opção, um caminho alternativo. É como um labirinto sendo solucionado, como num dia que vai amanhecendo, humilhando e neutralizando as incertezas negras do Submundo, o qual tem prazo de validade, sempre. São como grandes grupos de aves voando, migrando, na minha lembrança de ver aves migratórias em um parque da Disney, em Orlando. São as demandas de várias estações, como num pássaro que só pode ser ouvido em determinada época do ano.


Acima, L'Heure de Tous. 1985. Os relógios olham para todos os lados, talvez querendo marcar a hora de todos os cantos do Universo. São como ovas de caviar, ou numa Nossa Senhora cercada de anjinhos aos seus pés, numa deusa de fertilidade, abençoando os campos de plantio e trazendo bebês às famílias. Esses relógios estão em discordância, pois cada um marca uma hora diferente. É como numa grande e caótica discussão, e cada um quer impor sua respectiva ordem. São os relógios derretidos de Dalí, fracassando na missão apolínea de marcar o Tempo; na missão de trazer ordem ao caos. É como numa briga de família, onde cada um fala o que quer, nas catarses das discussões de família, discussões nas quais tudo acaba em harmonia, concordância e reconciliação. Aqui, é uma demanda crescente, como numa Inglaterra tendo um boom de crescimento na Revolução Industrial. É uma esteira de indústria fabricando mais e mais bens, na explosão capitalista, numa sociedade de consumo que nos dita o que devemos cobiçar, como último e mais avançado aparelho de telefonia móvel, numa sociedade que nos diz que seremos infelizes se não consumirmos... Aqui, são como os diferentes compromissos de várias pessoas, cada um com sua ordem do dia, com seus afazeres, no modo como a Dimensão Metafísica é cheia de afazeres, mas afazeres que são feitos com prazeres, nunca tendo o labor como uma fonte de estresse ou sofrimento. Aqui, é uma rosa dos ventos apontando para todas as direções, como numa estrada com placas confusas, apontando para muitas direções, trazendo dúvida existencial: Qual é meu lugar no Mundo? Quem sou eu e para onde vou? Qual é o sentido da Vida? Aqui, temos uma perda de noção de Tempo e Espaço, como numa pessoa que se perdeu na Vida, tendo que empreender um esforço titânico para se reerguer e reencontrar-se, como numa pessoa que passou por um gradual processo de empobrecimento existencial, talvez perdida em um ambiente de subconceitos os quais nada têm a ver com a realidade, com o Senso Comum. Aqui, é uma casa maluca, sempre pregando peças, numa pessoa que quer me iludir e me desnortear, num amigo falso, que definitivamente não quer me ajudar a me reerguer – os sociopatas estão entre nós. Estes relógios nos mostram que o Sol nunca se põe nas terras de Sua Real Majestade, e o Mundo nunca está completamente adormecido, na ironia do fuso horário, pois enquanto alguém dorme, outro alguém está atuante e desperto, como na ironia das estações climáticas – enquanto aqui há calor, lá há frio. Como na mente genial que inventou os plátanos, aquecendo no Inverno e refrescando no Verão. Este conjunto caótico e vibrante de relógios discordantes faz um profundo contraste com o relógio atrás na cena, o qual está, de fato, marcando a hora certa, num paralelo entre Razão e Loucura, no fato de que tudo tem duas leituras, sendo uma a contradição da outra, ou seja, se digo que algo é belo, é porque conheço o oposto, que é feio, no modo como o Mal existe exatamente para sabermos identificar e reconhecer o Bem, no discernimento taoista. Estes relógios parecem querer concorrer entre si, para ver quem tem a razão; quem está marcando a hora certa. É como a correria de espermatozoides em busca do óvulo, nas inevitáveis rivalidades orgânicas, como plantas lutando por um espaço ao Sol, no termo “luta” empreendido por uma professora minha, uma antropóloga, ou seja, de fato, a Vida é sonhar e lutar por tais sonhos. Estes relógios olham para todos os lados, numa pluralidade, numa diversidade, com vários pontos de vista sobre um determinado assunto, como nas várias religiões sobre a Terra, religiões que carregam o fato da universalidade do pensamento humano, trazendo o fato de que, no fundo, somos todos iguais, irmãos, espírito encarnados em um Mundo tão duro e fascinante. Estes relógios parecem estar em pleno processo de ordenamento, parecendo querer se organizar, talvez numa torre hierárquica, na imposição de sentido a algo aparentemente sem sentido.


