quarta-feira, 21 de abril de 2021

Radares de Radaelli

 

 

Natural de Nova Bréscia, RS, Gelson Radaelli (1960 – 2020) formou-se em Comunicação Social e estudou pintura com o talentoso pintor Fernando Baril. GR foi editor de Arte do jornal O Continente e conquistou dezenas de prêmios, tendo morrido cercado de respeito. Ainda por cima, Radaelli foi dono do maravilhoso restaurante portoalegrense Atelier de Massas, decorado com várias pinturas, com um antepasto divino. Os textos e análises semióticas a seguir são inteiramente meus. Boa leitura!

 


Acima, título não informado na referência bibliográfica (1). Aqui temos uma curvatura, num ato de humildade, de quem sabe que a arrogância é insuportável, na capacidade da pessoa nobre em nunca ingressar em narcisismos, sabendo que, para se conquistar algo, é necessário ser humilde e curvar-se antes da conquista. É a curvatura antes do embate de Judô, quando os oponentes expressam respeito mútuo, num grande controle emocional para não levar os golpes para o lado pessoal. Pode ser também alguém triste, chorando, com alguma dor, nos sombrios meandros depressivos, num momento em que a pessoa enfrenta uma grande decepção generalizada com a Vida, prostrando-se numa cama, apático, desanimado, mal querendo conversar, num momento em que Tao nos carrega nos braços, o Pai amoroso que nunca abandona um filho. É uma pessoa num momento intimista, refletindo, longe da interação social, num saudável momento de solitude, no modo como é importante que a pessoa selecione alguns momentos para ficar sozinha consigo mesma, mesmo amando os amigos e a família. Aqui temos um azul discreto e profundo, introspectivo, numa imersão, no modo como é bom que eu seja uma boa companhia para mim mesmo. É alguém se debruçando intensamente em algo, concentrando-se, num momento de dedicação integral, no modo como ninguém é insignificante demais para desmerecer a total atenção de Tao, no modo como cada um de nós tem um anjo da guarda, um espírito benéfico desencarnado que visa nos guiar sempre pelo bom caminho, preservando-nos, num ato de puro Amor Fraternal. As pinceladas de Radaelli são vigorosas e incertas, apaixonadas. Esta curvatura é como um artista ao final de um espetáculo, agradecendo aos aplausos, numa pessoa que, além de fazer seu trabalho e ser remunerada, recebe este momento de maravilhoso de júbilo que é a ovação, num agradecimento humilde, pois não é insuportável a pessoa arrogante, embebida em Ego? Aqui pode ser uma pessoa num momento intenso de riso e piada, rindo tanto que chega a doer o estômago, no prazer de se ver amigos e rir muito com essas pessoas que tanto se identificam com nós, nos eternos vínculos de amizade, os quais sobrevivem ao Desencarne, como, no Plano Metafísico, temos a total certeza de estar cercados de amigos, e a Vida não é dura sem amigos? É triste como uma criança no Colégio, sem amigos para brincar no intervalo, numa criança com uma inclinação depressiva, com dificuldade em fazer amizades. Ao lado desta pessoa se curvando, vemos um grande buquê de flores brancas, na cor das noivas, no modo como nenhuma outra mulher na festa pode usar branco. É como num belo casal de amigos meus, com ambos se vestindo de branco para a cerimônia de enlace, numa visão de harmonia, com um penetrando no outro, num ato de entrega e confiança. É o buquê dos apaixonados, num homem numa floricultura, esforçando-se para comprar o mais belo arranjo floral, sabendo que, além do Coração, deve entrar no jogo a Cabeça, ou seja, lençóis de cetim são muito românticos, mas o que acontece quando se está fora da cama? As flores, os órgãos sexuais das plantas, são a força explosiva de Vida na Primavera, como na cena de Cleópatra em que um grande cortejo suntuoso é feito em Roma, para a regente egípcia ser recebida pelo César, como um desfile de escola de Samba, encantando o Mundo com suas cores e batidas. Aqui também pode ser uma chaminé explodindo, num artista tendo um momento raro e intenso de inspiração, buscando colocar isso em forma de pintura, na explosão das chaminés apocalípticas no início de Blade Runner. Aqui pode ser um escravo sendo impiedosamente punido com chibatadas.

