Carioca de 1961, Beatriz
Milhazes chegou a estudar Comunicação Social antes de, em 1980, começar a estudar
Arte, tendo também trabalhado como professora e coordenadora na área artística.
Em 2010, recebeu a honraria mais elevada do Governo do Estado de São Paulo – a Comenda
Ordem do Ipiranga. Beatriz é tida como uma artista mercadologicamente rentável
– segundo vídeo da TV Folha no Youtube, por exemplo, uma obra da artista foi
recentemente vendida por 16 milhões de reais. Os textos e análises semióticas a
seguir são inteiramente meus. Boa leitura!
Acima, Aubergine III (Green). Uma majestosa roseta em um templo pomposo,
colorido, fazendo metáfora com o Corpo Social, com o regente ao centro e tudo
girando em torno de tal poder. É também uma metáfora da Vida, numa pessoa que
encontrou algo para colocar no centro existencial, como uma pessoa centrada no
trabalho, ou uma mulher que coloca o marido e os filhos no centro de sua
própria vida. É uma metáfora dos ciclos, com tudo voltando ao ponto de origem.
É a magia primaveril, no bom gosto de Tao, em flores lindas, simbolizando a
paixão dos enamorados na explosão do cio de Primavera, com a Vida se renovando,
na fertilidade natural. Aqui, temos um pouco de Pop Art, neste fundo com
embalagens de produtos alimentícios, na exaltação da Cultura de Massa, da
produção industrial pujante, com embalagens de deliciosos produtos, no bom
pecadinho da Gula. É como uma farta gôndola de supermercado, na tarefa feminina
de coleta, como em tribos indígenas amazônicas, sobrando ao homem a tarefa
agressiva da Caça & Pesca. As embalagens estão escancaradas, desdobradas,
como no Cubismo, tentando expor todos os lados do mesmo elemento,
desconstruindo estruturas, pegando objetos triviais e transformando em Arte, na
missão plástica de produzir coisas novas a partir de elementos originalmente
dissociados. O chocolate Garoto é meio amargo, como numa paixão, onde há a doce
rosa e o amargo espinho. O Garoto é a jovialidade, a brincadeira, no modo como
a pessoa não pode deixar completamente de lado o aspecto doce e infantil que
traz leveza à Vida, havendo em Tao o pai zeloso que proporciona diversão à sua
gurizada, num lindo parque de diversões, no sonho infantil de viver em uma loja
de brinquedos. Os produtos aqui são uma mãe amamentando as crias,
proporcionando o sagrado alimento, em zelosos pais pássaros, levando minhocas
ao ninho, encarando escancaradas bocas famintas de seus filhotes. Estas
embalagens estão dispostas como quadrados e retângulos de Mondrian, evitando a
Simetria. Podemos ouvir o som de carrinhos de compras dentro do mercado,
havendo na mercadologia um ancestral talento humano para a negociação e a
barganha, num Jesus Cristo furioso dentro de um mercado, destruindo as bancas
de gananciosos e desonestos mercadores, no modo como a Espiritualidade vem para
combater o tradicional materialismo humano, num Ser Humano sempre ávido por
Dinheiro e Poder, como um rei infeliz, nunca satisfeito com os domínios do
próprio reino, sempre querendo mais, sempre disposto para lançar mão da
violência e da crueldade para satisfazer seus sonhos materialistas, na obsessão
por pedras preciosas, bens que não têm como acompanhar a pessoa após o
Desencarne desta. Aqui, temos produtos doces e irresistíveis, no modo como o
cacau, primordialmente subestimado, tornou-se um colosso mercadológico ao ser
misturado com leite e açúcar, como um artista subestimado, o qual levou algum
tempo para ser bem vendido e bem aceito, recebendo o “açúcar e leite” tão
necessários. Este é um quadro extremamente colorido, leve, engraçado, num
momento em que Beatriz
estava de Paz com a Vida, sem, no momento, ter alguma dor para catarsear. Esta
roseta é riquíssima em estampas, como numa artesanal colcha de retalhos, na
riqueza de uma floricultura, com o perfume de um espírito bondoso e clemente,
ao contrário do Ser Humano em geral, que é cruel, egoísta e incapaz de se
colocar nos sapatos do próximo. Esta roseta é como um sistema solar, com a
estrela ao centro, sempre entretendo, sempre encantando, numa pessoa que está
aprendendo a brilhar por conta própria, obtendo a imprescindível “autonomia de
voo”.
