Volto a falar do genial e
ultraextravagante casal de artistas plásticos Christo e Jeanne-Claude. Os
textos e análises semióticas a seguir são inteiramente meus. Boa leitura!
Acima, Pacote de 42,390
Pés Cúbicos. Local: Minneapolis, Minnesota, EUA. É
uma larva transparente, revelando o interior de suas entranhas, como se fosse
uma negra e horrenda aranha, só que iluminada, revelada e analisada, eliminando
a fobia, como Galadriel, nas profundidades uterinas sendo iluminadas e solucionadas.
O interior é festivo e doce, como se fossem várias guloseimas, numa colorida
festa infantil, cheia de doces deliciosos, enchendo os olhos (e os estômagos)
da criançada. O helicóptero ergue a escultura, tornando-a leve e esvoaçante. É
uma agradável piscina de bolinhas, convidando a criançada a brincar e
divertir-se. O helicóptero é como um inseto gigante, cercando os confeitos e
querendo devorá-los, como uvas maduras e doces, cercadas de abelhinhas que
querem sugar tal suco precioso. É como se fosse uma grande bolsa de mulher, só
que sem segredos, sem esconderijos, como um mistério de Agatha Christie sendo
revelado ao fim do livro, trazendo a luz do esclarecimento, expulsando para
sempre as sombras de indefinição do Umbral, o lugar mais escuro e sujo que
existe. Aqui, é um grande balão respirando, cheio de ar, de vida, respirando a
fazendo parte de um ecossistema. É como se fosse uma abelha rainha, pronta para
parir muitos ovinhos, num papel simbólico de fertilidade, no modo como a
célebre Rainha Victoria se tornou um útero reprodutor, ao ponto da rainha,
idosa, sofrer de uma doença relacionada a tantas gestações. As cores celebram a
diversidade, num mundo divertido, colorido e diversificado, ao contrário de um
sistema opressor, num regime que sequer permite que o cidadão tenha os cabelos
da cor que este cidadão desejar. Neste grande útero leve como ar, as bolinhas
estão se desenvolvendo lentamente, até que ocupem todo o útero e explodam num
parto, como ovas de salmão sendo despejada no rio, no fim de um ciclo, findado
com um orgasmo fatal, com os ovos fertilizados correndo rio abaixo, para o
reinício cíclico, no modo como a Natureza funciona por meio de ciclos, ao contrário
da medição da passagem de Tempo, o qual não é cíclico, mas linear – ano 1, ano
2, ano 3 etc. É a tentativa humana em encontrar sentido e propósito em uma vida
que segue esses insanos padrões cíclicos, com ciclos enigmático que se concluem
e renascem logo após. Esta gigante larva está se alimentando, e ainda há espaço
para muito mais comida, com seres vivos cujo propósito é alimentação e
reprodução. Podemos ouvir o furioso som do helicóptero, anunciando
esfuziantemente a obra de Arte, num casal que se tornou alterego um do outro,
numa simbiose, numa harmonia, num trabalho em equipe, como nos irmãos que
conceberam Matrix. CJC nos deixam
perplexos, com um poder similar ao de um feiticeiro, de um bruxo de alguma
tribo ou sociedade, uma pessoa que tem o dom de inspirar o corpo social e unir
as pessoas em torno da celebração da vida. É como uma grande acne prestes a ser
espremida, revelando de forma catártica o interior, num descarrego, num alívio,
como uma pessoa que, depois de dar “um esporro no Mundo” – desculpe o termo
chulo –, sente-se livre, leve e solta, numa sensação de alívio mesmo, de
desabafo, no poder terapêutico por trás de uma catarse. É um balão que vive ao
sabor do vento, havendo no helicóptero a âncora, a seriedade, a referência,
combinando ímpeto com juízo. É como um ninho de Páscoa cheio de ovinhos
diversos, na magia da fertilidade, num mágico cesto cheio de coisas que celebram
a alegria de viver. Aqui, é um desentendimento sendo elucidado, como amigos
que, depois de uma briga, fazem as pazes, no poder do diálogo diplomático, uma
força de boa vontade que visa o Bem, sempre. É o resultado de um persistente
trabalho de acumulação, ou colecionismo, nas minhas doces lembranças de
Infância de minha coleção de brinquedos, colecionados ao decorrer de anos.