 


Acima, título não informado na referência bibliográfica (2). Aqui é a constituição de uma personalidade, com experiências de Vida que vão moldando a pessoa, nessa bateria de momentos existenciais que vai fazendo que a pessoa, nesse “baile”, cresça e depure-se moralmente, adquirindo o discernimento de que os bens materiais estão fadados à danação da Matéria, e que o que é mundano no Mundo fica. A cabeça é o símbolo do intelecto humano, da Razão, num Homo sapiens que levou vários milênios para se depurar e trazer ao Mundo a Civilização, esta organização que tanto nos diferencia dos demais seres vivos do planeta. Aqui é como um artista plástico catando elementos no lixo seco, transformando lixo em luxo, concebendo uma associação de elementos até então impensada pelo Mundo, na capacidade do grande artista em abrir os olhos da Sociedade, na vitória da Sensibilidade sobre a estupidez, como pessoas que fazem brincadeiras agressivas demais, não sendo estas bem vistas por quem tem um mínimo de Sensibilidade. Aqui, este homem, retratado pelas apaixonadas pinceladas de Radaelli, parece estar de olhos fechados, dormindo ou sedado, num momento onírico, com partes do self da pessoa projetadas em elementos do sonho, fazendo com que a interpretação psicológica de sonhos seja nada mais do que uma análise semiótica. Aqui temos uma diversidade carnavalesca, esta festa popular tão alegre e eufórica em que o brasileiro, por um breve momento, esquece das durezas inevitáveis do Mundo, encarando a volta à lida na Quarta-Feira de Cinzas. Este homem pensa, como se tivesse que tomar uma decisão difícil, como num rei ou rainha, em profunda ponderação, visando sempre o bem coletivo, pois que líder é esse que não se importa com o próprio súdito? Aqui temos um trabalho paciente de Radaelli, dando-se ao trabalho de buscar novas cores na paleta, esforçando-se para fazer uma composição de tanta diversidade, como numa pessoa que sabe a diversidade é uma dádiva social, e que o desrespeito às diferenças leva a um câncer de fragmentação social, como em crimes de ódio racial, como nos EUA, o qual, apesar de ser tal baluarte democrático da igualdade e da liberdade, pode ser também um caldeirão de conflitos de tez racial. O homem aqui parece estar calvo, talvez preparando-se para uma radioquimioterapia, tendo que dar graças a Deus por viver numa época em que há tratamentos oncológicos. O homem aqui está num limiar entre jovem e velho, e parece ter maturidade para fazer sábias decisões, na ação de se pensar muito antes de tomar ação, perguntando-se se esta é mesmo necessária, num homem que vai se aproximando de Tao, o minimalista, aquele que só toma ação quando é necessário e, ao tomar tal ação, só faz aquilo que é necessário, na limpeza da ação minimalista. Aqui é como todo um povo formando o caráter de um regente, como se este guardasse a todos num portajoias, sendo o Povo o maior e melhor bem de qualquer rei, numa mão que lava a outra – eu me curvo perante o rei e este age em meu serviço. Aqui temos um contraste entre sisudo e carnavalesco, pois o homem, em suas cores alegres e divertidas, é embasado por um fundo frio e cinzento, numa fria tarde de Inverno, naqueles dias em que tudo o que queremos é estar em casa embaixo de uma coberta, com doces memórias de aconchego na Infância. O fundo é a ponderação, a cautela adulta, a responsabilidade e o juízo; já, as cores são o riso numa formidável piada, no verdadeiro e divino dom de uma pessoa ter senso de humor, sempre observando a Vida num plano geral, conseguindo ver as pinceladas de ironia em tudo, como na Metalinguagem, onde ator fala de ator. Estas cores me remetem ao maior mico que já paguei em minha vida, quando fui numa festa a fantasia fantasiado de faraó, algo que, definitivamente, jamais farei novamente, havendo valor na discrição, sem amargor, é claro. Aqui é uma das cenas finais da trilogia Matrix, na qual um grande e poderoso rosto é formando por vários pontinhos, no poder da voz de Tao, o uno.