Acima, Cinnamon. BM nos traz explosões cromáticas, como num colorido
Romero Britto. Aqui, temos uma cena dinâmica, com muitas coisas acontecendo ao
mesmo tempo, como na cena cultural de um grande centro urbano, numa cidade
pujante e vibrante, com peças de Teatro e shows internacionais acontecendo,
como numa São Paulo, com sua extensa agenda cultural, cheia de salas de Cinema,
ou numa Porto Alegre, com seus cafés. Aqui, temos uma delicadeza e um perfume
feminino, com formas orgânicas e vegetais, com Vida sempre brotando, como capim
brotando em fendas no asfalto, na Vida sempre encontrando meios de perseverar,
sempre vencendo sobre a infertilidade e a Morte. No canto esquerdo superior,
vemos um poderoso Sol, explodindo em energia, nutrindo vários planetas e luas,
irradiando seu poder para alimentar cada árvore, cada plantinha, na nobre
capacidade de distribuição, na generosidade de Tao, o provedor. Este sol é como
uma gota mínima de água que cai sobre uma superfície plácida, fazendo “o chão
tremer”, na capacidade artística de causar comoções, na beleza do escândalo. É
como uma transmissão de Rádio, irradiando para aparelhos próximos e distantes,
unindo as pessoas em torno de uma programação, na ambição da Cultura de Massa
em atingir o máximo possível de pessoas. Aqui, é como um olho arregalado,
perplexo com um artista tão rico. Abaixo deste sol, vemos luzes redondinhas em
fila, e são as luzes de um camarim, ao redor de uma diva que se prepara para
pisar no palco, vendendo muitos ingressos, com pessoas ávidas por um pouco de
brilho e entretenimento. Mais abaixo, uma colagem, como um mágico álbum de
figurinhas sendo finalmente completo, mediante muita luta e persistência do
colecionador em encontrar as figurinhas mais difíceis e raras, trocando
figurinhas com os coleguinhas na Escola. Este quadro tem calor. Na extremidade
direita, uma grande base em laranja, cítrica, no modo como chefs fazem das
casas de laranja um ingrediente cheio de sabor e frescor, na criatividade de
Tao ao criar as frutas, esses produtos de sabor fascinante. Nesta laranjada,
vemos ramos de folha em cores mais frias, talvez tremulando docemente a uma
brisa, como numa bandeira nacional, havendo a universalidade do Patriotismo,
num pedaço de tecido representando a riqueza metafísica de uma nação, como
valores e tradições, como nas tradições inglesas em torno da Monarquia. Vemos
vários círculos neste quadro, como explosões vibrantes de uma bateria em um show
de Rock, numa multidão enlouquecida, unida em torno da Arte, da Música, do
brilho de um popstar que sabe causar comoções e provocar o Corpo Social, como
um chef lançando mão de pimenta e outros condimentos “mágicos”. Quase ao centro
do quadro, um retângulo que parece ter sido feito de madeira, na capacidade
humana em transformar, pegando um ser vivo, que é uma árvore, e transformá-lo
em um móvel, e um bem, talvez em um barril de vinho, como de carvalho francês,
dotando o vinho de um sabor incomparável, como em fragrâncias amadeiradas, no
cheiro gostoso de madeira nova ou antiga. Mais ou menos ao centro do quadro,
vemos uma figura vegetal, numa arvorezinha se insinuando, lutando para viver,
para prosperar, na inevitável luta que é a Vida, numa plantinha que tem que
tirar força do nada para sobreviver, lutando por seu espaço ao Sol, num
discreto azul marinho, como se soubesse da necessidade de se ter uma certa
discrição, uma invisibilidade, para, assim, pegar Mundo de surpresa e ensinar a lição de que não
devemos evitar subestimar outrem. Vemos também no quadro formas que parecem ser
tijolinhos, na paciente trabalho de construção, numa formiguinha persistente,
como na casa de tijolos a vista na qual morei por muitos anos de minha vida. É
o trabalho persistente, pé por pé, com passinhos de bebê, comendo o Mundo pelas
bordas para, no momento menos esperado, dar o “bote”! Aqui, temos uma força
rítmica complexa, como várias camadas de sabor num prato refinado, feito por
quem sabe fazer.