Acima, Running Fence. Locais: Condados de Sonoma e Marin, Califórnia, EUA.
Uma grande muralha da China, só que de tecido. É o estabelecimento de um marco,
uma referência, como antes e depois de Cristo, ou antes e depois do 11 de
Setembro em Nova York.
É o estabelecimento de um limite, de um discernimento, como numa pessoa que
aprendeu a julgar de diferenciar as coisas. É como um muro entre dois vizinhos,
numa vizinhança que, apesar de pacífica e harmônica, exige lá seus muros, seus
claros limites, como num sonho que às vezes tenho de noite, quando meu
apartamento está anexado ao de outro vizinho, sem limites ou paredes
divisórias... É como um pai enérgico, que impõe limites aos filhos, sabendo da
importância de Disciplina, acostumando os filhos com a ideia de que é
necessário que se tenha a cabeça no lugar, numa imposição a qual a criança, no
fundo, gosta, pois os limites dão a sensação de lar e de proteção. Deus Jesus
do Céu, como são grandiosos CJC. Aqui, temos um terreno inóspito, semiárido,
perfeito para fazer com que esta muralha se destaque. É como na dúbia fronteira
entre EUA e México, num Trump empenhado em construir um muro, um marco claro
divisório, com a nobre intenção de inibir o Narcotráfico. Esta paisagem parece
com a do planeta Marte, inóspita, e podemos ouvir um som de vento cortante, num
cenário solitário, desértico, na sensação de despertencimento de uma pessoa
solitária e perdida. As linhas divisórias são a tentativa humana de delimitar,
analisar e esclarecer, como na clara divisão entre as especialidades médicas,
pegando um organismo inteiro, que é o Corpo Humano, e dissociando as peças de
um quebracabeça, como analisar uma obra de Arte. Aqui, é como uma grande
serpente branca, imensa, cortando terras e terras, com sua sensual sinuosidade,
como no majestoso caminhar de uma supermodelo na passarela, fazendo referência
às “deusas” que povoam a imaculada Dimensão Metafísica, a dimensão onde a
Juventude, a Beleza, a Inteligência e a Irmandade são eternas. Aqui, é como se
as nuvens no Céu estivessem sendo emprestadas para formar tal cerca. É como uma
vasta plantação de algodão, um campo que foi devastado, só deixando restar uma
magra fileira. É uma cerca voluptuosa que respeita as formosas formações nesta
terra; não é uma cerca retilínea, como as retas linhas que dividem vários
estados americanos. Estas delimitações de CJC formam particularidades, como nas
leis estaduais, as quais mudam de estado para estado, ou de cidade para cidade.
Aqui, terras de um majestoso reino se estendem indefinidamente, em vastos
domínios, como em feudos medievais, com delimitações as quais devem ser
respeitadas, pois, do contrário, os senhores feudais entram em guerra, na
eterna insatisfação de um rei, o qual não está feliz em seus próprios domínios,
sempre querendo mais e mais, na eterna insatisfação humana, pois a felicidade
está no contentamento, e não na ambição. É como na sede de um Napoleão, o rei
Leão que nunca estava saciado. É como um Muro de Berlim, com um poderoso papel
simbólico, simbolizando a então bipolaridade entre Capitalismo e Comunismo.
Então, o muro foi demolido, como numa irmandade, com terras que não precisam
ser demarcadas, pois, se irmão respeitar irmão, está tudo certo. É como se esta
muralha quisesse conter um vazamento de óleo, ou conter as riquezas de um
reino, impedindo que tais riquezas sejam surrupiadas, pois quanto mais tesouros
tenho, menos seguro estou... Este muro impõe respeito, e tenho que pedir
polidamente por uma permissão para passar, como refugiados que buscam asilo em
terras vizinhas, ou terras mais distantes, como barcos de africanos querendo
entrar em domínios europeus. Esses tapumes querem ocultar algo, no termo
“Cortina de Ferro”. Talvez seja a confidencialidade, impedindo que perigosos
segredos escapem e cheguem a ouvidos indesejados. Imagina-se aqui a equipe
necessária para montar tal instalação ao ar livre. É como um grande rolo de
papel higiênico sendo desenrolado, nos desdobramentos de algum fato ou crise.