 


Acima, título não informado na referência bibliográfica (3). A árvore seca é a desolação, talvez num artista catarseando um sentimento de abandono ou rejeição. É no termo chulo “levar um chute na bunda”, ou seja, uma pessoa que se sente um lixo ao ser magoada pelo namorado, como no filme de Bridget Jones, numa experiência traumática que contribuiu para que a personagem construísse autorrespeito, autoestima, e não ficar por aí “se vendendo a um e noventa e nove”. Esta árvore seca está num momento do ano de escassez, num momento de crise, de miséria existencial, no qual a pessoa tem tão pouco para se sentir orgulhosa de si mesma. Podemos ouvir aqui o zunido de um vento frio cortante, nas terras infernais do Umbral, um lugar para quem não vê além da Vida Material – não tenhamos pena, pois cada um escolhe para onde quer ir. A terra vermelha aqui é sangue derramado, talvez num terrível campo de batalha, coberto do sangue de irmãos que se matam, inevitavelmente remetendo a Caim e Abel, como num ganancioso ditador, matando pessoas de sua própria família, tudo em nome da perpetuação no Poder, este malévolo Anel de Tolkien que corrompe a alma dos homens, na sedução do Poder, como num ardiloso e inteligente sociopata, brincando com a cabeça dos outros, no modo como há pessoas que fazem exatamente o que não se pode fazer, que é dar informações pessoais de si para um sociopata, até o ponto da pessoa saber “farejar” e detectar sociopatas, evitando estes como o diabo evita a cruz. O céu é escuro e pessimista aqui, trazendo escuridão, como numa espessa nuvem de tempestade chegando, com seus trovões como propaganda, propagando a tormenta, como numa crise chegando, a qual no frigir dos ovos, é positiva, pois as desilusões são irmãs da Verdade, e nada pior do que viver numa mentira... As desilusões colocam no chão os pés da pessoa, e só é bom um amigo que nos traz para o chão, pois que amigo é este o qual me engana e me aprisiona num jogo de mentiras míopes? É como um puxassaco, que anuvia o pensamento da pessoa bajulada, como no filme Celebridades de Woody Allen, com astros absolutamente mimados, de Ego sempre massageado, em pessoas que começam a pensar que podem absolutamente tudo – nada mais vulgar e desinteressante do que a arrogância. A figura humana aqui é esverdeada, num sinal de esperança, prevendo que a crise passará e que o campo voltará a ter verdejante Vida, com campos fartos, cheios de alimentos, com belas uvas que causarão uma safra excepcional, no árduo trabalho do colono italiano, dedicando jornadas inteiras ao labor, só não trabalhando no Domingo porque o padre não permitia, pois até Deus descansou no sétimo dia, não? Esta pessoa aqui está imersa em pensamentos, talvez ponderando para tomar uma decisão, em escolhas difíceis, como num líder, sentindo-se acuado para tomar uma providência em relação a algo, como numa rainha acuada, forçada e dar um funeral de princesa a uma mulher que, na teoria, não mais princesa era, na diferença entre teoria e prática, como num estudante universitário num estágio, aprendendo enormemente na prática. Esta curvatura é o maravilhoso sinal de humildade, como cumprimentar camelôs na Rua, ao contrário de uma pessoa equivocada, que sequer cumprimenta o porteiro ou o zelador de seu próprio prédio – pouco custa ser nobre e cortês. Aqui é como uma pessoa que se sente muito sem amigos, com dificuldade para fazer amizades na Escola, numa pessoa que se sente muito desolada, precisando desesperadamente de um amigo que a defenda e a respalde, aplacando o sentimento de abandono. O verde é a imaturidade de uma fruta que ainda não está doce nem madura, nas lições que trazem a sabedoria da maturidade, da experiência de Vida, talvez numa pessoa ainda muito jovem, que se acha imune a erros ou fracassos, nas duras lições de humildade que a Vida vai ensinando como um persistente e paciente professor. Este mato rubro é como uma queimada desoladora, numa grande frustração geral com a Vida.