Acima, Madame Caduvel. Temos aqui um quadro com muita identidade feminina,
com algo exótico. Podemos sentir o cheiro de Chanel No. 5, e talvez ouvir o som
de mulheres perfumadas conversando em uma sala, no encanto de fragrâncias.
Vemos aqui formatos de lustres suntuosos, com penduricalhos e ornamentos, e
talvez ouvir o delicado som das peças de cristal tocando umas nas outras. Vemos
aqui dois elementos que parecem ser mandalas, assinalando os ciclos das
estações, na natureza cíclica do Mundo, com processos iniciando e decaindo, no
modo como a Vida morre no Outono e renasce na Primavera. São como teias de
aranha, teias sedutoras, numa mulher que soube fisgar seu homem, e que soube
casar bem, elegendo um homem que a trate como uma rainha. São buracos negros no
meio das galáxias, no vazio que acaba tomando o Universo, no modo como Tao é o
vazio, é o copo vazio, sempre pronto para portar Vida e ser útil ao Mundo, na
felicidade das almas que se veem úteis aos que as cercam. Vemos aqui uma certa
estética oriental, um tanto indiana, com os perfumes de especiarias que tomaram
a Europa de assalto, seduzindo o Ocidente com os aromas e sabores de terras
distantes, no poder da delicadeza, no modo como a sutileza caba se impondo
sobre a grosseria. São como guardachuvas abertos, na função de proteger como o
teto de um lar, no telhado que é Tao, o grande protetor; o grande agregador, no
talento de patriarca ou matriarca, unindo a família em uma noite de Natal. São
como leques abertos em 360 graus, desdobrando-se, revelando-se ao máximo. São
como antenas parabólicas, na função de captar, no modo como o artista quer ser
captado por um mundo que, por sua vez, pode se mostrar tão frio e indiferente
em relação a assuntos que tratem de Sensibilidade, num mundo aguerrido, em que
a Guerra destrói o que é belo e harmonioso, no horror que é irmão derramando o
sangue de irmão, num campo de batalha miserável, em que só há sangue, lama e
devastação, no modo como a vida de uma pessoa pode passar por um lento e
gradual processo de empobrecimento, cabendo a esta pessoa a árdua e difícil
tarefa de reconstrução existencial, num processo reconstrutivo que pode levar
muitos anos, algo que exige da pessoa um esforço gigantesco, porém necessário,
ou seja, o indivíduo é levado a encarar os fatos. Ao topo do quadro, vemos uma
forma que parece ser um coração, no fato de que, sem Amor, nada se faz, talvez
numa Beatriz Milhazes apaixonada pelo que faz, convertendo tal amor em
valorização de Mercado, na capacidade das grandes almas, as quais têm o ouro,
mas o ouro não as tem. O coração é a paciente dedicação, num trabalho calmo e
lento, no prazer imensurável de se fazer algo sem sofrer pressões. Neste
quadro, vemos golas elizabethanas, numa rainha enérgica que transformou uma
nação desrespeitada em uma nação rica e poderosa, num talento de estadista,
fazendo de Beatriz uma rainha no que faz. Aqui, são como tortas enfeitadas,
apresentadas de forma agradável aos olhos e ao paladar, no modo como há
deliciosos doces para ser apreciados na Dimensão Metafísica, mostrando que os
pecadinhos capitais não são assim tão tenebrosos, no fato de que a Preguiça,
por exemplo, foi responsável pelas maiores invenções da História – a Roda e o
Telefone, ou seja, na preguiça de carregar coisas ou de sair de casa para ir
conversar com outra pessoa na casa desta, nos mágicos e-mails, numa Humanidade
progredindo muito, muito rapidamente. E o artista tenta acompanhar e interpretar
tais momentos de coletividade, numa dança que coloca todos no mesmo passo, como
Tao, o grande DJ. Aqui, são como flores, expandindo-se em todas as direções,
formando formas simétricas, equilibradas, numa pessoa que encontrou equilíbrio
ao centrar a própria Vida e torno de algo válido e nobre.