Acima, The Secretary is Fired. 1963. O título significa “A Secretária está demitida”. Parece que uma bomba estourou dentro do escritório, e que pouco restou da máquina de datilografar. É como nos lamentáveis destroços da Guerra, com lindos palácios sendo destruídos, tudo em nome da cobiça humana, da insaciável sede de poder. Não há beleza na Guerra, e todos ficam desolados e esfomeados. Esta obra é como no termo “estouro” aplicado a algum artista que, de alguma forma, conquistou reconhecimento e valorização, como num Andy Warhol, artista reconhecido ainda em vida, recebendo muitas e muitas encomendas, como num Leonardo brilhando na Renascença. Aqui, não sobrou pedra sobre pedra, talvez num movimento de Vanguarda, detonando com velhos padrões, assinalando a vinda de um novo tempo, uma nova época, nas inovações de movimentos que abalam estruturas e trazem novos parâmetros de Arte e beleza, como na transgressão impressionista ou modernista, em sopros de renovação, na tarefa da Arte em assinalar tais refôlegos, tais reinvenções, como num artista “camaleão”, adquirindo, durante a carreira, muitas formas e estilos, nunca sendo repetitivo, sabendo que, se repetitivo, entediaria o público. Aqui, o fundo rubro é o sangue derramado nesta explosão, talvez nos destroços que restaram do Onze de Setembro, num escritório que, antes ordenado e organizado, virou puro caos de destruição, com tantas vidas inocentes ceifadas em um episódio tão macabro, na prova de que a mente humana pode alcançar níveis altos de maldade e ambição, nas palavras de Obama: “Você será lembrado pelo que você construiu; não pelo que você destruiu”. Aqui, temos um sonho confuso e desordenado, talvez esperando para ser entendido e solucionado sob a supervisão de um bom psicólogo. Aqui, é como um trabalho de análise e desconstrução, como num objeto de estudo científico, sendo desmantelado para ser compreendido, estudado. É como na função científica da Medicina, dividindo o Ser Humano em partes, em aparelhos, em sistemas, buscando entender a criação de Tao e trazer tratamento e cura para terríveis doenças, como AIDS e Câncer. É como na construção de um carro, num processo industrial longo, com cada peça sendo pacientemente anexada, num trabalho de paciência e persistência. É como no conserto de um relógio – é necessário desmontar tudo e remontar tudo. Aqui, é como uma terra devoluta, pronta para ser colonizada e ser repleta de graças, de nomes, estes talvez em honra de grandes homens. Este quadro traz a decadência da Era Analógica, em nome da forte ascensão da Era Digital, numa suplantação de tecnologias, como na trilogia Matrix, na transição entre analógico e digital. É como nos carros atuais, cujo sistema de som simplesmente não mais suporta tocar CD... É um galgar tecnológico muito rápido e avassalador, talvez na percepção de um artista em compreender tal cavalgar frenético. Aqui, é como se tal instrumento tivesse sido jogado de uma janela, espatifando-se em mil pedaços, num grande desafio de conserto – será que tem conserto ou é perda total? Algumas teclas da máquina ainda persistem bravamente, como num gesto de resistência, no modo como as coisas na Era Analógica parecem ter sido tão mais simples – como é simples a Infância! Aqui, temos um intrincado trabalho de montagem e desmontagem, com peças nos desafiando para que saibamos qual é a função de cada uma, buscando encontrar lógica no funcionamento do Corpo Humano, como num Leonardo, dissecando cadáveres, tudo em nome do Conhecimento. Aqui, é como se tivessem sido dissociadas as partes do Aparelho Digestivo, na intenção humana em encontrar sentido em enigmas, delegando uma importante função a cada órgão, com tudo chegando a um ponto em que temos que admitir a existência da Inteligência Suprema, no difícil caminho da Fé. Podemos ouvir o barulho do objeto caindo e se espatifando, como num barulho de trovão, ou de uma bomba. É um artista querendo chamar a atenção do Mundo, renovando percepções e trazendo o Novo, sempre.