 


Acima, título não informado na referência bibliográfica (4). Na porção esquerda vemos um buquê, com duas flores douradas, como dois olhos observando quem observa o quadro, como nos olhos rubros do Aragorn de Viggo Mortensen, tragando seu cachimbo, quieto no seu cantinho, só observando, como num “preto velho”, sempre discreto, sempre neutro, apenas observando os egos acendendo e descendendo no Mundo, nessa fogueira de vaidades, com mulheres competindo para ver qual delas tem o vestido mais maravilhoso do baile, neste ser tão competitivo que é o Ser Humano. As flores são a persistência da Vida, sempre lutando para sobreviver, como num empresário que encara um momento de decepção, vendo seu próprio negócio ruindo e fracassando, como um Titanic afundando impiedosamente, numa ruela de sonhos despedaçados. Aqui são como olhos de uma serpente, na sua sensualidade ondulante, num bicho tão elegante a minimalista, tido em certas culturas como símbolo de fertilidade, e não símbolo de maldade como na Serpente do Éden. O fundo rubro é como uma decoração de bordel, com tudo remetendo a Sexo, num abajur cor de carne, como na boate cabaré parisiense Moinho Vermelho, remetendo à sedução da loja Victoria’s Secret, fascinando um Woody Allen, com o personagem deste dizendo ao próprio filho que há algumas mulheres que fazem compras em tal loja, nos segredos de Feminilidade fascinando o Masculino, inebriando este com fragrâncias sedutoras, agradáveis e convidativas, encorajando o homem na aproximação no mágico momento de interação social, num momento em que a menina abandona as bonecas e debuta. Radaelli gosta dessas figuras humanas neutras, assexuadas, como bonecos de modelo para aulas de desenho, ensinando as proporções do Corpo Humano, esta obra tão linda de Tao, o grande designer, havendo numa boneca Barbie a tentativa humana em compreender a vida de desencarnado, na qual a pessoa vira um boneco racional e perfeito, sem as vicissitudes da vida de encarnado, como a necessidade de alimentação ou repouso, sem qualquer doença ou enfermidade, na construção técnica do espírito, até este entender o que é Frieza Racional atrelada ao Amor Fraternal, combinando Yin e Yang na assexualidade dos anjos, ou seja, dos espíritos livres desencarnados. Esta pessoa de silhueta aqui quer esconder algo, num recato, num pudor, numa vergonha, num momento íntimo de escovar os dentes, num ato só podendo ser feito se a pessoa acompanhante é uma pessoa próxima e íntima, como na sensação de se sentir à vontade dentro de casa, fora da esfera do “Mundo lá fora”, dos relacionamentos sociais. Esta pessoa está planejando algo, fazendo planos para tomar alguma decisão, num empresário que viu ruir suas próprias expectativas, no eterno trabalho de reconstrução, na formiga laboriosa, reconstruindo o formigueiro depois de um algum dano, na necessidade da pessoa continuar tocando a Vida para frente, aprendendo lições e tornando-se mais forte. Este “vaso” que abriga a dupla de flores é como uma lagarta no casulo, feia, subestimada, desconsiderada, depois tornando-se borboleta, bela, colorida, fascinante, dando a volta por cima e alfinetando todos que a subestimavam, numa gostosa vingancinha, como em Uma Linda Mulher, na personagem de Roberts se vingando das arrogantes atendentes que, no dia anterior, tinham se negado a atendê-la, nos gostosos pecadinhos capitais, visto que ninguém é “de ferro”. A figura humana sentada está em repouso, talvez depois de um dia laborioso, como num artista que perde a noção de tempo no labor, como num genial Einstein, o qual não sabia dizer em qual dia de semana ele mesmo estava, no momento em que a pessoa começa a observar o Mundo de forma atemporal, na atemporalidade da Dimensão Metafísica, o lugar que é como uma tradição britânica de coroação, dando a impressão de que o Tempo não passa. Esta solitária figura humana é acalentada pelas flores calorosas, numa pessoa que encontra, em simplicidade, o contentamento, numa pessoa que precisa aceitar onde está, fazendo, assim, as pazes com o Mundo.