Acima, Modinha. Este quadro parece ter uma dinâmica, com coisas
acontecendo ao mesmo tempo, como no Mundo de hoje, onde a Internet tomou conta
da Humanidade, e quem não tem um dispositivo digital simplesmente se sente
deslocado e desconectado da Realidade. Aqui, temos o diálogo entre reto e
tortuoso, talvez numa relação entre siso e delicadeza. Beatriz gosta de formas
vegetais, na sedução de uma hera, que vai chegando aos pouquinhos,
imperceptivelmente, e acaba por tomar conta de tudo, assim como receitas com
chocolate acabam com o chocolate tomando conta de tudo. É a festa da Vida, como
na natureza sedutora e exuberante do Rio de Janeiro. É como um jardim botânico,
ou uma acolhedora sala de estar, com suas estampas que nos remetem a florestas
“artificiais”, por assim dizer, como numa floresta coberta de carpete e árvores
com folhas de veludo, num lugar que definitivamente nos atrai, numa sala com um
anfitrião polido, que nos faz sentir à vontade. Tal qual uma Yayoi Kusama,
Milhazes costa de círculos, como se fossem explosões, mas não explosões
destrutivas, mas explosões de percepção cromática, bombardeando a mente do
espectador. Alguns dos círculos aqui são formados por vários pontinhos, numa
metalinguagem – o ponto maior falando de pontinhos menores, e viceversa, ou
seja, ponto falando de ponto, no modo como é inevitável que um artista seja
inspirado por outro, numa retroalimentação, num beijo mútuo. Esses furinhos são
os furos da burca de uma muçulmana, não só limitando nossa percepção sobre tal
mulher como também limitando a visão que tal mulher tem do Mundo. São furinhos
dos quais escapa o gás no fogão, no caos da recente Greve dos Caminhoneiros no
Brasil, com o estoque de gás estando comprometido – é a força da união,
pressionando governos em nome de reivindicações. São os furinhos do chuveiro,
no saudável ritual diário de purificação que é o banho, no modo como tudo na
Dimensão Metafísica é limpíssimo, havendo nas faxinas do Plano Material uma
tentativa de imitar tal plenitude salubre, pois Tao é limpo e cheiroso. As
esferas aqui parecem estar apostando uma corrida, na excitação das competições,
quando o público assiste para ver quem será o campeão, o doce mel da vitória.
Podemos ouvir o som de corrida de Fórmula 1, nas mágicas manhãs de domingo em
que o Brasil via Senna vencer, com a tradicional musiquinha da vitória, o
famoso “tã tã tã”. Há nas vitórias esportivas uma metáfora para o fato de que a
Consciência sobrevive à morte do Corpo Carnal, na vitória do Pensamento sobre
sobe a Vulgaridade. Difícil não gostar dos quadros explosivos de Beatriz, com
tanto bom gosto. Aqui, são mágicas bolhinhas de sabão, encantando as crianças
com tamanha leveza e delicadeza, como algo mágico, que desafia as rígidas leis
de Gravidade. Vemos aqui uma hierarquia, pois há círculos de diversos tamanhos.
Alguns círculos aqui estão enfileirados, como uma mãe pato conduzindo os
filhotinhos em fila, como uma professora de Pré-escola, conduzindo os alunos em
fila em ordem de altura, tentando impor alguma ordem e lógica ao caótico mundo
bagunceiro das crianças, numa idade em que o indivíduo criança começa a ser
cobrado em nome do bom comportamento, pois quem descuida dos estudos
desencaminha-se na Vida. Aqui, são como colares de pérolas, no poder
transformador da mão artesã humana, pegando elementos da Natureza e
arranjando-os de forma a estabelecer ordem e beleza. Este quadro nos diz que as
coisas e as fases passam, e que temos que aproveitar o momento para captar a
beleza dos processos da Vida, parando um pouquinho de trabalhar tanto e
arranjando um pequeno espaço de tempo para a contemplação. Aqui, é uma explosão
de fragrâncias, como uma bandeja no banheiro, cheias de frascos coloridos de
perfumes, com os frascos sendo iluminados pelo sol que entra elegante pela
janela do banheiro, remetendo à canção de Rita Lee: “Que tal nós dois numa
banheira de espuma?”.
