quarta-feira, 31 de maio de 2023

Lúdico Ludwig (Parte 4 de 6)

 

 

Falo pela quarta vez sobre o artista alemão expressionista Ernst Ludwig Kirchner. Os textos e análises semióticas a seguir são inteiramente meus. Boa leitura!

 


Acima, Garota sentada. Aqui é uma languidez, numa passividade, no gostoso pecadinho da preguiça, este pecado valioso que tantas invenções felizes provocou, como o telefone e, depois, em sofisticação, a Internet, num galgar “louco” de tecnologias, numa era em que os dispositivos móveis estão acessíveis para todos, diferente dos anos 1990, quando era tão chic caminhar na Rua falando no telefone, como no advento das TV a cabo na mesma época, algo que quebrou a hegemonia da TV aberta e algo que, hoje, é banal, não tão chic quanto há décadas. Aqui é um desejo de se horizontalizar, na canção de Bruno Mars: “Hoje nada farei; apenas deitarei em minha cama!”. É o anti herói Radicci, o personagem grossão do genial cartunista Carlos Iotti, com Radicci chamando de “morfético” o filho Guilhermino atirado numa cama, na ironia de que o momento mais gostoso do sono é no momento em que o impiedoso despertador toca, acordando-nos para a vida, como minha mãe acordando minha irmã e eu, dizendo: “Vamos encarar a Vida!”, numa dona de casa abraçando a rotina do lar, fazendo camas, limpando banheiros e cozinhando, comentando com uma comadre, também do lar: “Nossos filhos agem como se nós, as mães, nada fizéssemos além de nossa obrigação”, na sabedoria de que ser mãe é padecer no paraíso, numa mãe que dá ordens cheias de amor e boas intenções, numa pessoa que conheci, a qual dizia para a própria mãe ao telefone: “Eu ainda não te mandei tu te foderes hoje? Não? Então de fode!”, desligando o telefone na cara da mãe, com o perdão dos termos chulos aqui proferido. Aqui temos esta liberdade cromática de Kirchner, livre para pintar de amarelo a cara da modelo, na magia de um prisma desmanchando a luz branca, em lustres luxuosos deslumbrantes, objeto que buscam nos dar uma ideia da beleza fria metafísica matemática, em toda a sofisticação matemática que partiu da mais pura lógica: Depois, de um, vem dois, etc., no modo como a Matemática é tão detestada pelos alunos, uma ciência que é a prova da beleza de Tao, a única explicação lógica para o fato da Vida Eterna, este presente inestimável que nos foi dado, no poder imensurável: Você já se deu conta de que a Vida jamais findará? A Eternidade é a única explicação lógica, junto à imortalidade da mente, evocando Santo Agostinho: A carne perece e a mente sobrevive, numa simples mudança de endereço, num lugar em que a seriedade da Vida se desdobra de forma lógica: Encarnado ou desencarnado, arrume algo de bom, virtuoso e produtivo para fazer, pois a Vida continua em toda a sua seriedade, até chegar ao ponto de arcanjo, os espíritos perfeitos que gozam da suprema felicidade, no prazer que é trabalhar em prol da Paz, esta força tão combalida nas vaidades ditatoriais humanas, num Putin tirano e insano, num rei infeliz que quer sempre anexar mais e mais territórios, em tal sede napoleônica por poder, sempre poder, no Oráculo em Matrix dizendo: “O que um homem poderoso quer? Mais poder!”, quando que a delícia na Vida reside no contentamento, como as inocentes crianças, as quais se contentam com pouco, na sua simplicidade que tanto tem a ensinar aos adultos, nas palavras de Jesus: “Vinde a mim as criancinhas, pois delas é o Reino dos Céus!”, na promessa espírita de uma dimensão melhor para se viver, num lugar de paz inabalável, em cidades limpas, com prédios de extrema sofisticação arquitetônica – é a glória! O vestido vermelho da moça é tal lascividade provocante, como numa feiticeira que vi certa vez, uma mulher de vestido vermelho, provocante, vibrante, na magia dos brujos, as pessoas cuja inteligência emocional nos deixam perplexos. O cabelo é jovem, negro, sem um só fio branco, numa modelo tão jovem, podendo haver um certo preconceito em relação a Kirchner por este usar modelos tão jovens, num pai desconfortável em ver a própria filha com uma saia muito justa. A cama é o merecido repouso, e estar desencarnado é ter todo o tempo do Mundo para descansar e encarar a vida metafísica, um lugar que faz metáfora com a beleza das regiões serranas elevadas, frescas, como na sedução de cidades como Gramado. A menina é a seriedade, a mortificação, a qual traz Paz.