Acima, sem título. 1958. Um cacho de uvas, numa explosão de Vida durante a Vindima, na celebração da fartura e da felicidade, num momento de reunião comunitária em torno da Vida. Este cacho aqui não uniformiza os bagos, bem pelo contrário – diversifica. Vemos lâmpadas opacas, claras e azuis. A lâmpada azul é como um oceano, seduzindo os descobridores por terras longínquas, no fetiche de desbravar terras virgens, intocadas, nas aventuras que foram a Navegações. É o globo terrestre, numa esfera que se autossustenta, com seus sistemas biológicos, no ar, terra e água, numa riqueza a qual, aparentemente, inexiste em qualquer outro lugar do nosso sistema solar. Podemos ouvir aqui o tilintar das lâmpadas se tocando, num quadro de encontro e atrito, de reunião, talvez numa tensa reunião de condomínio, com moradores frequentemente discutindo sobre problemas no prédio, numa certa tensão, como nesses dias, em que reclamei a um gerente bancário sobre o barulho do alarme intermitente do banco, numa agência ao lado de onde moro. É a certa tensão numa partida de Futebol, com discussões que podem resultar em baixaria, como ofensas e socos. Aqui, temos uma reunião, um engajamento comunitário, como numa Festa da Uva caxiense, num momento em que a comunidade esquece de suas diferenças e une-se em torno da celebração, no forte papel representativo da Rainha, num arquétipo de feminilidade, doçura e beleza, valores que norteiam a sagrada Dimensão Metafísica. No topo desta obra de Arman, um forte cabo mantém o grupo coeso, unido, como no talento de uma matriarca ou de um patriarca, reunindo a família numa noite de Natal, com crianças abrindo avidamente seus presentes, pois o Natal não é das crianças? Nesta reunião de diferentes esferas, há uma simplificação, uma limpeza, pois todos estão no mesmo “saco”, numa hora de comunhão, como numa missa, no momento em que absolutamente todos – homens e mulheres, ricos e pobres, negros e brancos – estão no momento da transubstanciação. A reunião é esta simplificação, pois são todos bebês do mesmo útero, na simples e limpa questão de Irmandade – somos todos filhos de Tao, o grande patriarca. Então, cada uma dessas lâmpadas tem algo em comum com as demais, num cenário de Liberdade, pois, apesar de sermos todos irmãos, cada um tem suas características, as quais devem sempre ser respeitadas, pois quando não há Respeito, há Guerra... Então, irmão derrama sangue de irmão, em algo sem sentido, sem propósito, sem beleza, sem validade, pois o Ódio não é uma invenção de Tao; o Ódio é um capricho humano. Aqui, são como ovas de caviar, numa grande ninhada, como ovos comprados no supermercado, na eclosão do ovo de chocolate, como na eclosão da sepultura de Jesus, o qual passou para um mundo melhor, pois ninguém é capaz de resolver os problemas do Mundo. Mas o sábio, o homem de Tao, pode ser a promessa de um amanhã melhor. É como um farto ninho de tartaruga, depositando seus ovos na areia, no fato de que, conforme a seleção natural, apenas poucos filhotes atingem a idade adulta, como na baixa expectativa de vida no Egito Antigo. Aqui, são como bolhas num sedutor espumante geladinho, encantando os enófilos, num momento de verão, de virada de ano, na deliciosa sensação cremosa que o espumante deixa na boca, num momento de prazer, de curtir a Vida. Aqui, é como um professor adquirindo a atenção e o controle sobre os alunos, num trabalho árduo, sempre querendo mostrar às crianças a importância da Disciplina, pois quem vive “ao sabor do vento” não tem Disciplina, não conseguindo, assim, fazer algo produtivo. Aqui, são vários feudos formando uma só Europa, no árduo trabalho de unificar a Itália, com regiões tão distintas, como no Brasil, no qual a Bahia é um país a parte. É como na mesma Língua Espanhola, falada em diversos países, só que cada região tem seus próprios sotaques e gírias, no indecifrável modo como os sotaques de constituem. Aqui, temos um majestoso lustre, numa abundância, como em países ricos, proporcionando qualidade de Vida ao cidadão.


Acima, sem título. 1994. Uma competitividade, na qual cada pincel quer deixar sua marca. Um aspecto de tinta fresca, e temos a impressão de que nos sujaremos se tocarmos nesta obra. Aqui há um entroncamento, pois pinceis passam uns pelos outros, como em pistas de estrada, com veículos indo e vindo. Aqui, são como carros numa corrida, numa competição, na inevitável competitividade mundana. É como num estojo de maquiagens, com suas cores vibrantes e sedutoras, numa mulher que, de tão feminina, pode passar horas se maquiando. O preto delineia os olhos, destacando o rosto da mulher, num exercício de fascínio, no universal ato de autoestima, como numa índia, pintando-se para seu casamento na tribo. O vermelho é a cor do batom, em bocas sedutoras e brilhantes, destacadas, como na aprumação de uma gueixa, maquiando-se para seduzir e encantar os homens, agindo da forma mais doce e feminina possível, contrastando com a dureza do mundo dos homens. O amarelo traz o ouro, num baú de piratas sendo aberto, ou na caixaforte do Tio Patinhas, no empreendimento de acumulação de riquezas, num reino inseguro, pois quanto mais ouro tenho, mais pessoas vão querer roubá-lo – um tesouro pode ser uma prisão, pois o que importa mais: tua imagem ou tua felicidade? Vemos aqui cândidas marcas de cor de rosa, na parte interior de uma carne bem cozida, feita por quem entende do riscado, pois comida boa não é comida sofisticadíssima, mas comida simples e bem feita, como um feijão com arroz bem feito. O rosa é a cor dos bebês, numa zelosa mãe trocando fraldas, no trabalho gigantesco que é a maternidade, sem falar na depressão pós parto. Todos os pinceis parecem ter começado juntos o momento de pincelada, como crianças apostando uma corrida, na sedução que é um jogo de tênis ou de futebol disputado por titãs do Esporte. Aqui é uma casa alegre, com crianças peraltas, sujando as paredes e fazendo bagunça, nas brincadeiras que têm como função introduzir o Mundo à criança, pois somos todos crianças em nossos inevitáveis erros, no sentimento de se querer voltar no Tempo e reparar tais erros, como numa inscrição a lápis sendo apagada pela borracha. Aqui, é como na fabricação de uma estampa, e as listras representam a retilinidade do nobre pensamento racional, pensamento frio e matemático que rechaça as malícias, como numa água gelada que, apesar de desconfortável e fria, é uma água que limpa e cura, como num remédio de amargo sabor, ou como num amigo que, apesar de tecer críticas rígidas ao outro amigo, acaba esclarecendo a mente deste. Claro que te perdoo, amigo! Estas cores remetem à bandeira nacional alemã, na universalidade das bandeiras, com cada um querendo ter uma identidade inconfundível, remetendo-me aos pavilhões dos países em um parque da Disney, tendo eu adquirido uma bandeirinha de cada país ali representado, num esforço diplomático pelo diálogo, evitando ao máximo a Guerra, e Tao é assim, um polido e sofisticado diplomata, mantendo em Paz a Dimensão Metafísica, a plácida vizinhança onde dá gosto morar. Aqui, temos uma certa alegria, talvez numa nação comemorando um grande título, como numa Copa do Mundo de Futebol. Estas listras parecem ser serpentinas num salão de baile, numa divertida sujeira na qual podemos, ao menos por um instante, ser novamente as crianças bagunceiras que fomos um dia. Aqui, são as cores delimitando placas e sinais de Trânsito, havendo no Respeito a base para que tais formas façam valer, como na Inglaterra, onde há a impressão de que a Rainha comanda tudo, desde a menor sinaleira à maior guarda militar. Estas linhas sublinham algo, talvez palavras importantes num texto, como num aluno lendo e tendo que crescer para passar na cadeira universitária, no modo como quase rodei na cadeira de Filosofia em minha faculdade, topando-me com uma professora exigente, à qual dei uma pincelada de Taoismo. Aqui, é o prazer do artista em pegar um pincel e produzir algo, como Tao, o grande artista, sempre produzindo, sempre sendo útil ao Cosmos.