Acima, Os Cais Flutuantes. Local: Lago Iseo, Itália. O laranja dourado
contrasta intensamente com o profundo e sisudo azul marinho. Esta instalação desafia
as leis da Física, e a ampla e estável passarela recebe as pessoas. É como um
grande anfitrião recebendo pomposamente os convidados. As linhas retas e tensas
contrastam com as ondulações orgânicas oceânicas, numa tentativa artística em
trazer estabilidade ao inevitável caos da Natureza, da Dimensão Material, dos
corpos carnais os quais habitamos. Realmente, não há no Mundo trabalhos como os
de CJC, e tal grandiosidade recebe os espectador, num “anfitrião” altamente
empenhado em não fazer feio, ou seja, em fazer algo realmente inédito, algo de
fazer “cair o queixo”, com projetos ousados, dando renome internacional a tais
artistas excêntricos. É uma instalação tão grande que, da vista aérea, os
visitantes parecem ser pequeninas formigas, múltiplas, anônimas, empenhadas no
incessante trabalho de alimentar o formigueiro. Essas linhas são como as
enigmáticas linhas de Nazca, num complexo geométrico que só pode ser
completamente visto por meio de vistas aéreas, como drones ou aviões. São as
pistas aéreas para receber em terra os deuses que vieram do Céu e que tiveram a
nobre intenção de colonizar a terra com noções morais, racionais e
inteligentes, numa espécie de “empurrãozinho”, em algo que não é duro de se
entender: se um dia nós formos a Marte, nós seremos os alienígenas! Aqui é como
um grande aeroporto colorido, com sua demanda diária gigantesca de vários voos
indo e vindo. A ilha nesta instalação é uma ilha de fato, com uma bela mansão e
jardins, numa dupla de artistas que tiveram que convencer o dono do imóvel a
tal ambicioso empreendimento. A ilha é circundada, como se fosse servida numa
dourada bandeja, servindo fartamente às percepções do espectador. É uma obra
que convida a um longo passeio, talvez num piquenique, como uma grandiosa Feira
Agroindustrial da Festa da Uva, num momento de celebração da grandiosidade de
algo, de uma vida maravilhosa que nos espera após o inevitável Desencarne. O
entroncamento de três pistas forma uma flecha, no objetivo quase obsessivo em
fazer um projeto e tirar tal projeto do papel, com CJC que, apesar de tão
respeitados e consagrados, não puderam concretizar todos os seus sonhos de
Artes Plásticas, no modo como, na Vida, não podemos fazer absolutamente tudo o
que queremos fazer... É a necessidade de contentamento, como uma criança pobre,
contentando-se com um simples brinquedo improvisado. Tais passarelas foram
sustentadas por boias, é claro. CJC, definitivamente, desafiam limites, num
ímpeto, numa coragem, num estilo que coloca os medíocres em seus devidos
lugares, mostrando imaginação e garra para ir atrás de tais sonhos. É uma obra
que busca fornecer acesso, caminhos, pontes, querendo unir as pessoas em torno
de um projeto, de um conceito, uma ideia, um pensamento. Será que as pessoas
por ali passando sentiram alguma espécie de ondulação ou trepidação? O que
sentiram as pessoas que por ali passaram? De que forma tal obra mexeu com seus
sentidos e percepções? Como deve ser ver, ao vivo e a cores, pessoalmente, contemplar
uma obra de CJC? Qual o sentimento que tais obras trazem ao espectador? CJC são
fenômenos de popularidade, com as pessoas seduzidas, sugadas para dentro de
tais obras, com obras que cumprem o papel da Arte, que é nunca ser ignorada.
CJC nos proporcionam um momento de lazer, para uma contemplação calma e longa,
como num feriado, num momento em que nos desligamos do ordinário para abraçar o
extraordinário, como numa luxuosa sobremesa após um simples feijão com arroz. A
função da Arte é fazer a diferença. Aqui, é um entroncamento de ruas, num
encontro, como uma grande praça que pode ser acessada de vários modos. É um
caminho que propõe escolhas ao transeunte, na deliciosa sensação de Liberdade,
numa gaivota livre, leve e solta, como na sensação de alívio na pessoa que
recém produziu uma catarse.