 


Acima, título não informado na referência bibliográfica (5). Um impiedoso afogamento, numa pessoa que precisa de uma ajuda, de um auxílio, de um empurrãozinho, mas talvez uma pessoa que não quer ser salva, lamentando por si mesma. É uma crise depressiva, um fundo de poço. As águas cinzentas são a dureza da Vida, nas cinzas mortas que um dia abrigaram um acalentador fogo, um desejo, uma vontade de viver, numa pessoa que simplesmente perdeu a vontade de viver, de fazer as coisas, de batalhar pela Vida, e que solução existe sem tesão? É como uma pessoa perdida, que se esqueceu de quem ela mesma é, no meio de um traiçoeiro labirinto, cheio de sinais auspiciosos, de pistas falsas, testando a capacidade da pessoa em pular obstáculos, no submundo daqueles que vagam perdidos e solitários. Esta água escura é pessimista, num acúmulo de problemas, numa pessoa que sequer tem vontade de sair da cama, num momento em que tudo dói; tudo é difícil. Esta figura humana, da cor de um belo céu ensolarado, é a esperança, esta força que faz com que a pessoa creia que a vicissitude vai passar e que será possível dar a volta por cima, como no tombo do ator Robert Downey Jr., o qual, depois de ser indicado a um Oscar ao interpretar Charlie Chaplin, caiu na Vida por causa das drogas, tornando-se presidiário, saindo da prisão fortalecido, disposto a retomar a carreira, e o fez, retornando triunfante, mostrando que há sim esperança, como ouvi de um pregador na Rua certa vez: “Deus ajuda, mas a pessoa precisa ter vontade”, e que esperança existe de eu assumir o controle de minha própria vida se entrego tudo nas mãos dos outros? É como a pessoa em situação de Rua, escondendo-se da Vida numa vida desregrada, fugindo de tudo o que a Sociedade tem a oferecer, havendo nos abrigos de Assistência Social uma confrontação, no qual do indigente é exigido de buscar um emprego e reerguer-se, não podendo depender para sempre de Caridade. O céu aqui é rubro, sangrando, numa ferida aberta, desatada, numa emergência, numa pessoa que está sofrendo, com seu sangue rubro sendo sugado por um sociopata disfarçado de amigo. Logo acima da pessoa aqui, vemos uma nuvem que a persegue, num carma, naquilo que acompanha a pessoa por qualquer lugar, por qualquer contexto, fazendo com que a pessoa chegue à conclusão de que o autoencontro é sempre dentro de si, e nunca fora. Esta nuvem é impiedosa, perseguindo sempre, até a pessoa olhar para si mesma e amar seus próprios predicados, suas próprias virtudes, havendo pessoas que, de tão deprimidas, não curtem seus próprios predicados, como Inteligência, numa autoestima para lá de bombardeada. A nuvem é a trajetória espiritual, até a pessoa enxergar tudo de forma existencial, psíquica, como num professor exigente, valendo cada centavo da mensalidade da instituição de Ensino. É como uma pessoa que sempre se sentiu perseguida por algo, adquirindo a ilusão de que a Vida mudará só porque tal pessoa se mudou de cidade – as vicissitudes são universais; o Ser Humano é universal. Esta pessoa azul luta para sobreviver, nunca se entregando ou “atirando-se nas cordas”, nunca tendo pena de si mesma, observando que é preciso ter força para superar olimpicamente os percalços oferecidos, num espírito que, antes de reencarnar, seleciona todas as dificuldades pelas quais passará quando reencarnado, como num aluno matriculando-se numa faculdade, selecionando as cadeiras que cursará. Esta água cinzenta é a luta entre branco e escuro, ou seja, Bem e Mal, como algo sendo disputado por heróis e vilões, ensinando desde cedo à criança a noção entre válido e inválido, no desafio de se ensinar Tao, que não é o melhor caminho – é o único caminho. A cor azul aqui é um sonho, sonhando com um dia mais ensolarado, não tão escuro. É o desafio de uma vida, uma luta, numa pessoa que se vê obrigada a fazer escolhas, como um colega meu de Colégio, uma pessoa que fez tal escolha e tornou-se padre. O autoencontro é tão importante que ouvi sobre isso numa palestra num centro espírita certa vez, na universalidade das vicissitudes existenciais. Esta água turva impede que enxerguemos o Mundo e a Vida.