Referências bibliográficas:

Arman. Disponível em <www.pt.wikipedia.org>. Acesso 20 nov. 2019.
Artworks. Disponível em <www.armanstudio.com>. Acesso 20 nov. 2019.

quarta-feira, 20 de novembro de 2019

Claro Talento



O francês Yves Klein (1928 – 1962) nasceu filho de pintores. Pouco antes de falecer, fundou um movimento chamado Novo Realismo. O site de YK é de boa qualidade. Os textos e análises semióticas a seguir são inteiramente meus. Boa leitura!


Acima, Globo Azul. Parece que o Mundo foi todo inundado, e que sequer sobrou o monte Everest para contar a história. É como na inundação de Noé, quando Deus ficou furioso com a falta de apuro moral do Ser Humano, na ira patriarcal, como num islâmico radical, sem a fineza diplomática para respeitar as diferenças, no eterno e perene talento do Ser Humano para a briga e para o desentendimento. É como na caótica e recente inundação da cidade de Veneza, trazendo caos e desalento, ou como na grande enchente de 1941 que assolou a cidade de Porto Alegre, no modo como a Dimensão Material é exigente na forma como tragédias formam oportunidades para que haja solidariedade, com voluntários que decidem ajudar de alguma forma, no sentido da Caridade, que é ajudar sem ambicionar receber algo em troca. Porém, a gratidão é uma virtude; a ingratidão, um problema. Por exemplo: no ano de 1985, eu cursava a segunda série do Ensino Fundamental. Um coleguinha meu, destro, caiu de um cavalo e quebrou o braço direito, ficando impedido de ir à aula. A cada dia de aula, um coleguinha levava para casa o caderninho do acidentado para transcrever a matéria do dia, e eu fui um dos colegas que fez este ato de amor fraternal. Nove anos depois, em 1994, quando eu era colega desta pessoa no Ensino Médio, este colega me agradece me insultando... Este globo é uma referência ao estudo, à produção de Cultura Erudita, esta ferramenta tão necessária para fazer um país culto, educado e sábio. É a Disciplina, este ingrediente tão fundamental para quem quer fazer algo de destaque benéfico. O globo aqui está respaldado, enaltecido, erguido, reverenciado e destacado, como uma mulher que foi desposada para ser tratada como uma rainha. É a metáfora do salto alto, esta febre permanente entre mulheres, erguendo a mulher a um patamar superior, numa mulher que se dá ao respeito e que quer o melhor, nunca aceitando migalhas, como ser a mera amante extraoficial de um cara. A fita métrica arredondada é o modo humano de medir as distâncias e estabelecer referências organizacionais, na forma de contar o Tempo ou de traçar limites entre terras, enchendo os lugares de nomes e graças, na tarefa de catalogar e classificar uma Natureza tão confusa e caótica. Abaixo do globo, vemos um globinho negro, como se fosse a versão em miniatura, numa metalinguagem – globo falando de globo. É como se fosse a versão sisuda do globo azul, exercendo uma sisuda atração gravitacional, no termo “colocar os pés no chão”. É o juízo, a responsabilidade de adulto, no modo como tenho um amigo alcoólatra, que não se trata e nem quer adquirir responsabilidade sobre sua própria vida. As varetas negras que sustentam toda a estrutura são como patas negras de aranha, amedrontadoras, ameaçadoras, num quadro agudo de aracnofobia. É como uma pessoa que vai chegando devagarzinho, sempre invisível, sempre subestimada, para, enfim, dar o “bote”. E este globo nunca para de girar, nos incessantes dias e noites se revezando, no modo humano de reservar algo apropriado para cada etapa do ciclo rotacional terrestre. Este azul é nobre e discreto, nas majestosas vestes de um rei, ganhando o respeito do povo, sempre agindo de forma minimalista, sempre evitando afetar o pacato dia a dia do cidadão comum, pois o próprio rei tem que viver em simplicidade, nunca supervalorizando o palácio nem subvalorizando a beleza dos campos de seu reino, no modo como elementos da Natureza podem se tornar símbolos de determinados reinos, como na flor de lis ou no lótus. É a necessidade humana de abraçar a Natureza e encontrar beleza e propósito na criação de Tao, o Rei dos reis, numa inevitável hierarquia. A Geografia tenta trazer Lógica ao Caos, demarcando Tempo e Espaço, no ainda imaturo modo humano em compreender algo tão vasto, tão ambicioso.