 


Acima, Interior com duas garotas. Aqui temos um convívio, como no famosíssimo seriado Chaves, no qual, dentro de uma vila, os personagens têm que aprender o convívio, o qual pode ser um tanto complicado, como num casamento, no qual, para durar para sempre, um tem que ter paciência para aguentar os defeitos do outro, no desafio que é manter coesa uma banda por décadas de carreira, como no U2, no modo como uma banda é um casamento sem sexo, como vi certa vez uma reunião da boyband Backstreet Boys, com os integrantes berrando entre si, como numa clássica briga de marido e mulher, como eu podia ouvir a briga de um casal vizinho meu, com a esposa dizendo a um marido calado: “Eu não aguento mais!”. Nas duas moças aqui uma deita e a outra está de pé, talvez numa dondoca rica improdutiva contratando os árduos serviços de uma dama de companhia, numa perua desinteressante, como numa socialite, a qual, no fundo, não é lá muito respeitada pelas pessoas, pois festas não marcam época – trabalhos marcam época, e ser um “robert”, que apenas quer aparecer midiaticamente, nunca é ser muito respeitado. O interior é muito aconchegante, confortável, numa pessoa que volta gloriosamente para casa depois de um dia inteiro de labor no escritório, chegando em casa, colocando chinelos e tomando um merecido drinque de happy hour, numa pessoa que sabe que muito trabalho e pouca diversão fazem de Jack um bobão, parafraseando aqui O Iluminado. Aqui temos relaxamento e tensão, no modo como a pessoa nunca pode baixar completamente “a guarda”, pois somos surpreendidos exatamente no momento em que achamos que está tudo perfeito. A mulher deitada é o Yin lânguido, numa sensual Cleópatra em seu divã, vivida por Liz Taylor, num filme fracassado, que quase quebrou o estúdio na época, no preconceito patriarcal, no qual o macho alfa tem que ter o papel principal, como em O Gladiador, sendo tão malvista a mulher forte, como Thatcher enfrentou tal misoginia patriarcal no início da carreira política, com as pessoas perguntando a Margareth: “Quem vai cuidar de seus filhos e de sua casa?”. É muito machismo, enfurecendo a inteligência das feministas, a elite intelectual que nos acorda para a realidade, fazendo com que pensemos contra o vento, fora de mediocridades. A mulher em pé está atenta, tensa, nos cuidados de uma mãe, como vi certa vez num shopping uma mar desesperada, que se perdeu do filho pequeno, reencontrando este depois de minutos de pura angústia e desespero – que stress! Este quadro traz um pouco da explosão de cores vibrantes nos anos 1960 e 1970, como numa cinzenta Londres sendo “quebrada” pelo vermelho vibrante das cabines telefônicas, utensílios que hoje estão tão obsoletos, fósseis de uma era que definitivamente passou, virando peça de museu, como para geração de meu sobrinho, a qual não faz ideia do que foi a Era Analógica, como o telefone de disco, o televisor de tubo e as cartas pelo correio. Aqui é como no Vênus e Marte de Botticelli, com ela atenta e ele entorpecido, dormindo muito profundamente, num aspecto quase cadavérico, no feto relaxado no ventre, numa mãe desperta, cuidando-se desde a gestação, impedida de ingerir álcool, em sacrifícios de mãe, as quais querem que os filhos sejam felizes, no modo como dói para uma mãe um filho que resolver quebrar relações com ela, numa avó impedida de ver o próprio neto – é um horror. Aqui temos algo confortável e luxuoso, num ambiente acarpetado, bonito de se ver mas difícil de se manter limpo, como uma certa senhora, a qual arrancou os carpetes de sua própria casa para substituí-los por piso laminado, muito mais simples de se limpar, na praticidade falando mais alto. Os quadros ao fundo são as memórias, na ironia de metalinguagem, em quadro sendo pintado em quadro maior. O jogo de chá é o calor, no prazer de uma bebida quente num dia úmido e frio, num consolo de calor goela abaixo. O relógio é a passagem do tempo, no prazo de validade de nossos corpos carnais, os quais perecem frente à morte, na promessa de libertação do Espírito Santo.