Acima, Os Guardachuvas. Locais: Japão e EUA. Aqui, é como uma polinização,
com flores silvestres que não tiveram que ser plantadas para florescer na
Primavera, nos tesouros gratuitos que a Natureza é capaz de nos trazer. CJC nos
proporcionam momentos especiais, para que paremos e contemplemos. Aqui, é como
um grande balneário, com inúmeros guardassóis, os quais aqui estão
desabrochando como flores. São como muitas estrelas em uma mesma galáxia, numa
pomposa vizinhança, com tantas e tantas estrelas que nos cercam na Via Láctea,
com tantos corpos celestes que fica difícil catalogar tudo sob a (ainda) limitada
luz do Conhecimento Humano. São como girassóis acompanhando o Sol, na demanda
do dia, da jornada, e perguntamo-nos o quanto de tempo e trabalho foram
necessários para concretiza tal obra. A obra nos convida a sentar
tranquilamente debaixo de um dos guardassóis e curtir este momento doce de
férias na “orla” aqui. Este amarelo vibrante contrasta com um terreno pardo,
seco, quase inóspito, como na seca superfície de Marte. Os guardassóis parecem
respirar, abrindo e fechando, pulsando, exalando vida e perfume, na beleza de
um recife de corais, povoando de cor os nossos olhos, na extensa riqueza
biológica que habita a Terra. Os guardassóis se estendem até onde a vista pode
alcançar, e vemos, ao longe, pequeninas flores amarelas, talvez numa tentativa
de trazer mais cor e exuberância a um terreno tão triste e deserto. É claro que
andorinha sozinha não faz Verão, e que um único guardassol não geraria tanto
impacto perceptivo, na intenção de CJC de jamais, jamais passar despercebidos.
A impressão que se tem é a de que, de noite, os guardassóis se fecham para
dormir, ressuscitando na manhã seguinte, renascendo para a Vida, para o dourado
Sol. É como um mapa digital, cheio de “etiquetas” que assinalam locais,
endereços, cidades, como pequenos alfinetes, fincados na Terra para trazer
noções de direção, como Norte e Sul. É como uma grande vizinhança, com casinhas
padronizadas, talvez no desejo de CJC em jamais se render a padrões limitadores,
desafiando ao máximo a Mediocridade, que é o câncer que conspira contra a
grandiosidade da Arte, pois esta é, ao lado da Ciência, uma gigantesca prova do
Intelecto Humano, como CJC sendo estes gigantes, abrindo proporções antes
inimaginadas, num ineditismo, um pioneirismo, como um Freud, desbravando os
princípios da Psicanálise. É como a garra e a força dos imigrantes alemães e
italianos ao aportar no Brasil. Este mar de sombrinhas traz unidade a um reino,
como uma Itália, que rejeitou os limites feudalistas e trouxe unidade ao país
da bota. É uma vizinhança a qual, apesar de diversificada, guarda algo em
comum, algo importante. É como se cada sombrinha fosse um nobre diplomata de
cada país, trabalhando para a bilateralidade e para o diálogo, sempre crendo
que o Ser Humano é universal, rejeitando as aparentes diferenças culturais e
abraçando a questão espírita – somos todos filhos do mesmo Pai, não importando
as raças, por exemplo. É como se uma chuva de ouro tivesse caído aqui. É como
se fossem flocos de uma neve dourada, caindo e se depositando, na beleza de se
acordar de manhã e ver tudo branco, como na nevada em Caxias do Sul em 1994,
num cenário que nos dá uma breve amostra da harmonia metafísica, pois como
posso ser feliz numa vizinhança se nesta não tenho Paz? CJC nos convidam a
fazer um piquenique à sombra de cada guardachuva, e curtir um momento de lazer
e calma. Estas “flores” buscam encher de graças e nomes uma região anônima,
uniforme. É o modo humano de nomear os lugares, estabelecendo conhecimento,
noções de espaço. É como o serviço de um colonizador ao chegar a um lugar
devoluto, tendo que dar nomes a praias, montanhas, rios etc. É o desbravamento.
Não rezamos “Ave Maria, cheia de graça”? Pois bem, é a luz do Conhecimento, com
terras sendo descobertas e batizadas, como se fosse uma escura toca sendo
iluminada pela sede humana por conhecer.