Acima, Relief Portrait of Arman. O amarelo e o azul formam um contraste, que chama a atenção do olho. O homem está sem pernas, limitado, impedido de caminhar, como se tivesse sofrido um acidente que acabou fazendo com que as pernas fossem amputadas. São as inevitáveis limitações da Vida, no sentido de que ninguém pode fazer tudinho o que quer, fazendo com que, na “luta”, muitos “anéis” sejam perdidos, deixando os dedos nus ou quase nus. O homem aqui não olha para o espectador, talvez ignorando este. O homem para o Céu, talvez almejando um sonho, um ambicioso projeto, no modo como os projetos de artistas são esses sonhos, essas ambições, no desejo antissimplório de promover comoções, impedindo que a Arte passe despercebida ou ignorada. O fundo amarelo é dourado como o ouro saqueado por ladrões em tumbas de faraós, na avidez de bandidos que roubam até placas de bronze de monumentos públicos. É a obsessão humana por matéria, por coisas, por dinheiro, por referências mundanas, na vulgaridade medíocre de mentes que simplesmente ignoram o que vale, que é o Metafísico. Este amarelo é um reconfortante amanhecer, banhando de ouro campos e parreirais, num momento que nos dá ideia da perene beleza das terras metafísicas, as quais nos esperam após o Desencarne, com entes queridos já falecidos, entes que nos recebem belos e felizes, no meu intenso desejo que conhecer, lá no Céu, meu bisavô Joaquim Pedro Lisboa – um dia encontrar-me-ei com ele, sim. Este tom de azul é representativo nas obras de Calvin Klein, digo, Yves Klein, num tom que traz discrição e nobreza, no deleite que é interagir com uma pessoa que tem polidez no fundo de seu coração, como num fino lustre de cristais, hipnotizando-nos com seus miniarcoíris, numa transparência que faz metáfora com a transparência das intenções de pessoas com crescente apuro moral, ou seja, gente fina, mas não no sentido materialista. Esta obra tem um intencional charme, como se estivesse inacabada, fazendo metáfora com o fato taoista de que tudo é processo, tudo é depuração, tudo é crescimento, e todos somos obras inacabadas, sempre havendo espaço para uma nova lição, num caminho do termo “cada vez melhor”. Este homem é atlético, como num Jesus crucificado, na beleza dos corpos que tanto inspiram artistas, havendo no porte atlético a intenção de saúde e disposição, num Tao que quer o melhor para nós. Este homem não é um gurizote, mas aparenta ser um homem maduro, adulto, apesar do corpo jovial. Ele tem um olhar sério, num homem vislumbrando obstáculos e vicissitudes, nos percalços que vão nos fazendo pessoas melhores, pois qual seria o sentido de uma tediosa vida sem lições ou desafios? Portanto, coragem! Esta nudez é inocente, e não chega a agredir, no modo como a Arte é o caminho antimalícia. Este homem paira no ar, como um fantasma, ou uma aeronave, e ele se sustenta sozinho, sem precisar de um suporte. É como uma alma de consciência tranquila, que sabe que nada fez de Mal, na sensação de desapego e alívio em torno de um coração que não agiu com dolo, pois entre errar sem querer e errar de propósito existe um “abismo”, numa linha divisória muito clara entre espíritos bons e espíritos não tão bons. Este homem está solene, como num busto de algum digníssimo cidadão, enfeitando praças, no modo humano de ver na virtude e no respeito o enfeite para praças materiais que buscam se parecer ao máximo com as praças metafísicas, sendo estas lugares de Paz inabalável. Este homem está aprumado, de cabelo cortado e barba feita, como se estivesse preparado para um momento de interação social, como inaugurar algum monumento ou placa, como num príncipe presidindo algum evento inaugural em seu reino, representando toda a família real, havendo nesta um poder simbólico forte. É engraçado, pois, apesar de estar num evento social solene, o homem está nu, havendo na nudez a metáfora com a Transparência, num cidadão que é visto sem “roupas”, sem “maquiagens”, sem esconderijos, revelando-se digno e respeitável.