 


Acima, Marcella. A moça está entediada e arredia, como se não estivesse confortável para posar, remetendo a uma divertida imagem de um parque da Disney na Flórida, com uma Monalisa absolutamente impaciente ao posar para Leo. O gato é a sofisticação, numa combinação curiosa de unhas afiadas agressivas com maciez felina, na deusa Michelle Pfeiffer interpretando sua icônica Mulhergato, a única coisa realmente boa no fracassado Batman – o Retorno, na prova de que ninguém está por cima o tempo todo, num Burton que, ao obter tanto sucesso em Batman, de 1989, acabou pisando na jaca em 1992 na sequência aqui já citada, fazendo de Hollywood duas terras: a do sucesso e a do fracasso, com tantos e tantos sonhos sendo frustrados todos os dias, na dureza de uma indústria indecifrável, pois o que é necessário para se vencer lá? O gato encolhido é um soninho gostoso, num momento de descanso, no termo catwalk, ou seja, passeio de gato, para se referir à passarela de desfile de Moda, no felino passando com seus pés aveludados, na beleza felina tão apreciada no Antigo Egito, com bichanos sendo mumificados como se fossem seres humanos, nos modos humanos de “driblar” a Morte e encontrar um plano alternativo, como nos túmulos de faraós, túmulos abarrotados de riquezas mundanas tão saqueadas posteriormente, em descobertas raras como a tumba do rei Tut, intacta, protegida de ladrões saqueadores. As garrafas ao fundo são o vício, na sedução etílica, num fato curioso o qual conheço, com três irmãos que nasceram da mesma barriga e foram criados debaixo do mesmo teto, sob os mesmos valores: um saiu alcoólatra e os dois restantes não, numa pessoa “premiada” por uma herança genética, assim como homossexualidade é genética, pois um casal perfeitamente heterossexual, ao produzir prole, pode ter alguns filhos gays, outros filhos não gays, ou seja, nos versos da megadiva Gaga: “Você nasceu assim, bebê!”. Kirchner parece aqui invadir o dia da moça, numa curiosidade, como enviar sondas para o espaço, em desesperada busca por Vida fora da rica esfera terrestre, num Ser Humano que se sente tão solitário no Cosmos, num espaço tão abarrotado de intermináveis galáxias – seria assustador demais pensar em que, no Universo inteiro, só existe Vida em nosso planetinha azul. O piso verde é como um bosque, na cor da Vida vegetal, remetendo aos desmatamentos amazônicos, devorando matas virgens em garimpo ilegal, intoxicando indígenas, tudo em nome da ambição humana por metais preciosos mundanos, os quais giram em torno do que vale, que é a Eternidade, sendo esta, sim, a verdadeira joia, pois tudo de material está fadado à ruína – no início, antes de tudo, era Tao, o qual sempre existiu e sempre existirá, além sempre da compreensão humana. A menina está tediosa, sentindo falta de um amigo para brincar, como uma menina feminina que brinca de Barbie, achando tão feio e tedioso um álbum de figurinhas de jogadores de Futebol, havendo a ruptura na adolescência, onde a menina começa a achar interessante o jeito de ser dos meninos, havendo, depois de tal fase, toda uma pós adolescência para, depois, finalmente, a pessoa abraçar a maturidade, na idade de Cristo quando morreu. Ao fundo, de forma discreta, vemos uma saída, uma porta, talvez na resolução de um impasse, como na resolução de um romance policial, numa genial Agatha Christie, a mulher que fez mais sucesso do que muitos, muitos homens escritores, na prova de que inteligência não tem gênero, derrubando a misoginia patriarcal, na qual só os homens são sábios de fato – é um horror. A menina é listrada como uma zebra, nas pelagens animais que servem como disfarce para escapar de predadores, nas leis selvagens de alimentação carnívora, dando-nos pena de uma empala abocanhada por ferozes predadores, nas leis da Dimensão Material, na função mais básica que existe, que é a alimentação. A menina adolescente está imersa em seu próprio mundo, com seus amigos, seus filmes, suas músicas e seus ídolos, numa fase da vida em que tanto o mundo infantil quanto o mundo adulto são desinteressantes, num “galeto” – nem pinto, nem frango adulto.