 


Acima, título não informado na referência bibliográfica (6). Vemos aqui o artista frente à própria obra. O vermelho é a Vida que pulsa, numa pizza calabresa apimentada, num belo show de Dança Flamenca, neste calor latino, temperado, como nos pratos do Atelier de Massas. O vermelho é como uma paisagem marciana, na estrela rubra associada ao sangue derramado na batalha, neste imortal talento humano para com a briga, a desavença e o desentendimento. O vermelho é uma sirene gritando, pedindo prioridade para passar, numa emergência, como nas legiões de motoboys na cidade de São Paulo, em intermináveis levas de motoqueiros gozando de pista livre, tudo a serviço de uma grande metrópole desenvolvida. O vermelho é uma sedutora mulher de vestido rubro, uma feiticeira, sedutora, como na descomunal capa rubra do Drácula de Gary Oldman, nesta sede de sangue, buscando fazer com que um vampiro faça metáfora com os sociopatas, estes sugadores de almas, em busca de escravos, elucubrando malévolas malícias destrutivas e odiosas. O vermelho é um doloroso parto, numa descomunal dor para a mulher, enchendo a casa de gritos desesperados de dor, num pai nervoso, tenso. Aqui vemos uma grande esfera azul marinho, como um impiedoso meteoro chegando à superfície, como no meteoro responsável pela extinção dos dinossauros, cobrindo a Terra de sombras, só permitindo a sobrevivência de animais de sangue quente, como os mamíferos e aves. É o sonho de um artista em se tornar tal impacto, tal “tragédia”, como numa Gisele sendo introduzida ao Mundo, numa força tal que passou a ditar o padrão de beleza capilar global – cabelos longos ondulados. É claro que não existe artista que quer passar despercebido, nesta fome por respeito e reconhecimento, nesta grande provação que é a pessoa se expressar frente a um Mundo tão duro, frio e insensível. Aqui é como uma grande pedra negra, numa nuvem densa, a qual não permite, por hora, que enxerguemos muito longe em nossas próprias vidas, fazendo com que só possamos prever o mínimo, pois como poderei passar pelas coisas se já as previ todas? As esquinas da Vida têm lá suas surpresas, e isso é até divertido, se pudermos observar a Vida num plano abrangente, podendo, assim, que percebamos o talento piadista de Tao, o formidável. Aqui vemos um encontro entre sisudo e vibrante, como num sisudo senhor japonês sucedido pela esposa sorridente, no modo como é inevitável que o casal heterossexual carregue tal carga representativa – ela personifica o Yin dele e ele personifica o Yang dela. Esta bola escura é uma invasão, uma intromissão, como numa pessoa “furão”, aparecendo numa festa sem ser convidada. É uma ousadia, num artista que sabe provocar, sempre atiçando o Mundo, como numa artista mulher, pagando caro por ser mulher num inflexível mundo de homens, havendo neste a limitação de uma mulher, a qual nunca pode passar de um ator coadjuvante. Aqui é como uma pedra afundando, tendo que aceitar onde está, pois o primeiro passo para eu sair da crise é aceitar que estou em tal crise, no caminho da Humildade, da aceitação, do eu perceber que não sou o suprassumo no centro do Universo... Aqui é como uma bola de papel amassado, numa pessoa que descartou algo, alguma expectativa, em um personagem tão humano como o desenho animado do Coiote e do Papa Léguas, num Coiote que sempre se ferra, sempre fracassa, sempre perde, sempre se dá mal, no modo como é tão comum, tão humano que é se frustrar. Aqui é como algo ambicioso chegando, querendo tomar conta do quadro, tomar conta de algo, numa fome por sucesso, este sinal auspicioso que tanto corrompe as almas da Humanidade – se não estou o tempo todo querendo, posso ter Paz. Aqui vemos um momento de transição, de suplantação, num quadro que mostra uma sucessão de presidentes, com um entrando e outro saindo, no paradigma democrático da renovação do Poder, ou como numa sucessão monárquica, representando a tradição de tempos em que a Democracia era um mero vestígio grecorromano.

 

Referências bibliográficas:

 

Gelson Radaelli. Disponível em: <www.pt.wikipedia.org>. Acesso em: 14 abr. 2021.

Morre aos 60 anos o artista plástico gaúcho Gelson Radaelli. Disponível em: <www.g1.globo.com>. Acesso em: 14 abr. 2021.

PANDOLF, Fernanda. Gelson Radaelli inaugura exposição de pinturas e esculturas na Bolsa de Arte. Disponível em: <www.wp.clicrbs.com.br>. Acesso em: 14 abr. 2021.

PRESTES, Eleone. Gelson Radaelli: No espelho não sou eu. Disponível em: <www.eleoneprestes.com>. Acesso em: 14 abr. 2021.

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