Acima, Sculpture tactile. Aqui, é como um radar, sempre girando para dar conta dos acontecimentos dentro de um vasto reino. São quatro faces, como as quatro estações do ano, ou como os quatro elementos primordiais. É como um ser com quatro olhos, multifacetado, como numa visão de 360 graus de abrangência, num desejo de onisciência, onipotência, como numa casa de Big Brother, repleta de câmeras, microfones e espelhos traiçoeiros, com subcelebridades que, em geral, são completamente esquecidas após o término da temporada do televisivo. Aqui, é como um robô programado para captar tudo, como numa tecnocracia de ficção científica, com estados totalitários nos quais o cidadão é integralmente vigiado e controlado, quando que, na verdade, o cidadão só é feliz se é livre, fazendo com que tantas pessoas queiram morar numa perfeita democracia como os EUA. Aqui, é como se fosse um tacape, uma ferramenta que mete medo e impõe respeito, no falo patriarcal, dizendo para que o cidadão mantenha distância e comporte-se (se este mesmo cidadão quiser evitar ser severamente punido). Aqui, é uma torre de observação, olhando para todos os pontos cardeais, como numa torre de controle num presídio, numa constante vigilância, num olho que nunca dorme, como no terrível olho de Sauron, o grande tirano que quer controlar tudo e todos, pois quanto menos Tao tenho, mais controle desejo obter... Aqui é como uma caixa de correspondência banhada de neve, na magia branca de gramados que amanhecem cobertos de neve, como se fossem feitos de açúcar, na raridade que são as nevadas no Brasil. Aqui, é uma casa com quatro janelas, com cada janela para uma etapa específica do ano, com os encantos de cada época, de cada estação, de cada fase da Vida, no modo como é maravilhoso o fato de que, na Vida, não existe retrocesso, mas apenas progresso, fazendo com que a pessoa se desencante com os meros sinais auspiciosos, adquirindo sobriedade, em oposição a uma pessoa bêbada, a qual faz metáfora com o vício em tais auspícios ilusórios. Este forte pilar sustenta algo, como num altivo pescoço de Nefertiti, na força de um pescoço que tem que sustentar uma pesada coroa, um pesado papel representativo, no peso que cai sobre a cabeça coroada, numa pessoa que, no papel de líder, tem que se colocar sempre por último, pois se sou um autocrata vaidoso e arrogante, como poderei ser bom rei? Aqui, é como uma caixa de passarinhos, só que com várias portinholas de entrada, talvez num ninho compartilhado, com mais de um pai ou uma mãe. Podemos ouvir o som do canto dos pássaros, como num pássaro sazonal, que só traz seu canto em uma época específica do ano, no reconfortante som de bem te vis, trazendo paz a uma vizinhança arborizada com casas bem mantidas, bem cuidadas, bem amadas. Estas “janelas” negras contrastam com a caixa branca. São olhos de pupilas dilatadas, próprias para se ver no escuro, no instinto de um animal que aprendeu a se adaptar à noite, no modo como o Ser Humano tem uma grande capacidade para a adaptação. Na base desta obra de Yves Saint Laurent, digo, Yves Klein, temos o responsável suporte, a base sobre a qual as noções civilizatórias são edificadas, no modo como o caminho da Humanidade é o crescimento, e o advento do Humanismo, a noção de que todos somos filhos legítimos de Tao, só que uma noção que nem sempre é contemplada... E de que adianta eu ir à missa no Domingo se, ao colocar o pé para fora do templo, esqueci de tudo o que o padre disse lá dentro? A Vida é um incessante trabalho de autovigilância, e esta torre de observação está sempre atenta às menores insinuações de malícia e de maldade, como num poderoso antivírus de computador, sempre atento à menor insinuação de vírus digital, vírus programados por mentes brilhantes, mas mentes que não amam o Mundo nem amam seus irmãos, num poder usado para o Mal. E é neste ponto que entra o Coração: se tenho inteligência e bom coração, usarei uso de tal ferramenta para o Bem.


Acima, sem título. A delicada flor se sustenta por um fragilíssimo caule, o qual parece que vai ruir a qualquer momento, na contradição da delicadeza – o delicado se impõe sobre o rude, sobre o grosso, sepultando este. É o discernimento taoista – fraco é forte; forte é fraco. É uma lição que só pode ser entendida intuitivamente, pela mente de pessoas de bom coração, numa doutrina bloqueada para sociopatas, os quais zombam de Tao, do Bem, da Paz, e isso é muito fácil de se observar – o sociopata acha, expressamente, que o Mal é mais interessante. Este caule é sinuoso, como nas curvas de uma topmodel, como na sinuosidade da logomarca da Unisinos, imitando as curvas do Vale dos Sinos, o qual é, quase obviamente, sinuoso. É a sensualidade da serpente, a qual em muitas culturas é associada à Fertilidade, à Fecundidade, seja do solo, seja do útero. É o poder da liquidiscência, impondo-se sobre o que é duro e inflexível. É o frágil e feminino pescoço de Nefertiti, sustentando uma coroa tão descomunal. Esta flor de YK tem um aspecto esponjoso, e é de uma cor que traz um tom tão predileto de Yves. Esta flor parece uma complexa colmeia, e podemos ouvir o zunido das abelhas em incessante labor, como numa pessoa trabalhadora, laboriosa, que sabe que os frutos só vêm com trabalho, numa espécie de alimentação, como um artista, constantemente alimentando o Mundo com Arte. Esta flor está um tanto inacessível, retirada, desafiando alpinistas. É um doce fruto de vitória que só pode ser conquistado por alguém muito competente e persistente, como numa mulher difícil, que impõe vários obstáculos aos vários pretendentes, visando, assim, valorizar-se perante estes, na questão de que não dá para a pessoa se “vender” por um e noventa e nove. O caule é um longo caminho, talvez numa pessoa que trabalhou muito em vida, conquistando uma gorda aposentadoria, como num maratonista chegando, exausto, à linha de chegada, exaurido, quase morto, mas vivo para desfrutar da glória vitoriosa. É uma linha condutora que nos guia em meio a um traiçoeiro labirinto, levando-nos ao centro do labirinto, na resolução de um mistério, num grande desafio, numa pessoa que se vê tão motivada frente a tantos percalços. Este caule é uma fina coluna de fumaça, anunciando algum incêndio, algum sinistro. É como a cordinha que prende um balão volátil. A cordinha é o porto seguro, a âncora, o juízo, no termo “ter os pés no chão”, no fato de que um artista deve, é claro sonhar; mas deve também ser realista na hora de tirar os projetos do papel, no desafio que é a um artista concretizar sonhos de Arte, como nos rabiscos de Christo e Jeanne-Claude, planejando suas majestosas instalações, num casal que, apesar de tantas glórias alcançadas, nunca conseguiu concretizar todos os seus projetos. Esta flor é como uma fumaça azul, numa colorida supernova explodindo, nas vestes oceânicas de azul, remetendo-me à imagem de Iemanjá no calçadão de Capão da Canoa, no modo como os astronautas, na Lua, veem a Terra como uma esfera azul; no modo como, vista do espaço, a Terra é um pontinho azul na escuridão cósmica. Aqui, são como esponjas na tarefa de limpar, no modo como uma boa obra de Arte, como um bom filme, tem a capacidade de dar um banho revigorante na mente do espectador, como naqueles filmes maravilhosos que fazem com que saiamos do Cinema com a alma leve, como uma livre gaivota à beiramar. Este caule, na sua forte finura, busca prender a flor volátil, impedindo que a pessoa viva ao sabor do vento, no modo como é importante que qualquer pessoa não viva tão ao sabor das incertezas, como pessoas que passam suas vidas sem construir algo... Aqui, são como explosões azuis, como numa bomba atômica azul. É como uma couveflor azul, recém extraída da horta, fresquinha, no frescor de renovação que são as escolas de Arte, como no impacto que o Modernismo Brasileiro teve na Sociedade Brasileira, num corajoso e heróico gesto de transgressão, mostrando que a Arte não é um cadáver imutável.