Acima, Nu Azul. Parecem dois olhos arregalados olhando diretamente para o
espectador. São olhos ávidos, querendo ver tudo e todos. São olhos ambiciosos,
sedentos por conhecimento, na sede humana científica por conhecimento, com
astrônomos enviando sondas Sistema Solar afora. São duas gotas perfeitamente
simétricas, com duas gotas sendo derramadas ao mesmo tempo num plácido lago,
causando perturbação, inquietação, numa Beatriz criativa, que não quer se
repetir. Ao centro, uma bela rosa púrpura, simbolizando a Feminilidade, a Rosa
Mística de Maria, os encantos perfumados de uma mulher com autoestima, que se
arruma antes de sair de casa, sabendo que idade não é pretexto para parar de se
arrumar. A rosa está cercada por uma coroa de flores, talvez uma coroa fúnebre,
na tentativa humana de encontrar alguma beleza no Desencarne, num Ser Humano
que, frequentemente, associa a Morte a algo, horrível, muito horrível, ao
contrário dos espíritas, os quais, apesar de sentir a morte de um ente querido,
levam a Morte de um modo mais tranquilo e natural, pois a qualquer momento...
Num subconjunto maior, uma guirlanda de flores rubras, da cor do batom, num
quadro feminino, assinalando o momento em que as mulheres Homo sapiens deixaram
de lado a animalidade e se tornaram femininas, entrando em harmonia com conceitos
civilizatórios, como nas belas mulheres do Egito Antigo, com suas sobrancelhas
impecavelmente delineadas, como no famoso busto de Nefertiti, uma mulher que
simboliza a depuração da dimensão acima da nossa, na tentativa egípcia de
apreender o metafísico, fazendo do faraó um link entre Terra e Céu, com
pirâmides agressivas apontando para o Céu, para a Grande Morada, para o lugar
onde os egos desaparecem, com pessoas vivendo com mais Paz, sem tanta avidez
por poder. Num círculo maior, vemos vários pequeninos círculos formando outro
círculo, como uma roda de crianças, numa brincadeira que faz metáfora com o
Corpo Social, numa mesa redonda, sem cabeceira, onde somos todos iguais, no
modo democrático de eleger líderes, colocando-os no Poder e retirando-os depois,
numa alternância que a Humanidade considera saudável, no poderoso paradigma
democrático. Na porção inferior do quadro, vemos uma silhueta de arranjo
floral, talvez numa madeira esculpida, como adornos em molduras de quadros ou
espelhos, no hábito feminino do enfeite, do adorno, em busca de beleza,
harmonia e paz, com estruturas florais se expandindo de forma equilibrada e
simétrica, num Ser Humano empenhado em encontrar lógica em um mundo tão
caótico, num Ser Humano incapaz de entender a totalidade do Universo. Nos
quatro cantos do quadro, vemos uma estampa em dourado, com formas orgânicas
entalhadas, um pouco psicodélicas, tortuosas e insinuantes, como o perfume de
uma mulher se espalhando no ar, inebriando pretendentes, no modo como muitas
pessoas, ao consultar com o célebre médium Chico Xavier, afirmam que sentiam,
de forma metafísica, o perfume comportamental do mestre, o qual, em profunda
humildade, afirmava ser apenas um “carteiro”, entregando cartas entre
dimensões, apaziguando os corações de mães que perderam seus filhos. Neste
quadro, vemos círculos concêntricos, como bonecas russas, como os vários
sarcófagos que guardaram o corpo de Tutancâmon, numa espécie de proteção, como
uma pessoa agasalhada para enfrentar o frio, com várias camadas de roupas, como
uma mãe zelosa, que agasalha os filhos antes destes enfrentarem o frio do lado
de fora. Este quadro traz uma comoção, uma explosão escandalosa, como uma
perturbação na Força, a energia que une o Universo na ficção científica Star Wars. É uma metáfora para Tao, a “cola”
que nos une, fazendo-nos irmãos. E tudo aqui vai girando em torno de um ponto
escuro e misterioso, no modo como ninguém pode saber exatamente tudo o que vai
acontecer, nos mistérios das esquinas da Vida.