 


Acima, Menina sob um guardachuva japonês. O guardachuva é a proteção, o resguardo, como na logomarca de uma certa seguradora – uma pessoa sob um guardachuva. Aqui é a sedução que o Oriente exerce sobre o Ocidente, do mesmo modo como a Oriente ama o Ocidente, como num local da cidade de Tóquio, imitando a Times Square novaiorquina, na universalidade do Ser Humano, fazendo das religiões caminhos diferentes que levam ao mesmo destino, que é Tao, o presente da Vida Eterna. Aqui é a beleza do corpo feminino, pois como Deus pode ter vergonha de algo que Ele mesmo inventou? É como na violação puritana da obra de Michelangelo no Vaticano, com os inocentes sexos sendo tapados, desrespeitando a obra original do artista, na malícia da maçã, trazendo vergonha a algo natural, que é a nudez. Aqui é esta tradicional explosão de cores de Kirchner, como nas cores vibrantes de Andy Warhol, o artista que estabeleceu uma identidade e estilo inconfundíveis, sendo glorificado ainda em vida, pop o suficiente para aparecer no filme hilário A morte lhe cai bem, a lado de outras celebridades como Monroe e Presley no filme. Aqui é no bom gosto da revista Playboy brasileira, num nu sofisticado, que respeita a mulher, a artista, em edições tão maravilhosas como a de Marisa Orth, na icônica foto de Marisa nua com uma serpente, um animal o qual, na tradição católica, é sinônimo de malícia e pecado mas, em civilizações como a Grécia Antiga, era símbolo de fertilidade e sensualidade, numa fluidez como um córrego, sempre fluindo, no rio encontrando o mar, no mistério da Vida na Terra: o que acontece quando a água do mar penetra fundo e resulta em nascentes de água doce? Não é a Terra um mistério? Aqui, há um continuum entre o corpo da moça e as formas da Natureza, como montanhas e terras devolutas, em galáxias espalhadas pelo Cosmos tais quais conchinhas à beiramar, em revoluções como a do supertelescópio Hubble, desnudando confins do Universo, num Ser Humano ainda tão aquém de desvendar tais segredos, no desafio da onda frente ao surfista. Os seios são belos, naturais, muito longe de seios siliconados, os quais não têm naturalidade, remetendo a uma pessoa que conheço, a qual teve que passar por uma mastectomia, perdendo a constituição natural dos próprios seios, no modo como a vicissitude faz com que superemos tais dificuldades, renascendo nós mais fortes, pois não há sentido algum em uma vida sem dificuldades, algo que eu gostaria de falar a uma certa pessoa prostrada e deprimida – existe vitória sem luta? O acessório aqui traz ainda mais sensualidade, pois é o jogo entre mostrar e ocultar, numa stripper talentosa, remetendo a uma menina que conheci, a qual levava vida dupla: de dia, era uma pacata estudante universitária; de noite, uma stripper em uma casa de shows noturna – acho engraçado, no modo como é complicado uma pessoa que leva vida dupla, uma pessoa que não está nem aqui, nem acolá, ficando “em cima de um muro”, como um certo senhor, o qual tem uma amante, sendo esta uma mulher que não se dá ao respeito: Se é para você ser uma mera fulaninha putinha, com o perdão do termo chulo, então é melhor você ficar sozinha e procurar um homem que lhe respeite, ou seja, ouça a cabeça antes de ouvir o coração. A moça é linda, maquiada, arrumada, como na bela Rose de Titanic, posando nua perante o impetuoso e sensível Jack, numa história de amor que tanta comoção internacional causou, ao ponto de grupos de meninas japonesas se reunirem e, ao som da música tema do filme, chorarem pelo Jack afundando ao mar. O guardachuva aqui é como uma mandala ou um relógio, na passagem do tempo, nos ciclos indo e vindo, numa pessoa que está aprendendo a ver o Mundo de forma atemporal, entrando em contato com o Metafísico, que é atemporal, numa dimensão tão onírica, na qual a paz vem da mortificação psíquica, na função das famílias de realeza em representar tal plano nobre, inspirando-nos.