Acima, O Muro – Muro Romano Empacotado – Via Veneto e Villa Borghese. Local:
Roma, Itália. Parece que fantasmas apareceram para assombrar esta antiguidade
romana. É como se um véu muito leve tivesse caído sobre a estrutura. É como se
fosse uma construção em obras, pudorosamente coberta para que a feiura da obra
não seja revelada. CJC adoram empacotar coisas. É como se fossem várias compras
de supermercado, em sacolinhas de plástico. É como uma formação rochosa,
moldada por muitos e muitos anos de erosão, exposta a um processo corrosivo,
transformativo. Os fortes cabos impedem que o vento romano leve embora tais
véus plásticos. As cordas são o juízo, o siso, a responsabilidade, como uma
pessoa que, depois de um certo processo existencial, aprendeu o valor da
cautela, da precaução. É uma âncora, que impede que o mar furioso leve a
embarcação embora. São as amarras psíquicas, estas grandes inimigas da inspiração
artística, com CJC sempre empenhados em não deixar que as próprias mentes
sofram este dano, este retardo, numa guerra entre genialidade e mediocridade.
Os típicos arcos romanos aqui ficam visíveis, como um vestido sensual, de um
tecido fino e leve, sobre uma mulher elegante. É como se tais arcos estivessem
acumulado muito pó e teias de aranha, como numa casa malassombrada. É como uma
veste cobrindo um corpo nu, num ato de recato e vergonha. É o fascínio da moda
de vestuário, na diversão que é vestir uma roupa, como um ator, incorporando um
personagem. Podemos ouvir o som dos carros, furiosos, um tanto indiferentes,
acometidos pelo estresse diário, no modo como, dirigindo no trânsito, o Ser
Humano mostra sua face mais patética e aguerrida. É como se estas vestes de CJC
fossem uma proteção, um resguardo, talvez impedindo o acúmulo de pó, ou como uma
mãe zelosa, que besunta o próprio filho com protetor solar. É o modo como a
obra é como uma filha do artista, na sensação de tristeza e vazio quando chega
o momento de desmontar tal ambiciosa instalação, na metáfora do circo
levantando a lona e indo embora – por mais belo que seja, o circo, em um dado
momento, levantará a lona e irá embora. A Vida é isso; é a beleza do circo indo
embora, como numa dura Quarta-feira de Cinzas, ou num melancólico final de
Domingo, numa Vida que exige o desenvolvimento de Disciplina. Aqui, são como
ratoeiras, e os arcos têm este aspecto de ratoeiras, como nos inesquecíveis
desenhos de Tom & Jerry. É algo
que me remete à casa onde cresci em Caxias do Sul, uma casa com arcos similares
aos romanos, ou aos arcos de MC Escher, nos seus ardilosos jogos de ilusão de
ótica. As cordas ao redor desta instalação são como teias de aranha, moldadas
por algum tempo, como num bioma próspero, com várias espécies de Fauna e Flora
convivendo. Aqui, temos um aspecto de como esta muralha estivesse derretendo,
talvez numa bomba atômica, ou talvez no calor de um planeta como Vênus. São
como os relógios de Dali derretendo, no fato de que os modos humanos de Tempo e
Espaço nada valem frente à infinitude do Cosmos. É como um cadáver sepultado,
com a pele morta caindo como se fosse um véu – desculpem pela morbidez. São
como as finas vestes de um anjo, na sua simplicidade elegante, com pés
descalços, com suas asas batendo, desfrutando da liberdade de desencarnado.
Estas cordas são uma precaução, mostrando-se necessárias, mas com uma
influência mínima no resultado final – é a Discrição. É como se um fino lenço
estivesse se esvoaçando, caindo acidentalmente sobre esses arcos, no perfume
fino de uma mulher elegante, inebriante. É como um presente empacotado, como de
CJC quisessem nos presentear, dando-nos tal muralha. É o prazer de violação,
quando abrimos um presente, com crianças afoitas na noite de Natal, rasgando avidamente
os papéis para que o mimo seja revelado. Aqui, é como um eletrodoméstico
embalado, no estoque de uma loja, pronto para ser vendido e revelado na casa do
cliente. E as vias de Roma respiram, com CJC nos trazendo tamanho frescor,
jovialidade e competência, pois quem não tem esta, perece.