Acima, Succulent Eggplants. Aqui, há uma “luta” entre simetria e
assimetria, talvez num impasse entre Arte Acadêmica e Arte Moderna, no “choque
térmico” que foi o impacto do Modernismo Brasileiro, um movimento que abriu
inúmeras portas a artistas de gerações posteriores, na saudável transgressão,
numa adorada Diana, uma pessoa que agrediu comodidades e mandou um príncipe à
merda, com o perdão do termo. Vemos aqui uma loja de bijuterias, ou de roupas
femininas, com muitas estampas. É como uma cerca ornamental, a qual tem função
dupla – enfeitar e proteger, na tradicional junção “útil ao agradável”, ou
seja, utilidade e frivolidade, como Yin e Yang, como os espinhos em uma rosa,
dando-nos o recado de que a flor tem que ser protegida da ação de predadores,
como formigas, nos inevitáveis espinhos encarnatórios, numa pessoa que tem que
saber lidar com tais arestas, na necessidade da pessoa em desenvolver
agressividade, protegendo-se de sociopatas maliciosos e nocivos, como num homem
que se torna fisiculturista, cheio de músculos, querendo construir uma defesa,
um resguardo, mandando um recado bem nítido: “Não se meta comigo. Sou amigável,
mas irei à guerra se provocado”. Mas na parte inferior do quadro, vemos um
pilar, um retângulo, algo que ergue uma coisa a um patamar mais alto, numa mulher
que quer casar bem, com um marido que a trate muito bem, fazendo metáfora com o
salto alto, algo que faz com que a mulher se sinta mais alta, mas elevada, mais
exaltada. É o pilar mínimo, quase invisível, que sustenta as futuristas casas
do desenho Os Jetsons, remetendo-nos
às mansões metafísicas, que não precisam ser sustentadas por pilar algum,
separando-se drasticamente das vicissitudes materiais. As rosas de Beatriz
remetem ao cenário do acústico de Cássia Eller, fazendo contraste com a
agressividade viril da intérprete, numa Cássia catártica, que subia no palco
para desabafar, para extravasar toda uma energia estancada por um mundo tão
duro em relação ao que não tange ao plano heterossexual – todos temos feridas
as quais precisam de catarse, ou seja, de cura. Neste jardim estilístico de Milhazes,
podemos ouvir o cândido cântico de passarinhos, numa brisa suave que faz
farfalhar como som sutil de veludo em atrito, no farfalhar de uma borboleta,
namorando com o máximo possível de flores. Coco Chanel, que trouxe as
bijuterias, libertou a Mulher, afirmando que o que importa é o efeito visual, e
não o valor econômico do adorno, no poder do estilo, da atitude, derrubando
ranços milenares e trazendo ventos de renovação, libertando a Humanidade. Na
porção superior do quadro, vemos dois seios femininos, na dolorosa “loucura”
que uma mulher comete para siliconar os próprios seios, na universal busca por
beleza, por submissão a padrões de beleza, muitas vezes padrões um tanto cruéis
e ditatoriais, trazendo insegurança à Mulher, ferindo a autoestima desta a fim
de vender produtos e serviços cirúrgicos. É um horror. Estes seios estão em
completa simetria, no modo como Tao concebeu muitos seres vivos de forma
simétrica, compondo o equilíbrio ambiental, com as formas cíclicas da Cadeia
Alimentar, num sistema autossustentável. Estas formas orgânicas remetem aos
detalhes de Direção de Arte de Os Senhor
dos Anéis, com formas artesanais orgânicas élficas que remetem às formas
liquidiscentes da Natureza, do modo como os campos e florestas vestem vestes
majestosas. Nesse quadro de identidade feminina, lembro de uma conversa alegre
de duas mulheres dentro de um elevador, e uma disse para a outra: “Adoro usar
bijus, muitas bijus que fazem barulho, como pulseiras. Quanto mais barulho,
melhor!”. É a alegria feminina, quebrando um pouco a sisudez a trazendo perfume
e suavidade a um mundo tão sério e masculino. Estas mandalas de Beatriz parecem
girar, como num carrossel em um parque de diversões, no registro cíclico de
tempo: não estamos vivendo um ano atrás do outro; estamos vivendo um ano que,
ao findar, volta ao mesmo lugar de origem.
Referências bibliográficas:
Beatriz Milhazes. Disponível em <www.escritoriodearte.com>.
Acesso 7 ago. 2019.
Beatriz Milhazes. Disponível em <www.pt.wikipedia.org>.
Acesso 7 ago. 2019.
Beatriz Milhazes Obras. Disponível
em <www.google.com>. Acesso 7 ago. 2019.
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