 


Acima, Nu azul deitado com um chapéu de palha. Aqui remete a um clipe de Michael Jackson, no astro deitado numa cama de barriga para baixo, numa canção que fala sobre como o Mundo pode pressionar o homem a ser o mais durão e frio possível, nos versos de uma certa canção: “Os homens ficam frios e as mulheres ficam velhas, e, no final, todos perdemos nosso respectivo charme”. Aqui é tal transgressão cromática, numa pele azulada, como nos personagens Smurfs ou no filme Avatar, nos esforços de um diretor James Cameron em fazer grandes blockbusters, filmes que exigem um ENORME trabalho e um DESCOMUNAL esforço, numa pessoa que definitivamente se joga no labor, ocupando-se ao máximo. Aqui é a delícia de se estar nu ao ar livre, numa sensação de tanta liberdade, como numa praia de nudismo, onde o nu não é malicioso, mas natural, no momento em que a nudez faz com que nos sintamos conectados à Natureza, na inocência do indígena, sem o peso do pecado europeu. Aqui é como no prazer de ir a um parque, estender uma toalha sobre o gramado e reunir-se com amigos e beber algo, como vinho, chimarrão, café etc., numa cidade como Porto Alegre, com seus parques, uma cidade que é minha “filha adotiva”, uma urbe que tanto amo e na qual fiz tantos amigões, mas uma cidade a qual, como qualquer outra, está em constante processo de transformação, fazendo com que eu mal reconheça a cidade que conheci nos anos 1990 – tudo é processo. O chapéu é um charme, um estilo, remetendo a épocas em que os cavalheiros usavam muito chapéu, algo meio fora de moda no início do século XXI, no galgar incessante das modas, das tendências, como nos jeans rasgados, num aspecto “sobrevivente de hecatombe nuclear”, conquistando os jovens e horrorizando os velhos, no modo como uma pessoa tem que se manter sempre jovial, moderna, como num Leonardo da Vinci, o qual, apesar de ter sido tão longevo, manteve-se sempre jovial e brincalhão – não envelheça demais! Aqui é um prazeroso banho de Sol, remetendo a um lagarto que uma época apareceu no jardim da casa onde morei com minha família, no réptil que erguia cabeça e tomava banho de Sol, dando origem ao termo “lagartear no Sol”, num bicho arisco, o qual se escondia rapidamente em sua toca ao notar algum movimento ao seu redor, no instinto de preservação, passando para as próximas gerações seu gene de esperteza e cuidado, na inevitável seleção natural. O capim aqui parece farfalhar sedosamente ao vento, farfalhando com seu som aveludado, acolhedor, gostoso, numa brisa constante, em constante processo de transformação, num Deus o qual está sempre criando, fazendo da Eternidade o tempo para QUALQUER reencontro, em amizades leves, desapegadas, fresquinhas, por assim dizer, indo contra o amor possessivo, ficado e obsessivo, como uma pessoa que conheci, a qual tinha um amor absolutamente fixado, insano, doente, num amor que tem que passar por um processo de desapego urgente, pois o amor possessivo faz com que a pessoa sofra com tal fixação. O chapéu aqui ressalta ainda mais a nudez, como no jogo do cancã, com as saias arregaçadas e mostrando as partes íntimas da mulher, no modo como os cabarés eram grandes centros de produção artística, numa Dercy Gonçalves contanto que, na juventude desta, ser atriz era a mesma coisa do que ser prostituta, num preconceito quebrado por grandes damas como Fernanda Montenegro, Marília Pêra e Meryl Streep, mulheres de alta classe e dignidade, remetendo à crítica que Woody Allen faz no filmão Celebridades: A salvo exceções, a mulher celebridade é uma mulher vulgar, num Allen que despreza a massagem de ego em celebridades mimadas pois, de perto, o mundo das celebridades é desinteressante. A toalha sobre o capim é o respaldo, o acolhimento, como num indigente sendo acolhido numa fundação de assistência social, com assistentes “colocando na tomada elétrica o dedo” do indigente: Você tem que se reerguer, pois não pode ficar para sempre aqui nesta fundação, ou seja, a Vida cobra sério e realmente não dá para fugir.