Acima, Árvores Empacotadas (Projeto para a Fundação Beyeler). Local: Riehen,
Suíça. Grandes pulmões translúcidos. Na Natureza, há uma relação de
continuidade e semelhança entre a estrutura de galhos, de veias e artérias e de
raios de tempestade, ou até num rio se dividindo em vários dutos numa foz. Esta
instalação de CJC dá um efeito de leveza, e parece que tais árvores estão
prestes a se esvoaçar, perdendo-se no ar como balões de festa infantil. É como
se as raízes das árvores aqui não existissem. É como um balão de gás, levitando
pelo ar. São como sacos de plásticos perdidos ao vento, sendo levados para onde
o vento ordenar, como uma pessoa depressiva, a qual não sabe qual é seu próprio
lugar no Mundo, numa sensação de ausência de âncora, de um porto seguro, de uma
referência, como uma pessoa perdida em um labiríntico submundo. Podemos ouvir o
farfalhar desses véus de CJC ao vento, como se as árvores estivessem
respirando, citando eu aqui, novamente, a forma de pulmões. É como se fosse um
raio x, revelando o interior que não pode ser visto a olho nu. É como uma
pessoa se mostrando por inteiro a um(a) namorado(a), no bonito momento de
entrega, em que um mostra suas tristezas para o outro, no modo como o Amor,
realmente, não está à venda, no modo como o cínico acha que Amor está numa
vitrine de loja, pois dinheiro compra tudo, menos Amor, como numa pessoa que
sustenta um(a) prostituto(a), esperando, assim, comprar e vender algo
inegociável. Aqui, são como as imensidões cósmicas, com suas supernovas
explodindo, no orgasmo cósmico que forma as galáxias e os corpos celestes. É
como se as árvores estivessem pegando fogo, com seus galhos sendo expostos,
fazendo metáfora com o conhecer uma pessoa de perto, conhecendo de fato, construindo
um relacionamento e uma cumplicidade, como um casal feliz, que convive
prazerosamente, com um enxergando o outro por dentro. Parece que uma luz brota
de dentro de tais estruturas. Esses leves véus são como um certo ensaio
fotográfico feito por Marilyn Monroe, com a estrela nua, vestida com véus
transparentes, no sensual e provocativo gesto de mostrar/esconder, numa artista
tão genial, como um certo professor meu da faculdade disse em aula: Monroe era
um escândalo. E CJC também são um escândalo, entrando em harmonia com a frase
de Dalí: “Feliz daquele que provoca o escândalo”. Aqui, são como várias
galáxias vizinhas, talvez exercendo força gravitacional umas sobre as outras,
numa eterna dança cósmica, com forças invisíveis exercendo hierarquia entre as
esferas, no modo como os artistas inspiram uns aos outros; no modo como
imaginamos que foi a simbiose entre o casal CJC, atiçando nossa curiosidade
para sabermos como exatamente eles agiam em dupla, em equipe. É como se estas
árvores estivessem vestidas para um pomposo baile de gala, com finos perfumes e
músicas contagiantes, num momento em que a interação social na Terra busca
compreender os finos bailes metafísicos, onde nossos antepassados vivem lindos
como em sua juventude, com pessoas emolduradas por uma luz fina, deslumbrante,
leve, numa pessoa radiante, a qual é feliz e sabe disso. Então, estes pulmões
de CJC respiram, na festa da Vida, com artistas que têm muito tesão pela Vida,
pelo labor, pelo esforço para se fazer compreendido, com os espectadores
embarcando nesta viagem a bordo da imaginação do artista, como um anfitrião
recebendo seus convidados. São como águas vivas translúcidas, nadando
levemente, ao sabor das correntes marinhas, mostrando toda a exuberância da
Vida na Terra. Então, essa água viva nos queima e nos provoca, convidando-nos a
olhar o Mundo de uma forma nova, como nas esmagadoras ondas de movimentos de
vanguarda, como o Modernismo Brasileiro, ou como a transgressão impressionista,
com as novidades sempre vindo, cabendo ao artista respirar e fazermo-nos
respirar também. É o poder da Arte em unir.
Referência bibliográfica:
Artworks/Realized Projects. Disponível
em <www.christojeanneclaude.net>. Acesso 30 out. 2019.
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