Acima, sem título. Escadas que levam ao nada, como numa vida sem sentido, de uma pessoa que, existencialmente vazia e improdutiva, passa seus dias fazendo fofocas, numa atitude desinteressante. Esses degraus parecem ter brotado da parede. São como barba ou pelos crescendo, brotando de uma raiz forte, como as fortes raízes de uma árvore que manteem esta fixa ao solo. São como goteiras na parede, com gotas pingando incessantemente, como numa mente artística, sempre elaborando, sempre inventando, no modo como Tao é assim, um criador incessante, sempre criando com sua Suprema Inteligência, deixando-nos perplexos ante tanta fertilidade genial, perfeita. Aqui, são como cabides, na sua serventia de dependurar roupas, no modo como todos temos que ser “varais”, “cabides”, tornando-nos úteis ao Mundo, o qual só acolhe aquele que contribui de alguma forma. Portanto, como diz a letra de uma canção de Macy Gray: “Levante-se; faça algo. Como você vai vencer se você nem tenta?”. Aqui, são como tijolos rebeldes, que querem se subtrair do sistema vigente, querendo se libertar da parede, da prisão, num espírito que, no fundo, está louco para desencarnar, mas tendo que aceitar que ainda não é a hora... É como um prisioneiro marcando na parede da cela quanto de tempo falta para a tão esperada libertação. Portanto, temos que fazer algo desses nossos dias de “presidiários”, como dizia minha querida vó Nelly: “Sem a Poesia, faria eu o que desta tarde brumosa?”. Esses tijolos azuis rebeldes são como refugiados, fugindo de sistemas opressores, temendo morrer se forem enviados de volta ao país de origem. É como se o vizinho ao lado estivesse pregando na parede pregos muito longos e grossos, invadindo minha casa, violando meu lar, no modo como um artista nunca deve ser narcisista para se achar o melhor de todos, ou seja, o trabalho de outrem sempre tem que ser respeitado, como no relacionamento entre dois atores: um ator é famoso; o outro, nem tanto. Aqui, são como tachões na pista da estrada, querendo chamar atenção do condutor, visando a integridade deste. Esta combinação entre branco e azul traz algo de mediterrâneo, grego, na beleza de casas brancas em meio a um oceano azul. É como no aspecto limpo como uma estampa listrada, como listras brancas e azuis. Esta parede é como uma esteira de produção, e os produtos são os tijolos, incessantemente fabricados, numa demanda enorme, num país de mercado consumidor amplo, com sua demanda titânica, como na exportação de carne brasileira ao Exterior, nos vínculos de Mercado que unem o Mundo, na utopia (improvável) de Adam Smith – os estados devem deixar de existir? É como nas rotas de Comércio entre sistema solares na saga Star Wars – o Materialismo é inevitável. Esses tijolos de YK são como treinamento de alpinistas, trepando em paredes que simulam as vicissitudes de uma escalada, numa pessoa que vai instintivamente desbravando seu caminho, num instinto que não pode ser ensinado em um livro ou em uma faculdade, na necessidade de, alguma forma, sermos autodidatas. Aqui, são como espinhos, grades, que têm a função de impor respeito, distância. É como uma pessoa que quer ser respeitada – eu tento respeitar todos, sempre. Por exemplo, em nunca piso nas mercadorias de ambulantes nas calçadas da Rua. Aqui, são como prateleiras vazias, prontas para exercer seu papel útil, sua serventia, na sensualidade do Vazio – a beleza está, exatamente, nos espaços vazios, pois estes são úteis, sempre prestando ao Mundo de alguma forma, pois como posso usar um copo que não tem uma boca aberta para o uso? Tao é assim, o subestimado Vazio, sempre útil, sempre servindo. Aqui, são como arestas prontas para ser aparadas, num diário trabalho de limpeza e manutenção. São como as farpas da madeira sendo lixadas para evitar que nos firam. Aqui, são como cinco grandes arranhacéus, só que dispostos de uma forma assimétrica, um tanto aleatória. São como prédios planejados, como na Esplanada dos Ministérios em Brasília.