 


Acima, Mulher na frente do espelho. Aqui é a vaidade e a autoestima, como numa Evita Perón, a qual, ao acordar, levava quarenta minutos de aprumação frente a um espelho, numa pessoa que não quer sair na Rua de qualquer modo, usando qualquer roupa, como uma senhora que, há décadas, foi minha professora, uma pessoa a qual, há décadas, era uma pessoa com autoestima, arrumando-se: maquiagem, cabelo, unhas, roupa, sapatos, joias e perfume, uma pessoa a qual, hoje em dia, perdeu tal autoestima, parando de se arrumar – é uma lástima, nos versos de uma certa canção pop: “Aprenda a amar a si mesmo – é uma grande, grande sensação”. O espelho é tal símbolo de feminilidade, numa mulher que vê grande prazer em se maquiar, ao contrário da mulher masculina, a qual não vê maquiagem como um prazer, mas como uma obrigação e uma inclemente e inflexível imposição social, no modo como pode ser complicada a infância de uma mulher masculina, desde cedo tolhida ao querer brincar de carrinho, numa pessoa que, de certo modo, não teve infância – é complicado. A moça está sozinha, reservada, vestindo só lingerie, na transgressão de uma Madonna no ano de 1984, usando roupas íntimas em público, numa mulher tão, tão charmosa e transgressora, uma pessoa que, no fundo, é careta, no modo como tudo traz em si sua própria contradição, no jogo de sedução entre seriedade masculina e loucura feminina. Aqui é o momento de diversão de uma mulher feminina, no “ritual” de arrumação, pois, para a mulher, a festa já começa a partir do momento em que se entra num banho para iniciar os trabalhos de arrumação social, como um rapaz e sua namorada: Antes de casar, ele ia buscá-la em casa com a moça já arrumada; depois de casar, o homem se dá conta de todo o longo ritual de arrumação, pois agora mora com tal mulher. Podemos sentir aqui o olor, o perfume doce da moça, na sedução das fragrâncias, objetos caros, valorizados, finos, numa revolucionária Coco Chanel: “Estar perfumado é um luxo”, dizia Coco, ou seja, ninguém vai morrer por não estar perfumado. É como um rapaz que conheci, que Deus o tenha, um homem que amava se perfumar, perfumando-se até demais, remetendo a um rapaz afeminado que conheci, o qual usava perfume de senhoras. Aqui remete à capa do álbum fracassadíssimo de Naomi Campbell, uma cantora ruim, sinto em dizer, com a modelo raspando as pernas com gilete e espuma de barbear, no modo como deve ser tão duro ser mulher, tendo que passar pelas dores da depilação, tendo que fazer as unhas, tendo que menstruar – que dureza! O espelho é o narcisismo, num sociopata que se acha perfeito, o centro do Universo, no filme O psicopata americano, com Christian Bale, num sociopata em pleno narcisismo, abrindo mão de todo e qualquer apuro moral, na loucura da pessoa achar que é Deus – é um horror. A mulher aqui conversa consigo mesma, numa pessoa solitária, conversando consigo mesma, com a mente dando-lhe alguém para conversar, em pessoas que chegam a um estilo de vida tão solitário e afetivamente carente, vagando por ruas de estranhos, sem norte, sem rumo, sem uma nobre canalização de energia criativa, no modo da pessoa encontrar um norte nobre para sua vida – como posso estar bem se estou dentro de um labirinto traiçoeiro? Aqui são os acessórios femininos que seduzem os homens que querem ser mulheres, como no filmão (pesadíssimo) O silêncio dos inocentes, com o sociopata querendo vestir a pele de mulheres, naquele tipo de filme sem catarse ao final, fazendo com que saiamos da sala de projeção com o coração pesado, como no filme de terror Seven – os sete pecados capitais, ou como ao final da peça Masterclass com Marília Pêra interpretando Maria Callas, fazendo com que saiamos do teatro com a sensação de termos levado um soco na boca do estômago. Aqui é uma mulher que se cuida, como numa mulher tendo a paciência para pintar as raízes brancas de cabelo, como uma certa dama caxiense, sempre arrumada e bonita, naquela mulher elegantes que nos dá gosto de ver, no modo como a aparência é tão capital numa carreira pública, como na Política.

 

Referências bibliográficas:

 

Ernst Ludwig Kirchner. Disponível em: <www.meisterdrucke.pt>. Acesso em: 3 mai. 2023.

Ernst Ludwig Kirchner. Disponível em: <www.pt.wikipedia.org>. Acesso em: 3 mai. 2023.

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