Acima, sem título. Tiros sendo dados, como numa parede sendo alvejada, talvez num atentado terrível, no alvejamento da casa de uma pessoa, como nas ameaças de um traficante ou um mafioso. É como na famosa cena de Odete Reutman, vivida por Beatriz Segall, sendo assassinada com vários tiros, no mistério da telenovela: Quem matou Odete Reutman? Aqui, é como um vândalo danificando alguma parede na raiva que existe no coração de um vândalo, o qual é uma pessoa magoada que, de alguma forma, se sente rejeitada pelo Corpo Social. Então, as pichações pingam, como sangue sendo derramado, ou como gelo derretendo, pingando. É como se uma grande onda de calor estivesse atuando, castigando com suas temperaturas tão extenuantes. São como os relógios de Dalí derretendo, mostrando com é insignificante o modo humano de medir Tempo e Espaço. A tinta preta luta com a tinta rosa, como se fossem oponentes num octógono, decidindo, de forma muito agressiva, qual dos dois é o melhor, ou como num concurso de beleza, numa “carnificina”, sepultando tantos e tantos sonhos, como numa menina que, desde pequenina, sonha sem ser Rainha da Festa da Uva. O fundo aqui é pardo, no papel pardo, cuja fabricação polui menos do que o papel branquinho, no modo como a mentalidade humana está em franca transformação, na noção de sustentabilidade. O pardo é o ouro, pois é uma linda combinação embrulhar um pacote com papel pardo e enrolá-lo em uma fita dourada, numa questão de simples harmonia cromática, numa pessoa que sabe o que senta e o que não senta com determinada cor, num trabalho de sofisticação, de elegância, na elegância que nos diferencia dos demais símios, num espírito que, desencarnado, nada tem de símio, mas sangue estelar. Esta parede alvejada nos permite ver além dela, e vemos pelos buracos uma imensidão negra, como no Cosmos, numa vastidão que dá uma ideia de como Tao, definitivamente, não é simplório ou tolo. Aqui, são como gotas em um dia de chuva, sobre um vidro, no modo como tantas pessoas se sentem um tanto tristes em dias chuvosos. Essas gotas são os estalos criativos na mente do artista, numa pessoa que vai seguindo certo raciocínio, certa lógica, resultando assim em um trabalho único, inconfundível, como nas bolas e círculos de Yayoi Kusama, ou como nos gordinhos de Bottero, ou como nas cândidas cores de Romero Britto, com marcas registradas que fazem com que o público reconheça tal “impressão digital”. Estes pontos negros são como aranhas, tecendo silenciosamente suas teias, como num incorporador, construindo aos poucos um prédio, sabendo que os processos levam um tempo, nunca querendo acelerar etapas, num papel paciente, numa pessoa sábia que sabe que o Tempo deve passar. Aqui, são como gotas de “lágrimas” de uma vela, numa vela que, a partir de seu desgaste, revela sua idade e seu tempo de serviço, como no chocalho de uma cascavel, narrando uma carreira, uma trajetória, uma proveniência, uma linha condutora, a qual, quanto mais longa, mais perceptível, como num artista que foi, durante décadas, construindo uma carreira, pois os fracos não têm a capacidade de persistir, de continuar lutando, pois o Mundo não é dos fortes? Aqui, são arbustos num jardim, num sonho de paisagista. É um jardim plácido, muito pacífico, só havendo Beleza e Prazer na Paz, pois a Guerra não deixa tudo devastado e destruído? São como estrelas num mesmo “berçário”, numa mesma proveniência, como irmãos de sangue iguais, que foram criados sob os mesmos valores. Aqui, são como fantasmas negros, no modo a Depressão é tida como “o fantasma do meio-dia”. Esta tábua está toda perfurada, talvez no coração de uma pessoa que passou por algumas decepções, talvez decepções amorosas, tendo que se reerguer e retomar e boa e velha rotina, sempre crendo na regeneração espontânea dos sentimentos. Aqui, são como fogos de artifício estourando ruidosamente numa virada de ano, numa agressão sonora, que marca um momento de passagem e transição, como jogar arroz em nubentes.


Acima, o cara.

Referências bibliográficas:

Works. Disponível em <www.yvesklein.com>. Acesso 13 nov. 2019.
Yves Klein. Disponível em <www.pt.wikipedia.org>. Acesso 13 nov. 2019.